por Marcus Vinícius De Freitas
Publicado em 02/10/2024, às 09h53
Recentemente, assisti a uma impressionante entrevista com o Jin Liqun, presidente do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura, na China Global Television Network (CGTN). Quando perguntado qual era seu orgulho, ele não titubeou em afirmar que ser chinês era a coisa mais importante de sua vida, e do incrível orgulho que sentia da sua nacionalidade. Confesso que jamais ouvi de brasileiros que têm ou tiveram uma posição de proeminência internacional a ênfase no orgulho de seu país. E isto é preocupante.
O Brasil é um país de grandes contrastes e complexidades. Ainda assim, o orgulho da pátria deveria ser um dos fatores mais importantes da cidadania. Temos uma história rica, um território invejável e peculiaridades que nos distinguem como povo e nação. O brasileiro deveria ter orgulho, baseado em um patriotismo consciente, reconhecendo as inúmeras virtudes e os desafios transponíveis da nação. Um futuro de sucesso requer um olhar equilibrado sobre o passado, reconhecimento dos erros e celebração dos acertos, na busca constante de renovação e rejuvenescimento.
Os brasileiros deveriam ter admiração por sua pátria. O País apresenta um caleidoscópio de coisas positivas: diversidade cultural, riqueza natural, resiliência e superação dos desafios. No entanto, um quadro institucional deteriorado nos três poderes, nas três esferas da União, nos leva a desacreditar o enorme potencial do País. Além disso, a complacência na ética da sociedade é perigosa ao relativizar valores e padrões.
Durante o Brasil Imperial, o Brasil contava com respeito internacional. Dom Pedro II era um líder admirado mundialmente por sua erudição e diplomacia.O Imperador compreendia claramente o enorme desafio de liderar o País com responsabilidade e justiça, particularmente considerando o cancro da escravidão e da mentalidade colonizada – um dos desafios que ainda prevalece no País. "O trono é apenas uma cadeira de espinhos," reconhecia Dom Pedro II. Ainda assim, sua liderança foi essencial para o Brasil implementar avanços como, por exemplo, a primeira ferrovia e o fim gradual da escravidão. Os maiores heróis da história brasileira – e dos maiores motivos de orgulho da nacionalidade – advêm deste período glorioso.
A cultura brasileira, fruto da miscinegação indígena, africana, europeia e asiática, resulta numa rica e multifacetada identidade. Samba, futebol e carnaval são apenas algumas das manifestações dessa pluralidade global que desde os tempos de Carmem Miranda e Pelé tem gerado curiosidade e apelo global.
O brasileiro deveria, ainda, orgulhar-se da sua enorme capacidade de superação. O País teve à sua frente inúmeras lideranças rasas, de moralidade duvidável, corruptas e ineficientes. Com isto, o País foi obrigado a enfrentar diversas crises, desde períodos de ditadura até crises econômicas severas. O país enfrenta, já há bastante tempo, uma enorme crise de violência e criminalidade alta. O crime organizado ocupa posições de relevância em todos os escalões da República e a leniência com o crime por parte dos tribunais é assustadora. No entanto, a resiliência do brasileiro continua como um fator determinante da contínua busca para solidificar um país mais democrata, justo e igualitário.
Para que o patriotismo seja genuíno e construtivo, o Brasil precisa confrontar as questões que lhe envergonham: a desigualdade social, a corrupção, a baixa qualidade educacional, o crime organizado, o empobrecimento cultural, o racismo, a síndrome de inferioridade e baixa autoestima. Além disso, o País precisa parar de consumir e importar o lixo ideológico produzido no Norte Global e compreender que suas prioridades são diferentes: o Brasil precisa crescer, as pessoas precisam trabalhar e produzir riqueza. Preocupações de rico você as tem quando for rico, ensinam os chineses.
A desigualdade social, por exemplo, é um obstáculo enorme ao desenvolvimento. O fosso entre ricos e pobres é um reflexo de séculos de concentração de renda e falta de acesso a oportunidades. O ensino que deveria reduzir essa distância se tornou ideologizado. É necessário reintroduzir a competitividade acadêmica como mola propulsora do conhecimento. O Brasil – para crescer – precisa de mais engenheiros e matemáticos que advogados. Essas realidades inibem o crescimento econômico sustentável, geram instabilidade social e condenam o País a um futuro medíocre. Nelson Mandela afirmou, com grande inteligência: “A pobreza não é um acidente. Como a escravidão e o apartheid, ela é feita pelo homem e pode ser removida pelas ações dos seres humanos.” Da mesma forma, a mediocridade não é um acidente. Ela pode e deve ser removida pelas ações humanas, da pré-escola à universidade.
A corrupção é uma triste realidade. O suspiro de alívio gerado pela Lava Jato tem-se transformado na vergonha da absolvição de réus confessos. A sucessão de escândalos políticos e a impunidade generalizada corroem a confiança nas instituições e, principalmente, no País. Este sentimento se alastra e se generaliza por toda a sociedade: escândalos abundam em todos os lugares, com alguém sempre tentando levar vantagem.
Retornando à entrevista de Jin Liqun, a China soube reinventar-se ao longo do tempo e isto é o maior motivo de orgulho do seu povo. O Brasil, à semelhança, também pode traçar um novo rumo de sucesso, sem estar aprisionado pelos erros do passado. Que o Brasil cometa novos erros, mas jamais repetir os anteriores. Que o País aprenda a valorizar o seu povo, a sua diversidade, cresça economicamente, enfatize a ética do trabalho, da educação e competitividade. E que o governo deixe de ser meliante em suas ações.
Se o passado do Brasil é marcado por conquistas, desafios e máculas, o futuro ainda está em aberto. Os erros do passado não determinam o futuro. Winston Churchill afirmou que “Aqueles que falham em aprender com o passado estão condenados a repeti-lo.” Reconhecer os erros do passado não é fraqueza, mas maturidade. O Brasil precisa de reformas profundas em diversas áreas. É preciso estratégia e pensamento de longo prazo.“O melhor modo de prever o futuro é criá-lo,” segundo Abraham Lincoln. Talvez seja a falta de criatividade de imaginarmos um futuro melhor o que nos falte.
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