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O silêncio de Bolsonaro incomoda aliados e opositores

Jair Bolsonaro. - Imagem: Reprodução | O Globo
Jair Bolsonaro. - Imagem: Reprodução | O Globo
Reinaldo Polito

por Reinaldo Polito

Publicado em 27/11/2022, às 08h44


Depois do resultado das eleições no dia 30, a população espera um pronunciamento contundente de Bolsonaro. Os opositores estão ávidos, com a faca nos dentes, aguardando uma palavra para disparar sua artilharia pesada contra o presidente.

Não importa o que ele venha a dizer. Se disser que não concorda com o resultado das eleições, será chamado de golpista, de mau perdedor. Vão dizer com todas as letras que é antidemocrático, pois não soube reconhecer a vontade da maioria do povo. Se disser que aceita a vitória do adversário, ensejará a alegria dos petistas e poderá fechar as portas para as esperanças de seus aliados.

Se incentivar os brasileiros a continuarem se manifestando nas ruas, nas praças e, principalmente, nas portas dos quarteis, fará exatamente o que seus adversários desejam. Dará demonstração clara de que aspira permanecer à força no poder.

Portanto, ainda que esteja com coceira na língua, precisará tentar cumprir o que prometeu, permanecer dentro dos limites da lei. E só poderia partir para o tudo ou nada se tivesse apoio das Forças Armadas. Não que essa hipótese não lhe tenha um dia passado pela cabeça.

Em agosto de 2021, depois de dizer muitas vezes que jamais desobedeceria às regras constitucionais, revelou que seria obrigado a jogar fora das quatro linhas definidas pela Constituiçãocaso chegue a ele algo além das fronteiras definidas pela Carta magna. Só que falar é uma coisa, fazer, porém, é outra muito diferente.

A Caserna, entretanto, embora tolere a permanência dos manifestantes em frente aos seus portões em todos os cantos do país, disse mais de uma vez que não pretende se envolver nas questões político/ideológicas, já que é uma instituição de Estado, portanto, avessa a qualquer inciativa que a retire dessa posição.

Se, todavia, de um lado, o silêncio do presidente contraria os oposicionistas, porque não dá a eles a munição que desejam para colocar uma pá de cal definitiva nas pretensões bolsonaristas, de outro, frustra os próprios seguidores. Não são poucos os mais afoitos que exigem uma posição firme do ainda chefe do Executivo.

Com o passar das semanas, e lá se vão longos 25 dias, se, até para surpresa da maioria, aumenta o número de manifestantes, ao mesmo tempo, estes começam a perder a paciência. Já se ouve aqui e acolá insatisfeitos afoitos adjetivando essa postura impassível do seu líder, sendo “frouxo” o mais comum. Não faltando aqueles que o tomam como traidor de uma causa.

O presidente está vivendo verdadeiro dilema. Se falar, independentemente do que seja dito, será contestado, criticado e, no limite, penalizado com rigor. Se continuar calado, mesmo irritando seus oposicionistas, corre o risco de ver esvaziada a liderança que conquistou, com empenho e determinação, contra um sistema perverso que não lhe deu um segundo de trégua, ao longo dos últimos anos.

Dizem alguns estudiosos, ainda que não tenham lá muita certeza do que afirmam, que as manifestações dos brasileiros já se descolam da figura do presidente. Avaliam que o movimento adquiriu vida própria em busca de uma causa comum a todos. Por isso, com ou sem o apoio de Bolsonaro, continuarão insistindo em seus pleitos, nem sempre muito claros e objetivos.

Quando indagados sobre o que desejam, a resposta mais comum é que querem voltar a ter liberdade e viver dentro de um sistema democrático. Julgam que a interferência do Judiciárionos outros poderes foge de suas atribuições legais.

Bolsonaro é um político experiente. Demonstrou em várias situações que possui intuição estratégica. Provavelmente, essa iniciativa de permanecer em silêncio por tanto tempo não é por acaso. Deve haver nessa atitude um motivo que escapa à observação daqueles, oposicionistas ou não, que exigem sua manifestação.

A história nos dirá se o presidentepermaneceu quieto como espécie de carta na manga para atingir determinado objetivo. Nesse caso, sendo ele bem-sucedido, terá sido o silêncio mais eloquente de que se tem notícia. Se demonstrar que ficou quieto porque não tinha mesmo nada a dizer, provocará frustração naqueles que o admiram, e alegria e grande contentamento dos opositores.

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