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Crescimento Demográfico na China

Por Marcus Vinícius De Freitas

Crescimento Demográfico na China
Crescimento Demográfico na China

Redação Publicado em 29/09/2021, às 00h00 - Atualizado às 09h30


Por Marcus Vinícius De Freitas

Crescimento Demográfico na China

O governo chinês, a partir de setembro de 1980, implementou a “Política do Filho Único”, na qual a população foi convocada a aderir a política que, apesar de universal, também apresentava várias exceções, como o caso de grupos étnicos minoritários e de algum tipo de deficiência apresentada pelo primeiro filho. A política deu particular ênfase aos centros urbanos, onde, naturalmente, vivem famílias nucleares menores. Nas áreas rurais, onde as famílias tendem a ser maiores, houve resistência à restrição e, por parte do governo, maior flexibilidade.

O objetivo da política era conter um pouco do crescimento vegetativo do país, que, tinha, na ocasião, uma renda per capita de cerca de US$ 194.80 – a do Brasil era de US$ 1.947,28 – e um nível de pobreza extremamente elevado. Com isto, as projeções reconhecem que, dadas as circunstâncias anteriores, a China, caso não houvesse aplicado a política, teria uma população de, aproximadamente, 2 bilhões de pessoas. Assim, com a contenção, a população atual alcançou 1.4 bilhão. Houve uma evolução exponencial no crescimento econômico e social do país asiático, que conta, atualmente com uma renda per capita de US$ 11.820 – a do Brasil é de US$ 7.010 – segundo o Fundo Monetário Internacional.

A partir de novembro de 2013, o governo chinês passou a flexibilizar a política do filho único, com a possibilidade de as famílias terem dois filhos, se um dos pais fosse filho único. E, em 31 maio de 2021, foi anunciada a possibilidade de os casais terem até três filhos. A razão de tais políticas e resoluções tem a ver com a necessidade de aumentar a taxa de natalidade, reduzir o fardo da política do filho único, e com isso, garantir o crescimento da capacidade consumidora do mercado chinês, além de prover o sustentáculo para a sobrevivência dos mais idosos. O governo anunciou, ainda, uma série de medidas como licenças parentais, aumento dos direitos trabalhistas das mulheres e o aumento da rede de infraestrutura de acolhimento de crianças. Além disso, o governo tem enfatizado a necessidade de redução no custo de educação para que os pais possam ter o necessário incentivo a ter mais filhos.

De todos os obstáculos enfrentados pela China em seu processo de ascensão global, não há dúvida que o déficit demográfico é crucial, com o envelhecimento da população antes do efetivo aproveitamento do enriquecimento do país. O grande desafio, no entanto, reside na forma de estimular a população a ter mais filhos. Este desafio esbarra em três grandes obstáculos: (i) uma vez que a mulher entra no mercado de trabalho, naturalmente, a taxa de fertilidade cai, em razão do turno duplo ou triplo, muitas vezes impostos pela cultura; (ii) o custo crescente da educação no país, apesar da enorme rede de ensino público de qualidade disponível; e (iii) a mentalidade da geração Z, que, semelhantemente ao Ocidente, tem manifestado menor interesse em ter filhos no futuro.

Obviamente que a China não está sozinha neste desafio demográfico das últimas décadas. Muitos governos buscaram na diminuição do crescimento demográfico reduzir alguns dos problemas por eles enfrentados quanto aos desafios de aumentar o bolo econômico e de maior acesso a todos. No entanto, o resultado, em muitas partes, foi uma diminuição exagerada na taxa de natalidade. E o resultado é que o crescimento econômico futuro fica prejudicado. Os países vêm, portanto, adotando três alternativas para solucionar a questão: (i) o aumento orgânico, com medidas de estímulo para que nasçam mais crianças; (ii) o recurso da migração, com uma flexibilização maior na entrada de novas pessoas; e (iii) o uso da inteligência artificial como forma de cuidar do problema aceitando a realidade imposta pela baixa natalidade. De todas as soluções, a China tem fomentado a questão do crescimento orgânico aliado ao uso mais intensivo da inteligência artificial em futuras atividades domésticas. A questão migratória – adotada por alguns países ocidentais – é complexa diante da necessidade de adaptação cultural e da barreira idiomática.

O fato é que a commodity mais prevalecente, ainda, na China é o tamanho de sua população e mão-de-obra. O uso inteligente deste importante ativo do país permitiu-lhe dar um salto qualitativo no padrão de vida e na economia. E para evitar ficarem restringidos em seu crescimento econômico, a China vem agregando valor substancial ao nível educacional da população, com um acesso mais universalizado à educação superior de qualidade e com investimentos substanciais. Como se afirma sempre que o segredo para um país produtor de commodities é agregar-lhes valor, a China tem feito o mesmo na questão educacional. É por isto que o país, que já foi conhecido por manufaturar produtos de baixa qualidade, hoje em dia se transformou na fábrica global de produtos com altíssimo valor agregado.

O Brasil, que goza do bônus demográfico temporariamente, deveria atentar para a forma como os chineses estão enfrentando esta questão crucial. A segurança das gerações futuras está atrelada em investimentos altos na melhoria da qualidade educacional do país.

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*Marcus Vinícius De Freitas

Professor Visitante, China Foreign Affairs University
Senior Fellow, Policy Center for the New South
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