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Por que ler (ou reler) Maquiavel?

Talvez você já tenha entrado em contato com alguma referência a Nicolau Maquiavel. E, se tem algum interesse por política, deve ter lido o famoso O Príncipe,

MAQUIAVEL
MAQUIAVEL

Redação Publicado em 11/06/2022, às 00h00 - Atualizado às 08h56


Talvez você já tenha entrado em contato com alguma referência a Nicolau Maquiavel. E, se tem algum interesse por política, deve ter lido o famoso O Príncipe, sua principal obra. Se não leu, precisa ler urgentemente.
Mas por que um livro escrito há mais de 500 anos precisa ser lido (ou relido)? Porque, embora as ferramentas, as tecnologias e as instituições tenham mudado, fazer política continua sendo a mesma coisa: pessoas organizadas em grupos tentando conquistar e manter o poder.
O Príncipe é um livro simples: trata-se de um manual que Maquiavel, na época sem emprego, deixado de lado pelos poderosos de plantão, enviou para um dos que poderiam arranjar um cargo para ele. De maneira simples, ele dá de presente ao futuro chefe aquilo que tinha de maior valor: o conhecimento sobre política e história. E, em 26 capítulos, fala sobre o poder em diversos momentos, desde a Antiguidade até aquele ambiente em que vivia, de grandes mudanças na Península Itálica.
O famoso bordão “os fins justificam os meios” não está exatamente no livro, mas estão coisas muito mais importantes. Por exemplo, ele fala daquilo que apenas séculos mais tarde Max Weber chamou de ética da responsabilidade. Ou seja, o líder político não deve ser julgado pela ética do homem comum. A ele, é permitido ultrapassar aspectos morais em nome da coesão do Estado, da defesa das instituições. Uma discussão que até hoje coloca teóricos e políticos em brigas infindáveis.
Vale a pena lê-lo (ou relê-lo) também para pensar nos motivos pelos quais as pessoas aceitam o poder do líder. Embora mais tarde Thomas Hobbes tenha falado muito mais sobre o papel do medo na aceitação do poder do Estado por parte dos indivíduos, Maquiavel já mostrou em O Príncipe grandes exemplos de que as pessoas agem muito mais pelo medo do que pela esperança ou pelo amor.
E isso nos faz pensar no Brasil de hoje, em que as esperanças parecem ter sido deixadas de lado. O medo tem feito com que o ambiente político se movimente, nas interações pessoais, nas identificações políticas e também na mobilização das redes sociais.
Nas eleições deste ano, mais do que projetos para desenvolver o país, as referências ao passado, os gatilhos do medo, de problemas graves que podem ser resolvidos por salvadores, continuam sendo os motivos pelos quais os principais líderes têm se apresentado.
Na economia e na segurança pública, que são os temas mais urgentes pelos quais as pessoas tendem a escolher os seus líderes, a insistência nas ameaças é o que faz com que soluções velhas sejam “vendidas” para os eleitores: “Se não votar em mim, vai passar fome”, “Se não votar em mim, vai ser morto por bandidos armados nas ruas”.
E, embora pensássemos há algum tempo que no século XXI não haveria mais o medo da ameaça física direta, tão presente na obra de Maquiavel, ele também continua aí, no dia a dia, na vida real, nas redes sociais e no programa do Datena. E o espírito dos líderes continua o mesmo: “eu sou o único que pode garantir que você continue vivendo”.
Então, se tudo continua mais ou menos igual, para entender o que vivemos, temos que reencontrar Maquiavel!

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