por Ricardo Sayeg
Publicado em 25/04/2023, às 14h27
Certamente o Governo Federal se equivocou e cometeu um grave erro e inconstitucionalidade ao redigir o Artigo 4º da Medida Provisória nº 1.160, de 12 de janeiro de 2023, no sentido de que a Lei nº 13.988, de 14 de abril de 2020, passa a vigorar com o Artigo 27-B, o qual dispõe que se aplica o disposto no Artigo 23, o contencioso administrativo-fiscal de baixa complexidade, assim compreendido aquele cujo lançamento fiscal ou controvérsia não supere mil salários mínimos.
Na prática, significa que o valor de acesso mínimo pelo contribuinte para julgamentos do contencioso administrativo-fiscal pelo CARF << Conselho Administrativo de Recursos Fiscais >> passou de questões no equivalente a sessenta salários mínimos, hoje no montante de R$ 78.300,00, para mil salários mínimos, no montante de R$ 1.305.000,00, ou seja, somente serão julgadas as questões tributárias federais deste enorme valor em diante.
O CARF, órgão colegiado, paritário, integrante da estrutura do Ministério da Fazenda, tem por finalidade julgar recursos administrativos-fiscais do contribuinte, que versem sobre a aplicação da legislação referente a tributos administrados pela Receita Federal do Brasil.
Assim sendo, no tocante à autuação fiscal, lançamento ou controvérsia que não supere mil salários mínimos, até R$ 1.305.000,00, o julgamento administrativo-fiscal será realizado em última instância por órgão colegiado da Delegacia de Julgamento da Receita Federal do Brasil; e, não será julgado pelo CARF.
Por ser instância recursal mais aparelhada, paritária e isenta, ao perder a chance de recorrer para o CARF, o prejuízo do contribuinte é translúcido, tendo em vista que é cerceado de um importante instrumento processual, com caráter paritário e todos os recursos a ele inerentes; para passar a ser julgado administrativamente pela 1ª Instância Fiscal, com total proximidade com a fiscalização originária e notória tendência de manter a conduta fiscal analisada.
Com efeito, me esforço em crer que a redação desta alteração de alçada para acesso ao CARF foi um grande equívoco, pois, caso contrário seu redator estava tomado por espírito antidemocrático e o despreparo jurídico, impondo flagrante transgressão à Constituição da República, fechando as portas da ampla defesa, com os recursos a ela inerentes, justamente a micro e pequena empresa, a quem a Carta Magna jurou tratamento favorecido e não desfavorecido.
Aliás, segundo o SEBRAE “os pequenos negócios respondem por mais de um quarto do PIB brasileiro. Juntas, as cerca de 9 milhões de micro e pequenas empresas no País representam 27% do PIB, um resultado que vem crescendo nos últimos anos.”
Ainda informa que “as micro e pequenas empresas são as principais geradoras de riqueza no Comércio no Brasil, já que respondem por 53,4% do PIBdeste setor”; e, finalmente que são responsáveis por 52% dos empregos com carteira assinada e 40% dos salários pagos.
Neste quadro, esta restrição draconiana de acesso à justiça fiscal afronta a razoabilidade e a proporcionalidade garantidas constitucional e legalmente. Para se ter um paralelo, basta lembrar que a alçada anterior era de sessenta salários mínimos, pulando abruptamente a mil, no montante de R$ 1.305.000,00.
A propósito, no Poder Judiciário a alçada para pequenas causas, a opção do cidadão, é no limite de no máximo quarenta salários mínimos para que a questão seja apreciada no Juizado Especial Cível da Justiça Estadual; e, até sessenta salários mínimos na Justiça Federal. A própria definição constitucional de relevância federal para o STJparte do patamar de quinhentos salários mínimos.
Enfim, quanta insanidade! Estando a MP 1160/23 em tramitação, ainda há tempo de se retratar. O CARF não pode ser um tribunal administrativo aristocrático, elitista, dos ricos e poderosos. Que tratamento favorecido é esse? Certamente, não é em favor dos empresários pequenos e vulneráveis.
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