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Roberto Livianu: Divórcio

-Canalha! Quinze anos de anos de casamento e me trocou por esta vagabunda. Luci está alteradíssima e o clima está pesado no processo de divórcio litigioso que

Roberto Livianu: Divórcio
Roberto Livianu: Divórcio

Redação Publicado em 29/06/2020, às 00h00 - Atualizado às 10h06


Divórcio

-Canalha! Quinze anos de anos de casamento e me trocou por esta vagabunda. Luci está alteradíssima e o clima está pesado no processo de divórcio litigioso que ela move contra João. O juiz Lopes Guimarães pensa: belo início de maio – mês das noivas.

Tiveram dois filhos, Joãozinho de oito e Luciane, de seis, maiores atingidos pelas consequências das brigas e dos desentendimentos comuns num final de casamento.

Casaram-se apaixonados, tudo cor-de-rosa e curtiram alguns anos o casamento sem filhos. Formaram patrimônio, viajaram, passearam, adoravam a noite. E ao final resolveram ter filhos e mudou a relação do casal – o casamento entrou em declínio.

João começou a beber, tarde em casa sem explicações. Ela mais fria, tornou-se distante, e, na intimidade o que era efervescente quase congelara. Não se entendiam mais e discutiam por dinheiro.

Ele saiu de casa e tentou mediação para resolver amigavelmente. Não evoluía. Formalizou-se a separação de corpos. Ela se sentia doída. Tudo piorou quando soube que João estava saindo com uma mulher mais jovem, a estudante Yasmin.

Luci resolveu radicalizar e contratou especialista na área e anunciou: quero tirar até as calças dele. Pensão para as crianças e para mim. Bens comigo e não quero meus filhos em companhia desta biscateira. O advogado Meirelles ponderava que deveria ser mais razoável, mas Luci insistia: queria pensão de 80% do salário de João.

Discussões nestes processos são pouco jurídicas. Pirraças, ressentimentos, teimosias e objetivo de obter vantagem econômica. Eis as Varas de Família em todo o Brasil. Raros os casos em que casais conseguem fazer a travessia do divórcio de forma civilizada.

Lopes Guimarães era magistrado sereno e sensível. Mas percebeu que o caso não seria fácil – era resiliente, com fé infinita no ser humano. E resolveu arriscar. Determinou que as demais pessoas saíssem e ali ficaram Luci, João e seus advogados, além da Promotora de Justiça Vera. Falou com a voz dos justos, fez apelo a Luci invocando os filhos.

Relembrou o passado positivo do casal e a imagem que ficaria se se entendessem ali. Sugeriu a solução da guarda compartilhada dos filhos, que ficariam em semanas alternadas com o pai e a mãe, que dividiriam em partes iguais as despesas deles já que ambos tinham bons empregos e salários. Férias, feriados e aniversários alternados e patrimônio adquirido durante o casamento dividido por igual. Luci não conteve as lágrimas e aconselhada por Meirelles, assinou o acordo. O amor aos filhos falou mais alto.

*A crônica “Divórcio” é uma versão adaptada da original publicada na obra “50 Tons da Vida” pela Ateliê Editorial, em 2018 com prefácio de Mário Cortella.

Dr. Roberto Livianu éProcurador de Justiça em São Paulo e doutor em direito pela USP. Atua na Procuradoria de Justiça Criminal. Idealizou e preside o Instituto Não aceito Corrupção e é um dos diretores do Movimento do Ministério Público Democrático. É articulista da Folha de S. Paulo, do Estado de S. Paulo e do Diário de S. Paulo, colunista semanal do Poder360 e Rádio Justiça, do STF e comentarista do Linha Direta com a Justiça, da Rádio Bandeirantes.
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