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COLUNA

Rosh Hashaná: O Ano-Novo Judaico e sua profunda simbologia

Rosh Hashaná - Imagem: Reprodução | Freepik
Rosh Hashaná - Imagem: Reprodução | Freepik
Agenor Duque

por Agenor Duque

Publicado em 03/10/2024, às 08h32


Rosh Hashaná, o Ano-Novo Judaico, é uma das festas mais importantes no calendário hebraico, sendo um período de renovação espiritual e reflexão. Tradicionalmente celebrado no primeiro e segundo dias do mês de Tishrei, Rosh Hashaná marca o início de um novo ciclo de vida e é uma oportunidade para avaliar o ano que passou e projetar intenções para o futuro. No calendário gregoriano, essa celebração costuma ocorrer entre setembro e outubro, diferentemente do Ano-Novo Civil, que ocorre em 1º de Janeiro. Mais do que apenas uma festa de passagem de ano, Rosh Hashaná é um momento solene, de introspecção e reavaliação pessoal, espiritual e comunitária.

Rosh Hashaná significa literalmente "cabeça do ano" em hebraico, indicando o início de um novo período. No entanto, sua conotação vai além de um marco temporal. Para a tradição judaica, este é um momento de julgamento divino, no qual Deus analisa os atos das pessoas e determina o destino de cada um para o ano vindouro. A crença judaica é de que o Livro da Vida é aberto nesse dia, e que durante os Dez Dias de Arrependimento (período que culmina com o Yom Kipur), as ações e orações dos indivíduos podem influenciar o resultado de seu destino. O caráter sagrado de Rosh Hashaná faz que a comunidade judaica o trate como uma oportunidade de renovação moral, espiritual e social.

As celebrações de Rosh Hashaná são tanto espirituais quanto comunitárias. As principais cerimônias acontecem nas sinagogas, onde orações especiais são recitadas. A oração mais importante do período é a Amidá, na qual são feitas súplicas por um ano de prosperidade e bênçãos. A leitura da Torá também é um elemento central, e há a inclusão de passagens que enfatizam a criação do mundo e o papel de Deus como soberano.

Um dos momentos mais aguardados é o toque do shofar, o chifre de carneiro, que é uma das marcas registradas de Rosh Hashaná. O som do shofar, grave e penetrante, serve como um "despertar espiritual" para aqueles que o ouvem, lembrando-os da necessidade de arrependimento e de uma reconciliação com Deus. O toque do shofar é mencionado na Bíblia, simbolizando tanto a soberania de Deus quanto o chamado à introspecção.

Outra característica importante de Rosh Hashaná é a refeição festiva, que traz consigo uma rica simbologia. Cada alimento consumido durante a celebração tem um significado específico, muitas vezes relacionado a um desejo para o novo ano, como, por exemplo, o desejo de “estar à frente” no novo ano que se inicia.

  • Maçãs com mel: O alimento mais tradicional, a maçã mergulhada em mel, simboliza o desejo por um ano doce. Ao consumir esse alimento, os judeus expressam o anseio por um período de bênçãos e alegria.
  • Romãs: A romã é frequentemente consumida porque, segundo a tradição, ela contém 613 sementes, o mesmo número de mandamentos da Torá. O fruto simboliza a esperança de que os indivíduos sejam repletos de boas ações e méritos no novo ano.
  • Cabeça de peixe ou carneiro: Outro alimento simbólico é a cabeça de peixe ou carneiro, que remete à liderança e ao desejo de "estar à frente" e não "na cauda" no ano que se inicia. A escolha de uma cabeça de carneiro também relembra a história de quando Abraão foi ao monte, disposto a sacrificar seu filho Isaac, um momento crucial na história do povo judeu.
  • Tâmaras, cenouras e outros alimentos: Tâmaras são consumidas para "eliminar" os inimigos, e as cenouras, que em hebraico remetem ao conceito de multiplicar, expressam o desejo por um ano de crescimento.

Além disso, o pão trançado, challah, que é tradicionalmente consumido em todas as celebrações do Shabat, assume um formato redondo em Rosh Hashaná, simbolizando a ciclicidade do ano e a continuidade da vida. Este detalhe evidencia o desejo de um ciclo completo, próspero e abençoado.

Rosh Hashaná também é um convite à introspecção profunda. Durante os dois dias da festa, os judeus são incentivados a refletir sobre a própria vida, suas escolhas e seus relacionamentos. É um tempo de arrependimento e reconciliação com Deus e com o próximo. Esse espírito de renovação culmina no Yom Kipur, o Dia do Perdão, que ocorre dez dias depois. Esses Dez Dias de Arrependimento, que começam com Rosh Hashaná e terminam com Yom Kipur, são um período de autocrítica, oração e boas ações, com o objetivo de alcançar o perdão divino e a purificação espiritual.

Além do julgamento individual, Rosh Hashaná também lembra os judeus da sua responsabilidade coletiva. A unidade do povo judeu e a necessidade de se manter fiel às leis de Deus são temas recorrentes nas preces e nos ensinamentos desse período.

Rosh Hashaná é, portanto, muito mais do que uma simples celebração de Ano-Novo. É um tempo de introspecção, arrependimento, renovação e esperança. Com o toque do shofar ecoando nas sinagogas e os alimentos festivos carregados de simbolismo, essa celebração convida os judeus a se conectarem com sua espiritualidade, a fortalecerem seus laços com Deus e a projetarem um futuro de bênçãos e realizações. A festa é um lembrete de que, para o povo judeu, o verdadeiro início de um novo ciclo começa com a introspecção, a reconciliação e a busca por um ano mais doce, justo e significativo.

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