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Estou envelhecendo. E agora?

Estou envelhecendo. E agora? - Imagem: Reprodução | Tom Hussey
Estou envelhecendo. E agora? - Imagem: Reprodução | Tom Hussey

Fernando Maskobi Publicado em 28/03/2023, às 07h34


Atualmente o envelhecimento é compreendido como uma punição. Na nossa sociedade, o envelhecer é como perder o jogo e, para evitar a tragédia, fazemos de tudo para esconder os efeitos do tempo em nosso corpo físico.

Sobe a testa. Esconde o sorriso. Preenchea face. Puxa o bumbum, suga a barriga. Uma, duas, cem vezes no cartão. Se falsifica. Se espeta daqui, anestesia dali. Quanta dor buscando a inalcançável sensação de pertencimento dentro do moderno conceito de beleza amplificando, por tabela, o etarismo.

Enquanto isso, o Brasil brilha cada vez mais na liderança da escravidão da beleza distorcida e dos procedimentos estéticos. Com sorrisos forçados e testas mortas, fazemos parte de uma geração onde estamos inflados e iguais. Instalamos os mesmos narizes, lábios e cortes faciais.

Quem sou eu? Cadê você? 

Ao reduzirmos a beleza à juventude, fica bastante claro quais valores nos orientam. Entretanto, esquecemos que as nossas linhas contam as nossas histórias. Os nossos cabelos e a pele nos contam o que e como vivemos e, provavelmente, os nossos corpos nos contam o que estamos precisando viver.

Autocuidado é uma coisa. Compulsão por esconder a idade é outra. Cuidados com a pele, mobilidade física, dentre outras medidas saudáveis, sempre foram necessárias. Porém, me parece que a linha que divide o autocuidado e a escravidão em busca da "beleza" foi cruzada por quilômetros. 

Existem sociedades e comunidades onde o envelheceré lindo, natural, permissivo e, acima de tudo, respeitado e honrado. Nesses lugares, o envelhecer é compreendido como um presente divino.

Outro dia escutei da Liana Ferraz, escritora e autora do livro "Sede de me beber inteira", a seguinte passagem de seu inspirador poema: 

"Procuro um lugar para ficar velha (...) Onde nós velhas, não queremos ser como elas; onde elas queiram ser como nós, desatadas, livres. Lá, onde a gente pode ser velha, a gente não quer ter nenhum minuto a menos (...)."

Autoaceitação, resignificação da morte, capacidade de nos expressar. Viver. O envelhecimento, sem pedir permissão, nos cerca e nos faz entrar em contato muitas vezes com aquilo que não queremos lidar. Entretanto, qual será o real fantasma que se esconde na plasticidade humana?

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