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Um país abandonado

Um país abandonado. - Imagem: Freepik
Um país abandonado. - Imagem: Freepik
Marcus Vinícius De Freitas

por Marcus Vinícius De Freitas

Publicado em 28/12/2022, às 09h08


Uma das decepções que o Brasil causa ao estrangeiro (e ao próprio brasileiro), ao chegar, é o estado de abandono em que o País se encontra. De um aeroporto, muito aquém quando comparado aos mais avançados no mundo, ao controle aduaneiro impositivo até à entrada, no caso de São Paulo, numa avenida marginal com um rio fétido, numa cidade praticamente abandonada aos pichadores, com favelas que se alternam, ruas esburacadas e de uma manutenção sofrível, além do enorme medo pela insegurança existente, fica muito difícil acreditar que se está numa das cidades mais ricas do mundo. A impressão que se tem é de ter chegado numa Gotham City, uma cidade abandonada, onde o crime prevalece e o poder público se rendeu ao crime organizado. O comércio, que é a mola propulsora de uma economia, encontra-se enfraquecido por uma carga tributária e burocrática enorme, que desincentiva o aumento das atividades econômicas e o próprio emprego. O País logrou, diante do enorme potencial que tem, apequenar-se e viver abaixo de suas enormes possibilidades.

E no fim-do-ano, que deveria ser uma época mais tranquila da vida da população, o cidadão é obrigado a ficar preocupado com a liberação de milhares de presos, na famosa saidinha de fim-de-ano, em que se colocam criminosos nas ruas, num país em que o crime compensa. Estelionato, corrupção e até mesmo o homicídio contam com uma justiça leniente, penas leves e uma infinidade de recursos judiciais que levam à prescrição rápida dos crimes, criando um sistema de impunibilidade que condena o País a um clima constante de abuso de poder por parte daqueles que têm mais recursos econômicos. O Brasil se transformou num país em que crimes contra a vida prescrevem e dívidas com bancos jamais. Valores invertidos deterioram a sociedade e sacrificam o futuro das novas gerações. Criminosos condenados a décadas na cadeia circulam livres, vivem tranquilos e riem da sociedade copiosamente. Políticos irresponsáveis e conspurcados têm a audácia de se candidatarem.

O grande desafio do relógio democrático é que, a cada quatro anos, o País é colocado num labirinto administrativo sem saber o que advirá das novas administrações. O funcionalismo público, que deveria atuar como guardião do Estado e protetor das instituições, está mais preocupado com a própria remuneração do que com o bem coletivo. E o topo do funcionalismo público distancia-se cada vez mais na remuneração com o restante da sociedade, criando uma casta social, que, além de dominar a atuação do Estado, locupleta-se com ele, além de amarrar as mãos dos eleitos para realizar mudanças fundamentais que o País tanto anseia.

Como resolver esta situação é difícil, afinal é preciso que os partidos políticos recrutem quadros melhores para apresentarem à população. O grande desafio da democraciaé que carisma prepondera sobre mérito e capacitação. E num momento em que se acredita que todos os setores da sociedade devem estar representados nos governos, impera a forma sobre o conteúdo, a aparência sobre a essência, a simpatia sobre a capacidade.

A sociedade acreditou, no penúltimo ciclo eleitoral, em 2018, que havia realizado uma eleição disruptiva, com a quebra de alguns precedentes históricos. Foi frustrada por observar a rápida assimilação pelos novos eleitos das velhas práticas. O mesmo destino ocorrerá com os eleitos neste ano de 2022. Ideologias e princípios não passam da página dois do ideário político dos eleitos e não resistem ao vil metal ou à promessa de maior poder.

É por esse motivo que, enquanto não surgir uma agremiação política que defenda o voto distrital puro, limites no número de mandatos por vereadores, deputados e senadores, fim das assembleias legislativas e da figura nefasta dos suplentes, o fim do ativismo judicial e do protagonismo de juízes na mídia, a responsabilidade econômica dos agentes públicos pelas decisões tomadas, a substancial redução da carga tributária, o aumento das penas por crimes praticados, inclusive transformando a corrupção em crime hediondo, a situação dificilmente mudará. O Brasil demanda por estas mudanças. Infelizmente, dificilmente surgirá uma agremiação que tenha claro o seu objetivo para o País, que tenha o propósito claro de elevar a renda per capita brasileira a, pelo menos, US$ 20 mil, que tenha o objetivo de ver uma ou duas universidades brasileiras entre as 20 melhores do mundo ou, ainda, que o Brasil lidere alguma tecnologia disruptiva globalmente.  

O fato é que a saída do Brasil não é Cumbicaou o Galeão. Glamourizamos muito a vida no Exterior, acreditando que a vida lá é sempre melhor do que é aqui. Não é verdade. Aliás, é um erro crasso. O Brasil é um dos melhores lugares do mundo para viver. O problema do Brasil é administrativo, de governança, e da retenção da riqueza por um grupo pequeno de pessoas, que apresenta mais características de uma classe dominante do que uma elite efetivamente. Países que atualmente glamourizamos enfrentaram enormes problemas no passado, que levou milhares de seus cidadãos a partirem para outras partes do mundo, inclusive o Brasil. Coube àqueles que permanecerem construir uma nacionalidade e dar decência ao país em que viviam. E conseguiram em muitos casos.

Como alguém que teve a oportunidade de viver prolongadamente em alguns países e viajar por uma grande parte deste globo terrestre, posso afirmar que o Brasilé um lugar sensacional para viver, mas condenado a viver abaixo de suas expectativas porque sua população ainda não tomou a resolução de querer viver num país decente.

O ano novo sempre é precedido por aquelas famosas resoluções de fim-de-ano. Nelas traçamos novos objetivos que pretendemos alcançar: de perda de peso à compra de um imóvel ou a um casamento, muitos são os objetivos que traçamos para a virada mágica do dia 31 de dezembro para 1º de janeiro. Infelizmente, muitas destas resoluções são abandonadas muito rapidamente, não resistindo às primeiras semanas do novo ano. Mas muitas são alcançadas.

Que neste 31 de dezembro, como brasileiros, tenhamos um objetivo comum em mente: transformar o Brasil num país decente para morar. Para tanto, precisamos tornar-nos donos efetivos do País e do nosso destino. É preciso cuidar do Brasil: não é possível mais viver num lugar abandonado, numa terra de ninguém, num país rico em que a pobreza abunda. Que 2023 seja o início de uma grande transformação nacional. Feliz 2023!

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