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Cogitada para se tornar a deputada mais jovem do Congresso americano, Alexandria Ocasio-Cortez, de 28 anos, atraiu a atenção do eleitorado americano quando
Redação Publicado em 05/11/2018, às 00h00 - Atualizado às 08h50
Cogitada para se tornar a deputada mais jovem do Congresso americano, Alexandria Ocasio-Cortez, de 28 anos, atraiu a atenção do eleitorado americano quando derrotou o veterano Joe Crowley na primária do Partido Democrata por Nova York. Sua campanha, feita sem financiamento de empresas, conquistou parte dos nova-iorquinos com propostas de igualdade social, distribuição de renda e críticas ao modelo capitalista americano.
Assim como Ocasio-Cortez, outros candidatos ganharam visibilidade na campanha das eleições legislativas de meio de mandato, no próximo dia 6, reforçando ideias progressistas: Zak Ringelstein, que concorre ao Senado pelo estado do Maine, Cynthia Nixon, atriz de “Sex and the City”,que perdeu a primária democrata para o governo de Nova York e Bernie Sanders, postulante à reeleição ao Senado por Vermont e que em 2016 perdeu a nomeação de candidato presidencial para Hillary Clinton.
Trata-se de uma leva proeminente de políticos do Partido Democrata com ideias mais à esquerda e que se auto-intitulam socialistas democráticos. A campanha de Sanders em 2016, na qual Ocasio-Cortez era voluntária, abriu espaço para o surgimento desses candidatos mais progressistas. Com repetidas críticas a Wall Street, termo usado para se referir ao mercado financeiro americano, um de seus slogans dizia: “uma revolução política está a caminho”.
A Associação dos Socialistas Democráticos da América, que apoia alguns desses candidatos, cresceu muito nos últimos anos: em 2015 tinha 6 mil associados; em agosto deste ano eram 49 mil.
Veja algumas das propostas apresentadas nessas eleições por esses candidatos:
O socialismo democrático, nascido dentro do contexto capitalista americano, pouco tem a ver com a defesa de um Estado socialista. O que Ocasio-Cortez e seus colegas defendem é uma série de medidas para regular a economia americana democraticamente, sem revolução, e pressionar as grandes empresas a atuar em prol dos interesses de toda a população e não apenas do lucro próprio.
Isso seria feito, por exemplo, com uma lei trabalhista mais forte, o aumento do salário mínimo, a proibição da terceirização de mão de obra barata em outros países e de atividades prejudiciais ao meio ambiente.
“O objetivo é que a economia seja regulamentada pelo Estado, que os atores econômicos funcionem dentro de margens definidas pela sociedade, e que a lógica do funcionamento da economia beneficie a sociedade, não apenas os atores econômicos”, diz Geraldo Zahran, coordenador do Observatório Político dos EUA (OPEU) e professor do Departamento de Relações Internacionais da PUC-SP.
“Isso é muito mais próximo do que a gente chama na Europa de social-democracia. Ou mesmo da nossa Constituição brasileira de 1988, se ela fosse implementada na sua totalidade. Uma coisa como o nosso SUS aqui não só não existe nos EUA como seria chamado lá de socialista. Mas está muito longe de ser o socialismo implantado na União Soviética, na China, em Cuba…”, explica.
“Embora Sanders diga que a América precisa de uma ‘revolução política de base’, ele na verdade é um reformador, não um revolucionário. Sua versão do socialismo democrático é semelhante ao que a maioria das pessoas ao redor do mundo chama de social-democracia’, que busca tornar o capitalismo mais humano”, diz Peter Dreier, analista americano, professor da Occidental College em artigo publicado no site da CNN.
Samuel Goldman, professor assistente de Ciência Política na George Washington University, disse em entrevista ao site Think Progress que acredita que Sanders e seus colegas usam um “truque de retórica” que “rotula quase qualquer forma de provisão de bem-estar social como socialismo”.
Bernie Sanders diz que suas ideias são “mainstream” – ou seja, agrada à maioria da população – e costuma citar figuras como Papa Francisco, Franklin Roosevelt e Martin Luther King Jr., para mostrar como elas são conhecidas.
Ocasio-Cortez, que é de ascendência latina e nascida na classe trabalhadora no bairro do Bronx, resume o socialismo democrático na defesa de que “em uma sociedade moderna, rica e moral nenhuma pessoa deveria ser muito pobre pra viver”.
Alexandria faz parte de uma geração que na adolescência passou pela crise financeira de 2011 e viu surgir o movimento Ocupy Wall Street, que questionava a grande influência do setor financeiro no governo americano e a desigualdade social no país mais rico do mundo.
Estima-se que mais de 40 milhões de americanos vivam abaixo da linha da pobreza e mais de meio milhão nas ruas. Apesar de o índice de desemprego ter caído nos últimos anos, o salário mínimo não teve aumento real significativo desde o início dos anos 1970.
Os jovens americanos ainda enfrentam o problema dos empréstimos para financiar um curso superior, já que poucas faculdades no país são gratuitas. As dívidas estudantis giram em torno de US$ 1,4 trilhão e os jovens têm ainda mais dificuldade de comprar uma casa própria e dar início à vida adulta.
Na análise do professor Geraldo Zahran, esse ambiente contribuiu para a repercussão do socialismo democrático nos EUA. “O que levou essa vertente a ganhar força foi uma frustração da sociedade com os políticos americanos, com a maneira como se faz política nos EUA nos últimos 20 anos. Por outro lado, a insuficiência do modelo liberal de democracia e de economia liberal de dar respostas a demandas da sociedade”, diz Zahran.
Alexandria Ocasio-Cortez diz que sua própria trajetória a inspirou a seguir carreira política. “Minha família estava na iminência da hipoteca em 2008, meu pai morreu durante a crise financeira, por isso comecei a trabalhar como garçonete. Entendo a dor dos americanos da classe trabalhadora, porque experimentei essa dor”, disse em entrevista ao canal MSNBC.
“Nós nunca conhecemos nem crescemos em uma época de real prosperidade econômica. Viemos em uma época de super concentração de riqueza. Também crescemos vendo nossos companheiros em outros países, como o Reino Unido e o Canadá, com um sistema de saúde financiado por impostos, indo para a faculdade e se formando sem uma dívida acumulada”, disse ao programa The Daily Show, do canal Comedy Central.
O principal argumento contrário à reformas propostas pelos socialistas democráticos é o de que elas custarão muito caro e poderão refletir em mais impostos à população. Era, por exemplo, o que Hillary Clinton dizia quando Sanders defendia um sistema universal e gratuito de saúde durante a campanha de 2016. Na visão da democrata, seria menos custoso oferecer os benefícios apenas aos que precisam mais.
Sanders alega que sua proposta vai, na verdade, economizar o dinheiro gasto no país com serviços médicos. Ele e Cortez defendem rever a política de impostos para uma cobrança mais justa, taxar as atividades ligadas ao carbono e redefinir as prioridades de gastos do governo.
A ala mais à esquerda dos Democratas têm apelo entre os eleitores mais jovens e a classe trabalhadora, mas ainda encontra resistência justamente por carregar o termo socialismo em um país que por décadas enfrentou o regime da União Soviética na Guerra Fria.
As associações com regimes socialistas vêm inclusive da própria Casa Branca. Em artigo publicado no jornal “USA Today”, o presidente Donald Trump disse que se os democratas ganharem o controle do Congresso, os EUA estarão “perigosamente mais perto do socialismo”.
“Os novos democratas são socialistas radicais que querem modelar a economia da América como a Venezuela”, escreveu o presidente. Sua maior preocupação é que nessas eleições ele perca a maioria republicana da Câmara dos Representantes.
Há poucos dias o Conselho de Assessores Econômicos da Casa Branca soltou um relatório em que associa propostas de Sanders e outros progressistas com políticas fracassadas de regimes comunistas autoritários, como os de Mao Tse-Tung na China e Josef Stalin na União Soviética.
O documento reconhece que os socialistas democráticos não se enxergam como herdeiros dessas figuras, mas afirma que, “coincidindo com o 200º aniversário do nascimento de Karl Marx, o socialismo está de volta ao discurso político americano”.
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