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4 Anos Passam Rápido

Marcus Vinícius De Freitas - Imagem: Reprodução | Redes Sociais
Marcus Vinícius De Freitas - Imagem: Reprodução | Redes Sociais
Marcus Vinícius De Freitas

por Marcus Vinícius De Freitas

Publicado em 05/06/2024, às 08h46


Há quatro anos, iniciei minhas contribuições nesta coluna do Diário de São Paulo. O primeiro tema abordado na ocasião era “Política Externa é um assunto sério”, retratando o descaso com que um assunto tão importante para o Brasil é tratado politicamente. O País, que tem um peso global importante, comporta-se, invariavelmente, como um anão diplomático, pela falta de objetivos claros, identificação dos seus interesses e ausência de perspectivas daquilo que pretende alcançar globalmente. Para um país que é uma das maiores economias globais, é lastimável a falta de interesse que um assunto de tamanha relevância deveria ter, inclusive para consolidar sua imagem externa e fomentar uma agenda que atenda às suas necessidades.

Inúmeros assuntos foram tratados em mais de duzentos artigos publicados, com ênfase em assuntos como a Guerra na Ucrânia, a Guerra em Gaza, a ascensão da China, os desafios europeus, o terrorismo global, e as inúmeras transformações políticas ocorridas no mundo nos últimos anos. Testemunhar estes assuntos e poder escrever a respeito, expressando uma opinião a respeito, é sempre algo difícil. Por certo, muitos – com enorme razão – terão discordado das perspectivas, das opiniões e dos pontos de vista. Mas, como digo sempre, não sou detentor da Palavra Revelada, nem pretendo ser. Há vozes muito mais qualificadas e inteligentes que a minha, que, com certeza, são capazes de contribuir significativamente para o debate. Mas cabe a mim, como colunista, expressar um pouco de minha perspectiva.

Por certo um dos assuntos que prevaleceu nesta coluna foi sobre a ascensão da China. Pelo fato de residir na China e ter uma perspectiva primária daquilo que acontece no gigante asiático, consigo passar ileso da análise superficial, tendenciosa e – muitas vezes – maledicente sobre o país, que impressiona por aquilo que construiu nas últimas cinco décadas sem recorrer, uma só vez, às armas ou à guerra para assegurar seu crescimento econômico. A China, em pouco mais de quatro décadas, logrou transformar-se num país totalmente industrializado e a força motriz da economia global. Se a China cresce, o mundo inteiro cresce.

Se há uma lição que o capitalismo chinês ensina ao mundo – ou como os chineses chamam, socialismo com características chinesas – é que o segredo do desenvolvimento econômico global é baseado num trinômio: margens reduzidas de lucro, larga escala e longo prazo. O segredo do capitalismo chinês não é amealhar o máximo de capital em poucas transações, mas a perenidade dos negócios. Com isto, preço e qualidade precisam caminhar juntos para que haja, efetivamente, uma relação ganha-ganha entre vendedor e comprador. E quanto maior a base de consumidores, melhor é para a sociedade como um todo.

Outra lição importante está relacionada à importância do desenvolvimento de indústrias disruptivas. A razão fundamental por trás desta perspectiva é que indústrias disruptivas permitem aos países modificarem o seu patamar de desenvolvimento e crescimento econômico. Países que não inovam, invariavelmente chegam a um teto de crescimento e tendem a estabilizar-se nessa situação. Os economistas chamam isto de “armadilha da renda média”, identificando a dificuldade de um país elevar-se no patamar econômico. A única forma de sair desta “armadilha” é desenvolver novas indústrias, conceitos e ideias para que a sociedade encontre maneiras de criar disrupções tecnológicas que sejam, efetivamente, benéficas ao crescimento econômico de uma nação. O último grande anúncio e impulsionamento dado pela China neste sentido é a questão dos veículos inteligentes (“smart cars”) com o objetivo de tornar o país no maior mercado global de carros autônomos. Logo os carros chineses deverão ter seus próprios números de telefone facilitando a comunicação entre os próprios veículos nas ruas e estradas.

No entanto, a lição fundamental ensinada pela China é que o arcabouço para que tudo aconteça é o da infraestrutura. De nada serve a um país desenvolver indústrias altamente disruptivas se rodovias, ferrovias, ruas, avenidas, saneamento, portos, aeroportos, logística, energia nuclear, não sejam da melhor qualidade possível para facilitar o escoamento da produção de todo e qualquer produto, no mercado doméstico e internacional. A infraestrutura – reconhecem os chineses há séculos – é o principal capacitador do enriquecimento de uma nação. Sem uma infraestrutura eficiente, todos os outros esforços – que são louváveis – serão perdidos.

Inúmeras outras são as lições que a China tem a compartilhar com o mundo. Sem dúvida, a mensagem principal do país asiático é que não importam as dificuldades de uma sociedade, quando existe um plano ajustável ao longo do tempo, elites comprometidas com o futuro do país e um sentimento forte de nacionalismo e patriotismo, lideranças políticas podem realizar verdadeiros milagres para darem saltos sociais, políticos e econômicos. É preciso reduzir as incongruências e inconsistências.

O Brasil, por exemplo, precisa resolver várias incongruências. Sem dúvida, uma que sempre causa estranheza é que a “direita brasileira”, subserviente aos Estados Unidos, tenha enorme ojeriza à China. Esta mesma “direita brasileira” é apoiada, em grande parte pelo setor agrícola, que é, de fato, o que mais se beneficia da relação comercial entre Brasil e China.

Por fim, nestes quatro anos como colunista, sempre tenho tentado expressar minhas preocupações com relação ao papel que o Brasil pretende desempenhar nesta nova ordem internacional que se desenha e avança rapidamente. Esta nova ordem global não terá muitos dos atores atuais à sua frente, que serão deslocados ou substituídos por novos. É importante o Brasil não perder o trem da história e saber colocar-se, de maneira inteligente, neste novo cenário.

Enfim, meu primeiro artigo neste jornal foi sobre a seriedade da Política Externa para o futuro do País. A preocupação era importante na época e tem assumido uma proporcionalidade cada vez maior. As oportunidades estão aí. Que não as desperdicemos!

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