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Uma Nova Política Externa

Por Marcus Vinicius De Freitas*

Uma Nova Política Externa
Uma Nova Política Externa

Redação Publicado em 24/11/2021, às 00h00 - Atualizado às 07h05


Por Marcus Vinicius De Freitas*

Uma Nova Política Externa

Muito se fala que política externa não rende votos. Por esta razão, o assunto é sempre relegado a um segundo ou terceiro plano. De fato, até mesmo o prestígio do Itamaraty, nosso Ministério de Relações Exteriores, não tem a mesma correspondência em termos financeiros na Esplanada dos Ministérios. O debate político gira em termos domésticos e jamais se consegue evoluir para a compreensão da questão global do País e como ele pode beneficiar-se, efetivamente, de uma política externa ativa.

Quando se fala em efetiva atuação, não se trata da pirotecnia do período Lula à frente da presidência do Brasil. O País, equivocadamente, ampliou, sem uma estratégia substâncial, o número de representações diplomáticas do Brasil pelo mundo, sem a correspondente análise quanto ao fomento das relações bilaterais e ganhos efetivos. Além disso, caiu-se na repetitiva questão do assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas para um país que é líder regional, porém sem seguidores, além de menor relevância militar.

No entanto, o fatídico momento em que  Barack Obama afirmou que Lula era o “o cara” e “o político mais popular do mundo”, muitos acreditaram que aquilo seria um reconhecimento deste voo de galinha da política externa brasileira. Obama desconsiderou – intencionalmente ou não – o embaraço internacional causado por um presidente que liderava o enorme câncer da corrupção que ocorria no Brasil e que beneficiara a alguns como “nunca antes na história do País”.

O período Dilma foi o de retorno à irrelevância global. Com uma presidente que pretendia estocar vento e sem sofisticação intelectual, a política externa nunca lhe foi prioridade. O período Temer foi de calmaria, porém enfrentou – e perdeu – a campanha internacional empreendida por petistas de alta plumagem quanto à legitimidade da sua presidência. Aloysio Nunes foi um político que, de fato, e contrariamente ao seu antecessor, José Serra, foi atuante, com resultados positivos.

O governo atual equivocou-se, de início até agora, em sua política externa. De um alinhamento automático aos Estados Unidos, conflitos inúteis com a China, e uma série de brigas equivocadas com parceiros históricos do País, além de uma atuação desastrada na questão ambiental, o Brasil diminuiu um pouco mais a sua estatura global. Ressalto, no entanto, que isto não é exclusividade deste governo. O Brasil, já há muito tempo, tem uma imagem deteriorada. O país do futebol e bossa nova, nas últimas décadas já teve um presidente chamado de Indiana Jones, crises financeiras constantes, corrupção rampante e negacionismo. É um legado difícil a ser vencido pelo próximo presidente.

Para o novo período presidencial, algumas deveriam ser as prioridades da administração. Em primeiro lugar, não há dúvidas de que a solidificação do relacionamento Brasil-China é importante para ambos. Como maior parceiro global do País, a China oferece oportunidades múltiplas de atuação conjunta e maior interação comercial. Neste sentido, um acordo de livre comércio entre os dois países consolidaria o relacionamento, além de abrir novas oportunidades de investimento cruzado, estímulo à inovação e maior desenvolvimento econômico, ajudando na melhoria da renda per capita do País. O tamanho da missão brasileira na China deveria ser ampliada e deveria haver um incremento substancial no número de diplomatas fluentes em mandarim e outras línguas asiáticas. Um acordo de livre comércio ampliaria as oportunidades de abertura de mercados, além do aumento em investimentos em infraestrutura que o Brasil tanto necessita. Esta abertura de diálogo mais intenso deveria fazer parte da agenda inicial de visitas do presidente eleito, que deveria começar por Beijing, seguida por Washington, e Bruxelas.

Em segundo lugar, a comunicação global do governo brasileiro precisa ser melhorada intensamente. Desde o primeiro dia, aquele que assumir a Presidência da República deveria manter contato direto com os canais de mídia internacional, como CGTN, Al Jazeera, BBC e CNN para transmitir globalmente a imagem de um País rejuvenescido. Ademais, será preciso também ampliar a presença de mídia internacional do Brasil. O País carece de uma estratégia de construção positiva de imagem, que é importante para atração de turistas e maiores investimentos. Vários países fazem isso internacionalmente. Nesta estratégia de comunicação global, o Brasil deveria apresentar sua proposta de agenda global, uma mensagem aberta ao mundo, em áreas como meio ambiente, preservação de florestas, nova ordem global, erradicação de pobreza, e a busca de uma retomada global de desenvolvimento, a partir do uso sustentável da biodiversidade, além de particular ênfase na América Latina como nova fronteira de crescimento global.

Em terceiro lugar, é necessária uma realocação dos recursos humanos do Itamaraty e uma atualização no processo de recrutamento de novos diplomatas para atender às demandas internacionais do século XXI, que, certamente, terá maior prevalência da Ásia. Neste sentido, uma diplomacia com um espectro amplo de visão, porém com foco naquele continente, deverá abrir maiores oportunidades para o Brasil. Para tanto será necessário redimensionar representações em outros países que já não são tão relevantes para o Brasil no contexto atual. As representações devem estar associadas aos interesses do País e não os pessoais.

A Política Externa, por certo, será reflexo de muito daquilo que o Brasil passará internamente. No entanto, é equivocado acreditar-se que esta é uma área que não gera recursos para o Brasil. Embora não gere votos, a melhoria de imagem internacional do País é essencial para que se possa criar resultados econômicos positivos. Trata-se  de um instrumento poderoso para melhorar a autoestima do País e atrair recursos essenciais que tanto necessita.

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*Marcus Vinicius De Freitas
Visiting Professor, China Foreign Affairs University
Senior Fellow, Policy Center for the New South
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