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COLUNA

A Diversidade e a Voz do Papa

Imagem criada com inteligência artificial. - Imagem: Reprodução | Photoshop
Imagem criada com inteligência artificial. - Imagem: Reprodução | Photoshop
Adriana Galvão

por Adriana Galvão

Publicado em 03/01/2024, às 07h30


Nada mais moderno que o respeito à diversidade – moderno, aqui, no sentido de afeito à realidade social e ao comportamento humano, não a modismos efêmeros. O Papa Francisco já demonstrou muitas vezes compreender a contemporaneidade, deixando claro que doutrinas e dogmas são apenas isto: doutrinas e dogmas. Se não há poder que os derrube, a coragem e a inteligência podem contorná-los.
A recente medida do Vaticano, ao autorizar que sacerdotes católicos abençoem a união de casais homoafetivos, não põe fim à negativa da Igreja Católica de conceder o sacramento do matrimônio a pessoas do mesmo gênero, mas confirma uma tendência de inflexão religiosa na direção do respeito ao livre-arbítrio, sem prejuízo da fé ou da proteção divina.
Não têm sido poucas as vozes críticas à ousadia de Francisco, vindas especialmente de hostes conservadores intestinas ao Vaticano – nenhuma surpresa. De outra parte, surgem reprovações provenientes de fileiras católicas progressistas, pelo fato de a benção autorizada não constituir reconhecimento formal pela Igreja da união homoafetiva. Trata-se, o segundo caso, de um erro interpretativo. 
A despeito de uma doutrina medieval preservada, o efeito da recente decisão  será um olhar mais generoso de boa parte do mundo não apenas sobre os casais homoafetivos, mas sobre as pessoas LGBTQIA+ em geral, afinal, a autorização para benção católica é fruto das convicções do Papa, líder de 1 bilhão fiéis no mundo, talvez o maior influencer do planeta. 
O carisma, a preocupação social e a visão progressista do mundo de Jorge Bergoglio incomodam aqueles que entendem a religião como um arcabouço para defesa de valores conservadores, valores aferrados a uma moral que abomina as diferenças e impõe-se para preservar uma brutal desigualdade. Sua palavra engajada tem o condão de mudar comportamentos e é mais que oportuna: só no Brasil, 273 pessoas LGBTQIA+ foram mortas violentamente em 2022 em razão de sua orientação sexual.
O preconceito que move a violência não é exclusividade brasileira. A Rússia, por exemplo, por seus Poderes Executivo e Judiciário, promove uma monstruosa perseguição à população não-heterossexual, cujo ápice foi a classificação pela Suprema Corte de qualquer manifestação LGBTQIA+ como “extremismo”. O ato do Vaticano mina o falso apelo moral de iniciativas como essa.
Não, a autorização do Vaticano para que sacerdotes abençoem a união homoafetiva não leva casais do mesmo sexo ao sacramento católico do matrimônio, mas é um avanço histórico para que, no futuro, a religião deixe de se identificar com o preconceito e passe a respeitar as diversidades. 
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