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FUNDIU, E AGORA? As consequências da fusão partidária

Por Amilton Augusto*

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Redação Publicado em 21/02/2022, às 00h00 - Atualizado às 07h31


Por Amilton Augusto*

FUNDIU, E AGORA?

As consequências da fusão partidária

Recentemente o PSL e o DEM realizaram uma fusão partidária, dando origem ao mais novo partido do cenário político nacional, o União Brasil, que já nasce como o maior partido do país na atualidade, com cerca de 81 deputados federais, 7 senadores, 3 governadores, centenas de prefeituras e um fundo partidário que supera a marca de 1 bilhão de reais, além do maior tempo de propaganda eleitoral no Rádio e na Televisão.

Ocorre que, após a fusão ser chancelada pelo Tribunal Superior Eleitoral, o questionamento que surgiu foi a respeito das migrações partidárias, ou seja, quais as regras aplicáveis para aqueles filiados, detentores ou não de mandato eletivo, oriundos dos antigos PSL e DEM, que tenham interesse em deixar a nova sigla e seguir para outro partido político, bem como aqueles que tenham interesse em ingressar no novo União Brasil, independente da janela partidária.

Antes de adentrarmos na questão relacionada as regras aplicáveis à fusão partidária, vale um esclarecimento acerca da migração partidária, de um modo geral, especialmente diante da questão da infidelidade partidária, cujos impactos atingem qualquer filiado, seja ele detentor de mandato ou não, assim como aqueles que sejam suplentes aos cargos proporcionais (deputados e vereadores).

Destaca-se, assim, que não detentores de mandato eletivo não são impactados pela infidelidade partidária (salvo se suplentes aos cargos proporcionais), podendo migrar livremente de partido, assim como os detentores de mandatos eletivos que tenham cargos majoritários (presidente da República, governadores, prefeitos e senadores), e, durante a janela partidária, no presente ano, os deputados estaduais e federais, excluindo-se, por consequência, os vereadores, que nessas eleições não são beneficiados pela janela, justamente porque a regra é aplicável, como versa a lei, para aquele que está no último ano do mandato.

Nesse sentido, agora nos cabe explicar o significado e consequências da fusão partidária, que pode ser definida, entre outros conceitos, como o ato pelo qual dois ou mais partidos políticos se associam para formar um novo partido, dissolvendo-se os partidos originários, ou seja, unem-se dois ou mais partidos, que são extintos, dando origem a um novo partido político.

Referido assunto é tratado pela Lei dos Partidos Políticos (Lei nº 9.096/95), em seu artigo 2º, caput, que prevê que é livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, cujos programas respeitem a soberania popular, o regime democrático, o pluripartidarismo e os direitos fundamentais da pessoa humana”, repetindo disposição constitucional de respeito aos fundamentos e objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, vez que a lei regulamenta os artigos 17 e 14, § 3º, inciso V, da Constituição de 1988.¹

Assim, a fusão partidária, após aprovada pela Justiça Eleitoral, como no caso do União Brasil, diferente do que acontecia no passado, regrado pela Resolução-TSE nº 22.610, não cria mais uma justa causa para migração partidária sem a caracterização da infidelidade partidária no caso daqueles detentores de mandato que visem sair do seu partido para a nova sigla criada a partir da fusão, só permitindo que se faça durante a chamada “janela partidária”, acima citada, prevista no artigo 22-A, da Lei dos Partidos Políticos, que estabelece o prazo de 30 dias, nos seis meses que antecedem a eleição, que nesse ano vai de 02 de março até 02 de abril.

Ocorre que, diversamente do que havia no passado, o tema migração partidária e infidelidade partidária, diferente do que tínhamos no passado, especificamente aqueles detentores de cargos proporcionais, pauta-se pelo previsto no artigo 22-A, caput e parágrafo único, da Lei nº 9.096/95, que prevê expressamente e de modo taxativo que “perderá o mandato o detentor de cargo eletivo que se desfiliar, sem justa causa, do partido pelo qual foi eleito, salvo se caracterizadas uma das seguintes hipóteses: a) mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; b) grave discriminação política pessoal; e c) mudança efetuada durante o período de trinta dias que antecede o prazo de filiação exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao término do mandato vigente [janela partidária].”

Portanto, uma vez que a referida lei traz de modo expresso que a perda do mandato eletivo por infidelidade partidária se dará no caso dos detentores de mandato eletivo que deixarem, sem justa causa, o partido pelo qual fora eleito, fica claro que, no caso da fusão partidária, tendo em vista que o partido criado a partir da fusão, como no exemplo do União Brasil, mesmo para aqueles eleitos originariamente pelo PSL e DEM, vez que não deixariam o partido que o elegeu (União Brasil), em tese, teriam uma justa causa para deixarem este e migrarem para qualquer outra legenda, não sendo permitido o contrário, ou seja, não havendo permissão legal para migração de uma legenda pré-existente para o novo partido. Trata-se, no entanto, de interpretação doutrinária, que ainda não passou pelo crivo do Judiciário, sendo portanto uma tese que poderá ser decidida pela Justiça Eleitoral através de uma Consulta.

Conclui-se, então, que não há qualquer possibilidade de detentores de mandato eletivo proporcionais, tais como deputados federais, estaduais e vereadores, migrarem para o partido fundido, no presente exemplo o União Brasil, salvo durante a janela eleitoral, que se abrirá em 02 de março, os deputados estaduais e federais, podendo, no entanto, vez que a legislação veda especificamente a saída sem justa causa do partido pelo qual o mandatário fora eleito, permitindo, assim, por via transversa, a migração do partido fundido, mesmo que eleitos pelos partidos que deram causa a fusão, para qualquer outro partido já pré-existente, exceção que não se aplica aos casos de incorporação (com exceção do partido incorporado que deixar de existir, caso em que o parlamentar poderá sair) ou federação partidária, que veda expressamente a migração fora dos casos de justa causa e da janela partidária em qualquer situação.

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¹ Disponível em https://www.politize.com.br/fusao-partidos-politicos/

*Amilton Augusto
Advogado especialista em Direito Eleitoral e Administrativo. Vice-Presidente da Comissão de Relacionamento com a ALESP da OAB/SP (2019-2021). Membro julgador do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/RJ. Membro fundador da ABRADEP – Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (2015). Membro fundador e Diretor Jurídico do Instituto Política Viva. Membro do Conselho Consultivo das Escolas SESI e SENAI (CIESP/FIESP). Coautor da obra coletiva Direito Eleitoral: Temas relevantes – org. Luiz Fux e outros (Juruá,2018).  Autor da obra Guia Simplificado Eleições 2020 (CD.G, 2020). Coautor da obra Dicionário Simplificado de Direito Municipal e Eleitoral (Impetus, 2020).  Palestrante e consultor.  Contato: https://linktr.ee/dr.amilton
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