por Kleber Carrilho
Publicado em 22/10/2022, às 09h47
Eu sou um democrata. E, para mim, a democracia liberal vem antes de qualquer coisa. É o meu dogma. Não tem projeto político nenhum que me convença sem que tenha como premissa a democracia que se desenvolveu, com todos os seus percalços, nos últimos 300 anos.
Você pode dizer que eu sou velho, que não entendi o mundo pós-moderno, que minha visão é eurocêntrica. E é mesmo! Você pode me acusar de qualquer coisa, mas não pode colocar a democracia liberal em risco. Afinal, é ela que garante o tal Estado Democrático de Direito que, também com todas as suas falhas, foi a melhor organização que demos para tentar dar conta das complexidades dos grandes grupos sociais.
Ah, mas e a família? Família é parte da sociedade, e por isso deve ser respeitada dentro desse ambiente. Porém, não pode ser maior do que o império racional das leis.
E a religião? Deve ser respeitada, com garantia da liberdade de culto para todos. Mas não pode ser confundida com a organização do Estado. Isso já foi definido, faz tempo, quando os franceses e os ingleses colocaram-na onde deve estar. Por que querer mudar o que tem se mostrado tão importante para garantir as liberdades individuais?
Mas não tem religião na política? Claro que sim! Em diversas ocasiões, já disse que acredito que não tem como achar que os sentimentos e as organizações religiosas não vão influenciar nas decisões políticas. Porém, cabe ao Estado uma coisa fundamental: garantir que os religiosos não ultrapassem os limites que colocam em risco a democracia, querendo levar as suas crenças para o padrão de comportamento de quem não professa a mesma fé.
Durante os últimos anos, a democracia brasileira sofreu. Primeiramente, porque pouca gente sabe para que ela realmente serve. Não educamos a população para isso, não a incluímos nas discussões ou nas instâncias de decisão, e quando houve uma melhoria na vida das pessoas, foi principalmente para o consumo. Até a chegada dos mais pobres à Universidade, em grande parte, foi feita sobre bases pouco sólidas, que enriqueceram grupos que exploram a educação, mas não trouxeram capacidade de produção nem de reflexão.
Deixando de lado as discussões sobre os erros, cabe agora tentar salvar o que sobra da nossa democracia. Tentar provar, se ela sobreviver ao 30 de outubro e aos momentos seguintes, que viver em um país democrático vale a pena para todos. Para isso, vai ser necessário muita coisa. Primeiramente, assumir que precisamos de um sentimento de pertença ao país, de desenvolvimento conjunto, e não a ideia que tem se mostrado a que mais define o nosso país, de que cada indivíduo olha para o seu grupo e quer se dar bem isoladamente, sem se preocupar se o resto da sociedade continua tendo problemas graves.
E, se você está na Faria Lima e acha que a democracia liberal nem é tão importante assim, e que dá para manter só um mercado livre, com concorrência, em um país em que o Estado se preocupa com questões morais, esqueça. Ou você consegue me indicar um país em que haja livre mercado (de verdade) sem liberdade individual? Afeganistão? Irã? Cuba? China?
Com tantos desafios para o próximo dia 30, faça essa pergunta: você está pensando no melhor ambiente para se dar bem? Ou no desenvolvimento de uma sociedade livre e inclusiva? Porque é disso que trata a democracia, que eu continuo a defender, como minha grande crença na capacidade da humanidade criar coisas boas.
E você? Vai defender a democracia também?
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