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Risco de despejo e depressão: brasileiras não conseguem sair da Itália

“Parece um filme de terror, a sua ansiedade só vai aumentando e você sente todas as suas esperanças indo embora”. É assim que Bruna Schiavottiello, uma

Risco de despejo e depressão: brasileiras não conseguem sair da Itália
Risco de despejo e depressão: brasileiras não conseguem sair da Itália

Redação Publicado em 10/04/2020, às 00h00 - Atualizado às 13h28


Com aumento do Euro e tempo inesperado no país estrangeiro, brasileiros pedem socorro e reclamam de falta de assistência do Itamaraty

“Parece um filme de terror, a sua ansiedade só vai aumentando e você sente todas as suas esperanças indo embora”. É assim que Bruna Schiavottiello, uma publicitária de 25 anos, resume a situação dos brasileiros que tentam em vão sair da Itália em meio à crise provocada pela pandemia do novo coronavírus (Sars-Cov-2).

Bruna estava há anos se preparando para passar um tempo na Itália e obter a cidadania italiana. A ideia inicial era voltar para o Brasil assim que o processo fosse finalizado.

Ela está em Lecce, no sul do país , desde outubro de 2019 e no início de março já percebeu que seu dinheiro não seria suficiente para esperar a conclusão do processo. Ela então decidiu deixar uma procuração com uma amiga e antecipar a volta ao Brasil.

Na época, ela assistiu relatos de pessoas que tiveram voos cancelados e acabaram ficando presas em aeroportos, e por isso decidiu esperar que as coisas melhorassem. A situação, no entanto, ficou ainda mais grave, tanto na Itália quanto no Brasil e ela agora corre risco de ser despejada do apartamento onde está morando.

“Nessa situação toda você só vê o seu dinheiro indo embora. Usei o dinheiro que era da passagem para pagar mais um mês de aluguel e agora esse aluguel vai vencer e eu não sei o que fazer”, explica. “A situação toda é muito desesperadora, a cabeça fica a mil”, completa.

Questão de saúde

Como ela, Júlia Albanus, profissional de relações públicas de 31 anos, também corre o risco de se ver na rua. “Não tenho mais estrutura financeira e emocional de permanecer aqui. Minhas reservas estão acabando e minha família no Brasil também não tem como me ajudar, pois também foram atingidos pela crise”, explica.

Júlia foi para Gioia del Colle, no sul da Itália também para obter a cidadania italiana . Seu plano era se mudar para Londres depois de conseguir o novo passaporte, mas o resultado só veio em março, quando a situação na Europa já não era boa. Ela então decidiu voltar ao Brasil , mas com o isolamento social e os cancelamentos de voos se viu presa.

Além disso, Júlia toma um remédio controlado , que já está acabando e ela não sabe se será possível comprar mais. “Eu quero muito poder voltar para casa, onde me sinta minimamente segura diante deste caos”, conclui.

Prejuízo de mais de R$ 10 mil

Beatriz Campilongo

Arquivo pessoal Beatriz já teve quatro voos cancelados

Beatriz Campilongo é mais uma jovem que foi para a Itália fazer o processo de reconhecimento da cidadania italiana e não conseguiu sair do país.

A jornalista de 26 anos mora na Austrália e inicialmente voltaria para lá depois de um mês na Itália, mas decidiu vir para o Brasil por conta da pandemia e agora já está na Europa duas semanas a mais do que o planejado . Beatriz já teve quatro voos cancelados e um prejuízo de mais de R$ 10 mil.

Ela explica que o reembolso por parte das empresas aéreas ainda é incerto e deve ser demorado. Como as outras, Beatriz ainda enfrenta dificuldades para continuar vivendo onde está. “Aqui está super caro para me manter. O Euro está disparado e eu estou no meu limite já, por isso preciso muito de um posicionamento”, conta.

Beatriz e as outras duas entrevistadas vivem no sul da Itália, o que significa que para voltar para o Brasil precisariam arranjar ainda uma forma de chegar a Roma, distante cerca de 600 km , uma vez que o transporte ferroviário e rodoviário no país também está interrompido.

Pedido de socorro

Beatriz relata que quando começou a se ver sem opções, usou o Facebook para buscar outros brasileiros na mesma situação.

Dessa maneira, eles formaram um grupo com 49 pessoas que estão espalhadas no país europeu – 16 delas em um cruzeiro que está ancorado em Roma desde o dia 25 de março – e tentam retornar.

Eles estão em contato com o Consulado do Brasil na Itália há semanas, mas afirmam que não recebem nenhum tipo de ajuda, apenas pedidos de preenchimentos de formulários.

“É um descaso por parte das autoridades brasileiras”, reclama Júlia Albanus. “Só mandam formulários. Não sabemos se vai ter voo ou não, se teremos que pagar, quando vai ter. Não sabemos nada”, detalha Beatriz.

“A nossa única esperança é o governo brasileiro fazer alguma forma de repatriação ou algum acordo com as companhias aéreas, porque a gente não tem mais dinheiro, a gente não tem mais como ficar aqui”, resume Bruna Schiavottiello.

Depois de inúmeras tentativas, os brasileiros gravaram um vídeo pedindo socorro e publicaram nas redes sociais na esperança de exercer uma pressão sobre o Itamaraty (assista abaixo).

Resposta do Itamaraty

Procurado pela reportagem, o Ministério de Relações Exteriores  (MRE) afirmou por meio de nota que “persistem rotas aéreas de retorno ao Brasil”. Frente à insistência sobre quais seriam as rotas, uma vez que as três entrevistadas reforçam a impossibilidade de conseguir um voo de retorno para o Brasil, o Itamaraty afirmou que “a última informação disponível aponta para a possibilidade de conexão por Frankfurt e Amsterdã “.

“Há que recordar que as representações brasileiras não têm poder sobre as companhias aéreas, mas têm buscado negociar a continuidade de rotas que permitam sua volta ao país”, continua a nota enviada.

O MRE diz ainda que “está buscando soluções para a repatriação de brasileiros. A prioridade, desde o início, foi negociar com as companhias aéreas para que cumpram sua obrigação de prestar o serviço para a qual foram contratadas, qual seja o voo de retorno pago pelo brasileiro”, afirma.

“Em países em que o cumprimento dessa obrigação se viu impedido, em decorrência de medidas de fechamento total de espaço aéreo pelo governo local, estamos explorando outras possibilidades de repatriação”, acrescenta.

“Os brasileiros retidos no exterior que tiveram passagens canceladas sem que as companhias aéreas tenham cumprido suas obrigações contratuais de reembolso e compensação devem procurar, quando de seu retorno ao Brasil, a ANAC para avaliar suas opções de remédio legal a eventual descumprimento de obrigações dessas empresas privadas”, diz a nota sobre a questão dos voos cancelados.

Sobre a possibilidade de auxílio financeiro para os brasileiros presos na Itália , o Itamaraty informou: “Os brasileiros que se encontrarem em situação de desvalimento financeiro devem contatar o consulado ou embaixada em sua região para verificar as opções de auxílio disponíveis”.

IG

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