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O Vazio das Propostas

Por Marcus Vinícius de Freitas*

O Vazio das Propostas
O Vazio das Propostas

Redação Publicado em 04/05/2022, às 00h00 - Atualizado às 08h10


Por Marcus Vinícius de Freitas*

O Vazio das Propostas

À medida que se aproxima o pleito eleitoral de 2022, somos compelidos, em razão da proporção que assume a eleição presidencial, a ignorar a importância das várias eleições que ocorrem simultaneamente. Isto esvazia a importância destes outros cargos e dilui a responsabilidade daqueles que exercerão funções fundamentais para o Brasil. A eleição presidencial, infelizmente, contamina a discussão tão intensamente que não cobramos, de fato, planos para melhoria das condições do País por parte dos outros agentes públicos a serem eleitos.

No Brasil, construiu-se um sistema eleitoral em que todos são irresponsáveis. Não temos voto distrital puro, os partidos praticamente não fazem prévias, os governos são sempre resultados de conchavos políticos e para piorar ainda temos a figura do suplente, que eventualmente assumirá o poder sem nenhum voto. Os partidos têm donos e logo os eleitos descobrem que sua capacidade de execução está atrelada à maquina partidária. E o eleitor segue ignorante sobre tudo isto.

É preciso mudar este cenário. Obviamente que a melhoria econômica do País deve constituir o objetivo fundamental do governo. Ser brasileiro é caro. Produzir no Brasil é caríssimo. Paulatinamente, a sanha tributária do Estado brasileiro tem transformado o País num lugar sem competitividade, baixa produtividade e inovação reduzidíssima. O Estado, que deveria ser o estimulador da produtividade, é pródigo em medidas estapafúrdias, que não incentivam o aumento da produtividade. O governo federal, se quisesse aumentar a produtividade do País, por exemplo, deveria desonerar todo e qualquer equipamento que a incremente, como, por exemplo, computadores, máquinas de produção industrial, dentre outras. Optamos, no entanto, em zerar o imposto de importação de jet skis, ao invés de zerar impostos para tablets ou modems, por exemplo, para facilitar o acesso à Internet nas escolas ou a melhoria no ambiente empresarial.

Impressiona como os parlamentos estejam tão desconectados da realidade de um país que é rico e próspero, mas cuja maioria da população está condenada à escassez e à ignorância. Notamos nos parlamentos e nos governos um deserto de ideias quanto àquilo que é necessário fazer para o Brasil ter relevância e ser um bom país para seus cidadãos. Nos ciclos eleitorais das duas últimas décadas, os temas seguem repetidos: saúde, educação e segurança. Nos três aspectos, o Brasil vem amargando péssimos resultados. Durante o período da propaganda eleitoral se verá, muitas vezes, um circo em que o público assume o triste papel de protagonista como palhaço.  É hora, portanto, de buscarmos melhorar a situação. E também de pararmos de importar a agenda lixo dos países mais desenvolvidos que pouco contribuirão, ao final das contas, para a melhoria efetiva da qualidade de vida do cidadão brasileiro.

A eleição presidencial deveria, portanto, ser desconectada de todas as outras. Ela atrapalha a devida reflexão, por parte do eleitor, quanto aos candidatos em quem votará. Uma eleição descasada, com um hiato de, pelo menos, uns dois ou três meses, faria a população refletir se o candidato eleito deveria ou não ter maioria no Congresso para governar.

Ademais, em nenhum momento, explica-se ao eleitor o papel que, efetivamente, cada posição possui. Partimos de platitudes, porém sem especificar exatamente qual é o papel de um Deputado Estadual, Deputado Federal, Senador e Governador. Também se esconde do eleitor os suplentes que poderão assumir os cargos, particularmente no caso do Senado Federal. O Tribunal Superior Eleitoral – que não deveria existir – deveria adotar uma postura educativa para explicar ao eleitor cada função, a fim de que, consciente da função, este consiga imediatamente identificar as falácias das promessas feitas pelos candidatos.

Assim, em breve nos daríamos conta, por exemplo, de que talvez uma Assembleia Legislativa seja desnecessária em cada Estado. Ou que algumas funções, por exemplo, como vereadores não devessem constituir uma carreira política e não deveriam ser remuneradas. Ou, ainda, que governadores são os responsáveis pela segurança pública e exercem funções que, por exemplo, seriam melhor operacionalizadas por Prefeitos ou pelo Presidente da República. O que não pode acontecer é abandonarem-se os problemas locais para ficar discutindo assuntos de natureza nacional e global.

O fato é que, a cada ano, a situação do Brasil não melhora. A diáspora brasileira no Exterior só aumenta em razão do descontentamento com a qualidade de vida no País. Infelizmente, Brasília vive uma outra realidade que não é a vivida pelos cidadãos. Este distanciamento entre eleitor e eleito é extremamente ruim para um sistema político, pois reduz a conexão necessária para o avanço da sociedade.

É preciso repensar o sistema político brasileiro e, principalmente, instituir o mérito. Para exercer uma função pública, o indivíduo precisa ser qualificado. Se para concursos públicos exigimos determinados requisitos, porque para elegermos representantes qualquer um pode assumir a função? Por quanto tempo seguiremos nas mãos de indivíduos desqualificados dirigindo nossas cidades, estados e país?

Globalmente, vemos que as democracias têm apresentado suas profundas falhas e tido dificuldade em traçar novos rumos para o futuro. Mas, como bem afirmou Winston Churchill, “ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos.” Precisamos de propostas efetivas para aprimorar nossa democracia.

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*Marcus Vinícius De Freitas
Professor Visitante, China Foreign Affairs University
Senior Fellow, Policy Center for the New South
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