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A ausência de Lula na posse de Milei deixou os holofotes para Bolsonaro

Javier Milei e Jair Bolsonaro. - Imagem: Reprodução | Redes Sociais
Javier Milei e Jair Bolsonaro. - Imagem: Reprodução | Redes Sociais
Reinaldo Polito

por Reinaldo Polito

Publicado em 10/12/2023, às 07h53


Javier Milei toma posse como presidente da Argentina neste domingo, 10. O início da cerimônia foi programado para as 11h no Congresso Nacional. Alberto Fernández entrega ao presidente eleito os símbolos do cargo: a faixa e o bastão presidencial.

Confirmaram presença na solenidade de posse os presidentes do Uruguai, Luis Lacalle Pou; do Chile, Gabriel Boric; do Paraguai, Santiago Peña; da Hungria, Viktor Orbán; e Felipe IV, rei da Espanha. Lula, presidente do Brasil não estará presente.

Diferenças ideológicas

As diferenças ideológicas entre Lula e Javier Milei são abismais. O chefe do Executivo brasileiro se coloca no lado mais extremo da esquerda, tendo revelado que sente orgulho de ser comunista. O presidente argentino, ao contrário, se situa à direita na fronteira mais longínqua.

Durante as eleições no país de los hermanos, enquanto Lula apoiou ostensivamente o candidato indicado por Alberto Fernández, Sergio Massa, Bolsonaro, também abertamente, se mostrou favorável ao opositor, Milei. O crítico do peronismo, para tristeza da esquerda, que também se sentiu derrotada, venceu as eleições.

Bolsonaro foi convidado

Já nos momentos de comemoração, o presidente eleito agradeceu publicamente a Bolsonaro e o convidou para participar da sua posse. O ex-presidente brasileiro aceitou prontamente o convite. Lula, como chefe de Estado do maior parceiro comercial dos argentinos, também foi convidado, mas não compareceu.

Bolsonaro, embora fora do poder e tornado inelegível, foi recebido e se comportou como se ainda estivesse no comando do país. Para dar ideia do peso da sua presença, estavam em sua comitiva, além do seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que atuou como intérprete nas entrevistas concedidas por seu pai; o presidente do PL, Valdemar Costa Neto; a deputada Bia Kicis (PL-DF); o ex-chefe da Secretaria de Comunicação Social do Governo Federal, Fabio Wajngarten; e o ex-ministro do Turismo, Gilson Machado.

Troca de elogios

O grupo só não foi maior porque muitos parlamentares decidiram permanecer no Brasil por causa da manifestação marcada para este domingo. A direita deitou e rolou nesse episódio. A comitiva participou de encontros com Milei e com várias lideranças conservadoras argentinas. O presidente eleito não poupou elogios a Bolsonaro:

“É um orgulho muito grande receber a visita de Bolsonaro, a quem admiro pela luta contra a esquerda internacional”.

Bolsonaro também se manifestou com palavras simpáticas. Falou como se ainda fosse o representante do Brasil:

“Nós conversamos sobre assuntos gerais e eu vim para cumprimentar o presidente Milei. Para nós, brasileiros, interessa ser bons vizinhos”.

O representante do Brasil

O Brasil foi representado pelo chanceler Mauro Vieira. Considerando a importância econômica das duas nações, Lula e Milei autorizaram o embaixador brasileiro em Buenos Aires, Julio Bitelli, e o embaixador da Argentina no nosso país, Daniel Scioli, a negociar a ida do chanceler à posse.

Por que Lula deveria ter comparecido? Analisando o antagonismo entre o chefe do Executivo brasileiro e o presidente argentino, dificilmente haveria clima para que o petista estivesse presente na solenidade de posse. Temos de considerar, entretanto, que seria a presença de um Chefe de Estado prestigiando protocolarmente a posse de outro Chefe de Estado. Ou seja, não seria Lula e Milei, mas sim Brasil e Argentina.

Perdeu a oportunidade

A aproximação institucional, pela demonstração de grandeza, poderia render prestígio a Lula. Seria visto como estadista, desprovido de vaidades e revanchismo. Por mais que Bolsonaro perambulasse pelo país com os políticos conservadores, sua passagem pela Argentina seria ofuscada com a presença do presidente brasileiro.

Sem contar que seria ainda mais tranquila a aproximação entre os dois países. Os negócios poderiam ser resolvidos de forma mais natural e as animosidades e diferenças afastadas com menos conflitos. Falou mais alto, todavia, a vaidade. Lula perdeu a oportunidade e deixou os holofotes para o seu opositor. Lembrando que o evento será noticiado em todo o mundo.

Combustível na fogueira

Vários expoentes da base governista, como, por exemplo, o ministro da Secretaria de Comunicação Social (SECOM), Paulo Pimenta, disse que o presidente eleito da Argentina ofendeu de forma gratuita o presidente Lula. Por isso, o presidente brasileiro só deveria ligar para cumprimentar pela vitória se houvesse pedido de desculpa:

“Eu não ligaria. Só depois que ele me [a Lula] pedir desculpas. Ofendeu de forma gratuita o presidente Lula. Cabe a ele o gesto, como presidente eleito, de ligar para se desculpar. Depois que acontecesse isso, eu pensaria na possibilidade de conversar”.

Amizade e interesse

Só para relembrar como foram os ataques de Milei a Lula, basta citar algumas de suas palavras mais agressivas. Ele se referiu ao presidente brasileiro como “ladrão”, “comunista furioso” e “ex-presidiário”. Realmente, não é fácil aguentar comentários tão agressivos. Entre países, porém, há que se ter em conta a frase atribuída a John Foster Dulles: “Não há países amigos, mas interesses comuns”.

Se fosse um marinheiro de primeira viagem, vá lá. Com essa experiência toda, porém, o orgulho já deveria ter sido deixado de lado. Ou não foi assim que agiu com muitos daqueles que fizeram críticas semelhantes às de Milei e estão ao seu lado como se nada tivesse acontecido?

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