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O plano diretor de São Paulo e a falácia das construtoras

Por Mariana Lacerda*

O plano diretor de São Paulo e a falácia das construtoras
O plano diretor de São Paulo e a falácia das construtoras

Redação Publicado em 24/02/2022, às 00h00 - Atualizado às 12h54


Por Mariana Lacerda*

O plano diretor de São Paulo e a falácia das construtoras

Imaginar um plano diretor para uma cidade gigante, caótica e socialmente desigual como São Paulo requer uma visão integrada e um desenho que promova, acima de tudo, a capilaridade, levando ‘vida econômica’ para a periferia, de forma a absorver a população dessa área e reduzir a necessidade de mobilidade.

Este, de forma alguma, é o desenho que se configura no Plano Diretor de 2014. Ao contrário de promover o adensamento mais capilar da cidade, o plano que está aí incentiva a construção de moradias perto de grandes corredores comerciais e de metrô, especialmente nas Zonas Sul e Oeste, as mais saturadas da cidade e que, com esta proposta, continuarão a ser as mais cobiçadas pelo setor imobiliário.

A saturação das regiões já mais densamente povoadas, obviamente, não serve à cidade em termos de planejamento de tráfego. E tampouco será solução para a população de baixa renda. Isso simplesmente porque não é real a promessa, que consta do Plano Diretor, de construção de moradias sociais nas zonas mais centrais. A realidade do mercado imobiliário mostra que tais moradias não seriam erguidas nos corredores de transporte público e, longe de servir aos interesses das famílias menos favorecidas, servirão de investimento para uma classe média abastada.

Vemos, hoje, que as construtoras, num verdadeiro social washing, estão criando um antagonismo desnecessário e agressivo com as associações de bairro dessas regiões. Isso vem acontecendo, principalmente, em Pinheiros, onde a construção civil vem nomeando os movimentos de bairro como NIMBYs – que significa Not in My Backyard  (não na minha vizinhança, em tradução livre)- como se esses moradores fossem insensíveis a um déficit de moradia social.

Esse movimento não poderia ser mais falacioso. Em primeiro lugar, moradias sociais implicam moradia para famílias, manutenção de comércio local que abarque a demanda social e multiplicação e descentralização de equipamentos públicos; uma política tributária que fomente moradia onde há trabalho e comércio e leve trabalho e equipamentos onde há residências.

A criação de oferta não gera moradia social e é desta forma que as construtoras vêm operando: destruindo comércio local, forçando a oferta de imóveis de moradores únicos para residência e investimento e precarizando ainda mais a questão imobiliária para as famílias de baixa renda. A população menos favorecida, vale ressaltar, não  morará em Pinheiros com o comércio dirigido para a classe média alta.

Uma cidade inteligente e que respeite a questão social, ambiental e melhore a vida da população cuida de estreitar os laços comunitários, trazendo as pessoas para uma convivência mais próxima. Acolhedora e inclusiva, é assim que uma cidade deve ser. Afinal, elas são construídas por pessoas para as pessoas.

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*Mariana Lacerda, advogada e gestora pública, é porta-voz (presidente) da Rede Sustentabilidade no Estado de São Paulo

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