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COLUNA

O maior orador da história do Direito no Brasil revela como aprendeu a falar bem em público

Valdir Troncoso Peres - Imagem: Reprodução | YouTube
Valdir Troncoso Peres - Imagem: Reprodução | YouTube
Reinaldo Polito

por Reinaldo Polito

Publicado em 07/04/2024, às 07h03


Valdir Troncoso Peres ficou conhecido como o “Príncipe dos advogados”. Sua oratória foi incomparável nos meios jurídicos. Era preparado, sagaz, eloquente, articulado, fluente. Um orador excepcional com quem era possível aprender a arte de falar em público apenas observando seu desempenho na tribuna.

Como Troncoso aprendeu a encantar as plateias com sua admirável comunicação? Será que já nasceu pronto, com a competência presenteada pela própria natureza? Em palestra ministrada em nosso curso de oratória, ele mesmo revela:

“Quando era jovem. Ainda estudante, às vezes, sentia um certo tolhimento do raciocínio por não conseguir encontrar facilmente a palavra que desejava. Só depois, com a prática de longos anos frequentando a Tribuna do Júri, pude desenvolver uma qualidade que chamo de automatismo da fala”.

Em seguida, o famoso criminalista explica o que significava para ele esse fenômeno da comunicação. Foi, sem dúvida, uma aula preciosa:

“Enquanto o orador estiver preocupado com a palavra que vai dizer, com o verbo que vai conjugar, com o adjetivo e o substantivo que irão compor a frase que deverá refletir o seu pensamento, estará preso à forma da comunicação e sofrerá, com isso, um rebate de produtividade.

Só depois que não tiver mais de pensar no que vai dizer e em como vai dizer é que terá incorporado a automatização da fala e poderá transmitir suas ideias sem o atrelamento à forma”.

Respaldo nos livros

Esse é um conceito que encontra respaldo em alguns estudiosos. Emile Amet, no livro “Arte de falar em público”, publicado em 1906, embora com muitas reservas, abordou esse tema. Ele apresenta uma relação de frases usadas de forma recorrente no dia a dia e recomenda que o leitor as repita tantas vezes até que participem do seu reflexo condicionado.

Segundo o autor, após esse intenso exercício, ao pronunciar a primeira palavra toda a frase seria naturalmente formulada, proporcionando fluência e correção à fala. Ou seja, a frase passaria a ser pronunciada como se fosse uma única palavra.

O autor se desculpou

Confesso que quando li esse capítulo achei o recurso estranho demais. Até Amet procurou se desculpar pela sugestão que deu: “Há na linguagem um fundo de expressões muito comuns, muito usuais que é preciso conhecer para revestir o pensamento. Sem dúvida, não abordamos neste momento um lado muito elevado da arte de falar”.

Para matar a curiosidade, vamos citar duas das frases sugeridas por ele: “Não quero reacender uma discussão que atingiu o seu termo”. “A tarefa que me é confiada é tão difícil...”. São, portanto, frases como essas que utilizamos nas reuniões corporativas e nos embates políticos. Se repetidas, participariam do automatismo da fala.

Os melhores oradores

Não confiei mesmo nessa técnica. Até que fui convencido na prática. Na conclusão dos nossos cursos de oratória, realizávamos uma solenidade de formatura. Convidávamos para paraninfar as turmas pessoas que possuíam excelente domínio da arte de falar em público. Os melhores. Alguns desses paraninfos se mostravam tão bons que depois de dez a quinze anos eram convidados novamente. Valia a pena rever esses verdadeiros monstros da tribuna.

Tomei o cuidado sempre de gravar essas solenidades. Assim, outros alunos do nosso curso poderiam assistir e também aprender com aqueles exemplos memoráveis.

Fiquei muito surpreso ao comparar o que disseram esses oradores em tempos diferentes. Ao se apresentarem em contextos distintos, quase todos, em diversos trechos, repetiram as mesmas frases com as mesmas palavras. Como explicar que esses grandes oradores pudessem se apresentar depois de tantos anos repetindo as mesmas partes dos discursos? E com propriedade.

O automatismo da fala

Com certeza, não foi devido à falta de criatividade ou por não saberem o que dizer. Eles discursaram tantas vezes sobre o mesmo assunto que as frases participaram normalmente do automatismo da fala.

As informações estavam de tal forma impregnadas no conteúdo de suas apresentações que ao dizerem as primeiras palavras não eram somente essas palavras que vinham à mente, mas sim a frase inteira, como se constituíssem uma única expressão.

Podemos assim concluir que para ser um grande orador um dos requisitos será o desenvolvimento do automatismo da fala. Não se preocupe em se valer do que disse em outras oportunidades, pois, como vimos, estará muito bem acompanhado.

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