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Votar por convicções e não por interesses

Eleições 2024. - Imagem: Divulgação / TSE
Eleições 2024. - Imagem: Divulgação / TSE
Antoni Gutiérrez-Rubí

por Antoni Gutiérrez-Rubí

Publicado em 29/06/2024, às 06h00 - Atualizado em 30/06/2024, às 06h00


No Brasil, a economia está crescendo, mas também a desaprovação do governo Lula. Qual é a causa deste paradoxo? É uma contradição ou um novo modelo de relação dos eleitores com as suas expectativas? A mítica frase “é a economia, estúpido” que James Carville popularizou na primeira campanha de Bill Clinton parece ter perdido a sua validade. Antes, a percepção que tínhamos da economia influenciava ou mesmo definia as opiniões políticas e o comportamento eleitoral. O conhecido votar com o bolso”. No entanto, parece que agora são as próprias inclinações políticas que determinam a percepção da economia e a direção do país. Você pensa o que sente.

O mesmo acontece nos Estados Unidos, onde o desemprego é de apenas 4%, abaixo dos 6,4% de quando Joe Biden se tornou presidente. Apesar da crise de abastecimento e das guerras na Ucrânia e na Faixa de Gaza, a economia não parou de crescer e a inflação manteve-se estável durante mais de um ano. Se julgarmos estritamente por estes resultados macroeconômicos, a reeleição do Democrata estaria mais ou menos garantida. Mas nada está mais longe da verdade. De acordo com a média das sondagens da Real Clear Politics, 57,8% do eleitorado desaprova a gestão econômica e a maioria acredita que Donald Trump poderia fazer melhor.

Em sociedades altamente polarizadas, como a nossa, os eleitores tendem a cair no “viés de confirmação”, que é a tendência de procurar, interpretar e lembrar seletivamente informações para confirmar as suas próprias crenças e posições. Esta dissonância entre o que os dados dizem e o que acreditamos é a base deste fenômeno de crescente subjetividade política. A avaliação não é objetiva nem justa. É parcial e arbitrária. Opinamos com base naquilo que acreditamos. 

Enquanto o atual nível de polarização for mantido no Brasil, a confiança na mídia vai continuar diminuindo e a exposição a notícias falsas vai aumentar, o que por sinal, estima-se que sejam 70% mais compartilhadas do que as notícias verdadeiras, parece difícil que a lacuna entre o julgamento racional e o preconceito seja reduzida. É um desafio que os governos - e todos os envolvidos no processo político, têm pela frente e terão de abordar desde já, até as eleições de outubro, e também nas próximas eleições presidenciais.

Os governos, preocupados com a crescente desaprovação e o crescente pessimismo, que é altamente contagioso, implementam estratégias para divulgar as suas realizações macroeconômicas. Eles sabem que, na política, e ainda mais em tempos eleitorais, a percepção é a única nova realidade. Por isso, inundam as suas plataformas com dados, gráficos e outros conteúdos mais ou menos pedagógicos, que no caso norte-americano aparecem sob a égide da "bidenômica", uma homenagem ao programa econômico de Ronald Reagan: a reaganômica. Estas estratégias, embora necessárias e convenientes, acabam por desenhar dois mundos paralelos e completamente opostos. Os eleitores devem escolher em que acreditar, ou melhor ainda, em quem acreditar. Assim, a comunicação política tornou-se terreno de disputa pela verdade e de campanhas competindo para quem melhor a representa e defende. De eleitores a crentes.

É fundamental acompanhar estas estratégias mais racionais com outras que tenham em conta a dimensão emocional, que, afinal, é onde se define a percepção da realidade. Talvez não se trate tanto de convencer os cidadãos do aumento do PIB, mas sim de explicar a cada comunidade de eleitores, a cada segmento, como uma determinada política pública os ajudará a sobreviver: a microeconomia e a micropolítica. Os nossos países são enormes, mas o país das nossas famílias começa – e quase termina – no seu metro quadrado cotidiano e no seu mundo de valores e convicções. 

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