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Denúncia

Procurador-geral de Justiça de São Paulo admite que há assédio moral no MPSP

Em entrevista exclusiva, Mário Sarrubbo admite a existência de assédio moral e sexual no Ministério Público, que tem levado servidores ao suicídio e relativiza os casos ao dizer que as mortes não estão relacionadas à sobrecarga de trabalho e perseguição

Procurador denuncia suicídios após assédio moral e sexual nos corredores do Ministério Público - imagem: reprodução Cartão de Visita / R7
Procurador denuncia suicídios após assédio moral e sexual nos corredores do Ministério Público - imagem: reprodução Cartão de Visita / R7

Jair Viana Publicado em 12/06/2023, às 21h47


Pressão, gritaria, ataques de sentimento de superioridade, descaso com subalternos, gritos e mais gritos pelos corredores de um órgão público. Essas são apenas algumas das muitas queixas que servidores do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) registram há mais de um ano e, apesar do procurador-geral de Justiça de SP Mário Sarrubbo ter conhecimento da gravidade do problema, pouco tem sido feito para resolvê-lo.

"Você pergunta, tem assédio moral no MP de São Paulo? Tem, é claro", confirma Sarrubbo. No entanto, ele credita os casos ao estado de emergência imposto ao mundo pelo coronavírus. "A pandemia aumentou o suicídio em todos setores. Na universidade, nos escritórios de advocacia, aumentou também", pondera.

O ponto de ignição que expôs todo esse sentimento entre os servidores foi o suicídio de um funcionário dentro da instituição em 29 de junho do ano passado. Este é apenas um dos três casos de suicídio que foram registrados em menos de um ano.

Nesse ambiente em que o desespero toma conta, estão servidores de todos os departamentos, que vão da portaria à zeladoria, passando por diretorias, áreas técnicas até chegar à antessala do procurador geral do Estado, Mário Sarrubbo.

Para tentar modificar a cultura institucional, um grupo de servidores elaborou um questionário e constatou que, somente em 2022, houve 300 casos de assédio dentro da Instituição. Esse levantamento deu origem a um manifesto público que contem pedidos como: criação de comissão de assédio moral e sexual com participação ativa de servidores; disponibilização de psicólogos e rede de atendimento aos servidores revogação dos instrumentos abusivos de avaliação dos servidores; instituição de ouvidoria de assédio moral e sexual.

No protesto, além de reclamarem do descaso, os servidores relatam casos de sobrecarga de trabalho e assédio moral, muitas vezes de forma institucionalizada, que acaba adoecendo os trabalhadores.

Entre os relatos estão ameaças de que o funcionário não vai passar em concurso e execução de funções como servir café ao promotor e buscar o carro no lava-rápido. Também há casos de gritos e ameaças de aberturas indevidas de processos administrativos.

Segundo o levantamento, as denúncias de assédio moral estão em maior número. No caso do assédio sexual, as vítimas são mulheres que relatam ter que se agachar para pegar processos no chão ou serem colocadas contra a parede, por exemplo.

Um servidor que não quer ter o nome revelado por medo de represália conta que sofreu perseguição após uma atitude desagradar os superiores. "Me ligou gritando e disse que abriria procedimento contra mim. Comecei a receber advertências por um ou dois minutos que passei da hora do almoço. Fiquei sob estresse absurdo, sinalizei e nada aconteceu. Fui censurado por questionar. Telefonavam ou iam na sala para saber se eu estava trabalhando", diz. E complementa: "Mesmo usando os instrumentos internos de investigação, não dá em nada e você fica marcado".

De acordo com os servidores já assediados, 68,5% não levaram o caso a alguém ou denunciaram formalmente. Os motivos mais apontados foram medo de perseguição e "sabia que não daria em nada".

As manifestações de assédio moral mais recorrentes, segundo o questionário, foram gritos, pedidos agressivos, ameaças e pressão psicológica. Para o servidor que é formado em Direito, a cultura do assédio está arraigada na divisão entre membros (diretoria) e servidores.

"Se valem dos cargos de confiança para assediar. Os promotores de justiça não possuem formação técnica na gestão de pessoas e isso pode contribuir para tanto despreparo e autoritarismo. Isso é um gargalo terrível e contribui para a cultura do assédio e do medo de denunciar. A ideia não é caça às bruxas, quero que mude", ressalta. "Aquele olhar de carcereiro que olha o preso".

O levantamento feito internamente apontou que 71,5% dos servidores conhecem alguém que tenha se afastado do trabalho por burnout, síndrome do pânico, transtorno obsessivo-compulsivo, depressão ou crise de ansiedade. Segundo a pesquisa, 30,1% disseram tomar remédio psiquiátrico controlado. Quando perguntados se o diagnóstico tinha a ver com o MP, 39,8% afirmaram que sim ou em parte.

O procurador-geral de Justiça de SP, Mário Sarrubo, em entrevista exclusiva ao Diário, lamentou os suicídios ocorridos em sua pasta, porém nega que estejam relacionados ao trabalho. Sarrubbo negou que haja cobrança de metas.

O procurador também disse que funcionários já foram punidos pela prática de assédio. Sarrubbo afirmou ainda que tem instrumentos de atenção aos servidores que apresentam algum problema.

Um dos instrumentos é o "Converse com a PGJ (Procuradoria Geral de Justiça)". É uma canal de comunicação entre servidores e a chefia. Sarrubbo fez questão de mostrar que seu órgão tem mais de cinco mil funcionários. Deste universo, três casos de suicídios foram registrados em menos de um ano.

Para Sarrubbo, "não há assédio na estrutura do Ministério Público de São Paulo", mas negou que exista cobrança de metas. Para o procurador existe também um movimento político que aproveita esses casos para afirmar que o assédio é institucional no MPE. "Não é", afirmou.

É importante citar que Mário Sarrubbo confirmou em nota que há assédio no MPSP, ou seja, apesar de negar que exista assédio em sua estrutura ele confirma que existem situações de assédio dentro do órgão público.

Nota do Ministério Público de São Paulo

O Ministério Público de São Paulo encaminhou uma nota à imprensa para se posicionar sobre o conteúdo da reportagem. Novamente foi confirmado que há casos de assédio dentro do MPSP. Leia na íntegra abaixo:

"O MPSP desmente veementemente o conteúdo do texto divulgado nesta quarta-feira (14/6), a começar pelo título: "Mário Sarrubbo, procurador-geral de Justiça de SP, admite assédio moral no MPSP".

A declaração do chefe do Ministério Público de São Paulo ao repórter, que para a nossa surpresa não assina a referida matéria, tendo sido a autoria do texto atribuída a outra pessoa, deu-se em sentido diametralmente oposto ao que se tenta fazer crer.

A instituição, portanto, reafirma o seu compromisso com a preservação de um ambiente de trabalho
acolhedor e amistoso. Importante informar que os raros casos de prática de assédio constatados no âmbito da instituição resultaram nas devidas sanções a seus autores.

Por fim, vale ressaltar que a democracia, cuja defesa é uma das atribuições do Ministério Público, pressupõe a existência de veículos de comunicação fortes e independentes. Desnecessário dizer, entretanto, que a liberdade de imprensa deve ser utilizada para informar, não para perpetrar inverdades, situação que lamentamos profundamente".

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