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Reinaldo Polito: Bandido bom é bandido morto?

Especialmente em épocas de aumento da criminalidade, há um clamor popular para que os bandidos sejam eliminados. Quando um delinquente morre nos embates com a

Reinaldo Polito: Bandido bom é bandido morto?
Reinaldo Polito: Bandido bom é bandido morto?

Redação Publicado em 10/10/2021, às 00h00 - Atualizado às 13h04


A injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça por toda a parte. (Martin Luther King Jr.)

Bandido bom é bandido morto?

Especialmente em épocas de aumento da criminalidade, há um clamor popular para que os bandidos sejam eliminados. Quando um delinquente morre nos embates com a polícia, ou nas disputas entre as próprias facções, tem gente que fica feliz: um a menos para atormentar a nossa vida. E quando os bandidos são presos, dá para ouvir aqui e ali: vai comer do bom e do melhor, sem trabalhar, e nós é que temos de sustentar esses vagabundos.

Tive um aluno que viveu no olho do furacão, o coronel Ubiratan. Sim, aquele mesmo do massacre dos 111 no Carandiru. Conversei muito com ele sobre o episódio. Ele me dizia: Polito, pensa no inferno. Aquilo era pior que a casa do demônio. Você não sabe o que é enfrentar esse tipo de gente. Ninguém estava ali porque roubou um pirulito. Não, amigo, eram pessoas perigosas, dispostas a matar quem encontrassem pela frente.

Alguns poderiam ser recuperados

Tentei argumentar que estavam sob a proteção do estado, e que talvez houvesse outra forma de contornar a situação, que não fosse aquela chacina. Ainda que muitos pudessem ter esse perfil descrito pelo coronel, e mesmo assim, talvez, não houvesse justificativa para o que ocorreu, alguns não tão perigosos, que haviam saído do caminho por um acaso da vida, poderiam ser recuperados.

Quando discuto esse tema com alguma pessoa mais radical, ouço a “condenação” veemente: que nada, Polito, bandido bom é bandido morto. Essa cambada não faz falta nenhuma à sociedade. Se estivessem por aí, continuariam matando e roubando. Talvez tirassem a vida de mais de 111 inocentes. Saímos no lucro.

Morte trágica

Por ironia do destino, o coronel, com toda a sua experiência e preparo para enfrentar bandidos da mais alta periculosidade, acabou sendo assassinado. Um crime que até hoje não foi bem explicado. No dia 10 de setembro de 2006, um de seus assessores encontrou o corpo no apartamento dele. Havia sido morto com um tiro do lado direito do peito. Teve gente que não perdoou. No muro do prédio onde residira, picharam a seguinte frase: “aqui se faz, aqui se paga”.

Não há mesmo consenso sobre esse assunto. Para uma parte da população, a pena de morte resolveria o problema da criminalidade. Para outra, ninguém tem o direito de tirar a vida de ninguém, só Deus. Nos Estados Unidos, por exemplo, há estados que adotam a pena de morte, enquanto outros chegam no máximo à prisão perpétua.

Evangélicos na prisão

Roberto Jefferson conta que quando esteve preso, todas as semanas um grupo de evangélicos ia até à prisão para fazer orações com os detentos. Ele disse ter ficado impressionado com o comportamento daqueles que estavam ali confinados e, de certa forma, desesperançados. As orações e as palavras de incentivo para uma vida mais plena haviam transformado a existência daquelas pessoas.

Essa experiência fez com que ele acreditasse na recuperação dos que se desviam do bem por algum motivo. Há gente ruim, que jamais encontrará portas para retornar em paz à vida em sociedade, mas muitos, talvez, precisem apenas de uma oportunidade para se redimir dos seus deslizes.

O prisioneiro Paulo

Esequias e Daniele Soares na obra “29 minutos para entender a Bíblia”, contam uma passagem marcante: “O livro de Atos dos Apóstolos termina com Paulo numa prisão domiciliar em Roma, onde atendia a todos que desejavam ouvi-lo. Enquanto aguardava a audiência com Nero, na qualidade de cidadão romano, ele escreveu quatro epístolas aos Efésios, aos Filipenses, aos Colossenses e a Filemom, entre os anos 62 e 63”. Quem há de dizer que Paulo não estaria em condições de deixar a prisão para continuar sendo útil à humanidade?

Estamos aqui nos referindo aos casos mais graves daqueles que cometeram crimes e precisam pagar por seus atos, mas quantos são os que julgamos do alto do nosso pedestal, sem sabermos bem quais são as agruras de sua vida.

A mulher adúltera

Mais uma vez temos o ensinamento do Livro Sagrado. Os escribas e os fariseus haviam levado uma mulher adúltera até o Monte das Oliveiras, onde se encontrava Jesus. Eles queriam descobrir um meio de acusá-lo. Por isso, disseram: “Mestre, esta mulher foi flagrada cometendo adultério. Moisés, na Lei, nos mandou apedrejar tais mulheres. E tu, o que dizes?”. Após algum tempo agachado em silêncio, Jesus levantou o corpo e disse: “Quem dentre vós não tiver pecado, atire a primeira pedra”.

Ao ouvir essas palavras, todos foram saindo um a um, a começar pelos mais velhos. Sozinho com a mulher, ele disse: “Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou?”. Ela respondeu: “Ninguém, Senhor”. Jesus disse-lhe, então: “Eu também não te condeno. Vai, e de agora em diante não peques mais”.

Quando estivermos alterados, e apontando o dedo para as falhas do próximo, quem sabe possamos refletir a respeito do que levou aquela pessoa a errar. Será que nós, ou aqueles de quem gostamos muito, nunca agimos de maneira semelhante? Siga pelo Instagram @polito

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Reinaldo Polito é Mestre em Ciências da Comunicação e professor de oratória nos cursos de pós-graduação em Marketing Político, Gestão Corporativa e Gestão de Comunicação e Marketing na ECA-USP. Escreveu 34 livros com mais de 1,5 milhão de exemplares vendidos em 39 países. Siga no Instagram @polito pelo facebook.com/reinaldopolito pergunte no [email protected]
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