Em lista interna de mensagens, procurador escreveu que não cumprimento do 'débito conjugal' pela esposa deve levar à 'dissolução da união' e à 'perda de todos os benefícios patrimoniais'
G1 Publicado em 20/07/2022, às 08h35
Duas representações enviadas à Corregedoria do Ministério Público Federal questionam mensagens enviadas por um procurador da República de São Paulo a uma lista interna do MPF associando feminismo a um transtorno mental e defendendo o que chamou de “débito conjugal”, pelo qual a mulher teria "obrigação sexual" a cumprir em relação ao parceiro.
As mensagens provocaram reação entre procuradoras, que defendem apuração do caso pela corregedoria do órgão. Para alguns integrantes do MPF, a tese defendida pelo procurador Anderson Santos legitimaria o "estupro matrimonial".
Ao analisar as representações, a corregedoria avaliará se há elementos para apurar a conduta do procurador, que ficaria sujeito a advertência, censura, suspensão ou demissão.
Procurado pela reportagem, Santos negou que tenha defendido o estupro. Ele disse que fez o comentário dentro da rede interna do MPF para levantar o debate entre os colegas sobre a monogamia e se deveria existir a criminalização do adultério.
O procurador afirmou ainda que essa discussão surge diante de decisões na Justiça que ainda levam em conta a falta de sexo para anular casamentos.
"Não é o caso de cobrar e exigir que a mulher faça sexo. É dá ensejo a se for reiterado [a falta de sexo] ao pedido de divórcio. Eles querem, na verdade, dizer que estou defendendo estupro de mulheres. Claro, se defendesse, seria uma incitação ao crime, mais do que quebra de decoro, seria caso de ação penal pública", disse.
Santos atribuiu as representações ao clima polarizado na PGR. "A conversa foi muito mais longa e eu apontei que os progressistas em verdade não querem casar, porque não querem assumir as responsabilidades de um casamento, tais quais a monogamia e o débito conjugal. Então eles começaram a descaracterizar o casamento para poderem ter o status de casado sem o ônus devido. Isso causou muita revolta", disse o procurador.
Mensagens
No primeiro texto, enviado no início da noite desta segunda-feira (18), o procurador Anderson Santos classifica o feminismo como "transtorno mental" e diz acreditar que, para isso, será criada no futuro uma CID [Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde].
Na mensagem, ele associa o feminismo a problemas familiares. “A feminista normalmente é uma menina que teve problemas com os pais no processo de criação e carrega muita mágoa no coração. Normalmente, é uma adolescente no corpo de uma mulher. Desconhece uma literatura de qualidade e absorveu seus conhecimentos pela televisão e mais recentemente pela internet”, afirmou.
Em seguida, diz que as mulheres que buscam empoderamento procuram preencher alguma espécie de "rejeição".
“Na maioria das vezes, a sua busca por empoderamento é na verdade uma tentativa de suprir profundos recalques e dissabores com o sexo masculino gerado pelas suas próprias escolhas de parceiros conjugais”.
Em uma segunda mensagem, Santos apresentou aos colegas uma análise sobre “casamento e débito conjugal.”
Ele defendeu que é “de fundamental importância recuperar a ideia do débito conjugal no casamento” e fez uma citação bíblica.
“O marido pague a sua mulher o que lhe deve, e da mesma maneira a mulher ao marido”, escreveu citando o livro de Coríntios.
“O progressismo nos convenceu que o cônjuge não tem qualquer obrigação sexual para com o seu parceiro, levando muitos à traição desnecessária, consumo de pornografia e ao divórcio”, escreveu.
Segundo o procurador, “esse é um drama vivido muito mais pelos homens diante das feministas ou falsas conservadoras. A esposa que não cumpre o débito conjugal deve ter uma boa explicação sob pena de dissolução da união e perda de todos os benefícios patrimoniais”.
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