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PM fica estável e Polícia Civil de SP perde 3 mil policiais na gestão Alckmin

A Polícia Civil de São Paulo perdeu 3 mil policiais desde que Geraldo Alckmin (PSDB) assumiu o governo do estado em 2011. Levantamento realizado pelo G1 com

PM fica estável e Polícia Civil de SP perde 3 mil policiais na gestão Alckmin
PM fica estável e Polícia Civil de SP perde 3 mil policiais na gestão Alckmin

Redação Publicado em 04/11/2016, às 00h00 - Atualizado às 08h40


Defasagem na PC quase dobrou; 95% dos cargos da PM estão ocupados.
Governo fala em crise e diz que investe nas duas polícias, sem priorização.

A Polícia Civil de São Paulo perdeu 3 mil policiais desde que Geraldo Alckmin (PSDB) assumiu o governo do estado em 2011. Levantamento realizado pelo G1 com dados do Diário Oficial e do Portal da Transparência mostra que, em contrapartida, o efetivo da Polícia Militar pouco se alterou no período: a taxa de ocupação dos cargos da instituição sempre se manteve na casa dos 95%.

Para especialistas, a diferença de investimento é clara, aponta a priorização de uma polícia de confronto e acirra uma competição já existente entre as duas instituições. O governo garante que “investe constantemente na modernização e ampliação de todas as polícias” e que “não há qualquer privilégio de uma em detrimento das outras”.

Em janeiro de 2011, quando tomou posse, Alckmin encontrou uma Polícia Civil com defasagem de 13% no número de funcionários. A instituição deveria contar com 35.337 policiais, mas apenas 30.714 estavam em atividade.

Em julho de 2013, o próprio governador promulgou a Lei Complementar nº 1206 que determinou que o contingente da Polícia Civil fosse ampliado e composto por um total de 36.506 profissionais – já excluindo o cargo de carcereiro que acabou extinto pelo tucano.

A lei de 2013 adicionou 1.169 cargos aos quadros da Polícia Civil. O reforço aconteceria especificamente no braço técnico-científico da instituição, que é o encarregado pelos trabalhos de perícia criminal. As novas vagas foram anunciadas, mas, até agora, não foram ocupadas integralmente. E, segundo o governo, não há nem previsão certa para que sejam.

Após quase seis anos de gestão Alckmin, o déficit de servidores na Polícia Civil na verdade quase dobrou, subindo para 24%. Ou seja, já são 8,7 mil policiais a menos do que o previsto em lei. Em outubro de 2016, o efetivo da instituição era de apenas 27.714 profissionais, distribuídos em 13 cargos: delegado, investigador, escrivão, perito, fotógrafo técnico-pericial, desenhista técnico-pericial, papiloscopista, auxiliar de papiloscopista, médico legista, auxiliar de necropsia, atendente de necrotério, agente de telecomunicações e agente policial.

Dos 13 cargos, nove tiveram queda na quantidade de funcionários de 2011 para cá. As únicas funções que registraram aumento no número de profissionais no período foram a de perito e auxiliar de necropsia. O crescimento, nestes casos, foi de 1%
    Retroescavadeira trabalha em terreno perto da casa de pintor na Zona Sul (Foto: Will Soares/G1)

    Peritos da Polícia Civil de São Paulo investigam crime em setembro de 2015 na Favela Alba (Foto: Will Soares/G1)

    Justificativas
    A Secretaria da Segurança Pública afirma que o quadro na Civil foi agravado por conta da Lei Complementar 144/2014, que estabeleceu em 65 anos o limite de idade com a qual os policiais podem atuar. Com ela, 862 policiais foram aposentados compulsoriamente entre 2014 e 2015. A lei foi revogada depois, mas os cargos não foram restituídos automaticamente.

    A pasta também aponta a “pior crise econômica da história do país” como um empecilho para a reposição do efetivo da Polícia Civil. Segundo a secretaria, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) limita os gastos do governo com o funcionalismo público a no máximo 46,55% do que ele arrecada. Como as receitas caíram, os gastos, então, não poderiam aumentar.

    O governo se diz “obrigado” a seguir a lei. “São Paulo tem reconhecido histórico de cautela fiscal, continuará respeitando os limites da LRF e, em respeito ao contribuinte, efetuará as contratações conforme a disponibilidade orçamentária”, afirmou a administração estadual.

    A própria LRF, no entanto, ressalta que a proibição de contratações não se estende à reposição decorrente de aposentadoria ou morte de servidores das áreas de saúde, educação e segurança.

    Casos críticos
    A situação mais crítica dentro da instituição é a de médico legista. Quase uma centena deles deixou a instituição nos últimos dois mandatos do tucano que, curiosamente, também é formado em medicina. Servidores ouvidos pelo G1 afirmam que, em cidades do interior, não são raros os casos em que o auxiliar de necropsia faz as vezes de legista.

    As aposentadorias e exonerações representam uma diminuição de 18% na quantidade de médicos quando comparados os registros de 31 de dezembro de 2010 e setembro deste ano. Com a queda, a defasagem na carreira, que já era considerável antes de Alckmin, atingiu índices alarmantes: quase metade das vagas estão desocupadas.

    Já em números absolutos, os cargos de investigador e escrivão apresentam a maior redução de pessoal no período. Milhares de policiais deixaram seus postos e a reposição do governo não acompanhou o ritmo das saídas. Segundo a última atualização do Portal da Transparência, as duas carreiras têm, juntas, 2195 policiais a menos do que há seis anos.

    Policiais civis chegaram a paralisar as atividades durante uma hora na quarta-feira (19) em protesto por novas contratações e melhores condições de trabalho. A manifestação, batizada de “Operação Nocaute”, foi realizada em diversas cidades do estado, como Avaré, Bauru, Santos, Presidente Prudente e na capital paulista.

    Alckmin e secretário de Segurança Pública, Mágino Alves, em entrega de viaturas para PM neste ano (Foto: Divulgação/SSP)

    Alckmin e secretário de Segurança Pública, Mágino Alves, em entrega de novos carros para a PM neste ano (Foto: Divulgação/SSP)

    PM fora da crise
    Se a Polícia Civil sofre com a falta de profissionais, como alegam os sindicatos da categoria, a coirmã no combate ao crime, a Polícia Militar, deste mal não padece. Desde que assumiu o governo, Alckmin mantém um índice de ocupação dos cargos da PM na casa de 95%. 89.057 policiais militares estavam na ativa em outubro de 2016.

    Em 2013, o governo abriu concursos para a contratação de policiais para as duas instituições. Enquanto no certame da PM todos os aprovados foram empossados e até remanescentes acabaram convocados, as primeiras contratações na PC só foram acontecer agora, três anos depois da publicação do edital, e de forma parcial: a previsão, por exemplo, era contratar 1.384 novos investigadores, mas só 346 deles tomaram posse.

    Este ano, em 30 de agosto, Alckmin voltou a autorizar, com anuência das secretarias da Fazenda e de Planejamento e Gestão, a abertura de outro concurso para a PM. Desta vez para contratar 5,4 mil soldados para exercício em 2017, como consta na edição do Diário Oficial da data. A publicação ressalta: “devendo ser observadas, por ocasião do provimento dos cargos, as disponibilidades orçamentário-financeiras”.

    Competição
    Para o criminalista Daniel Bialski, a diferença de contratações entre as polícias Civil e Militar acirra uma espécie de competição que já existe entre elas. “Isto vai do campo de atribuição funcional até a salarial. Uma não aceita ser preterida em privilégio da outra. E ambas têm razões. O nivelamento deveria ser em prol da valorização das carreiras, o que não tem sido observado pelo governo”, afirma.

    Já para o especialista Rafael Alcadipani, do Fórum de Segurança Pública, a diferença de investimento nas duas instituições é evidente. “Governar é fazer opções. Ainda mais em uma época de crise econômica. E a opção que o governo tem feito é clara e transparente: fortalecer a PM e enfraquecer a Civil.”

    De acordo com o especialista, o favorecimento de uma polícia de confronto acaba se configurando em uma estratégia de “enxugar gelo”. “Como não há investigação criminal, as pessoas são presas e soltas. Não há capacidade pra gerar provas e punir as pessoas efetivamente”, acrescentou.

    Por nota, a administração estadual afirmou que, em 2016, já foram empossados 763 profissionais para a Polícia Civil (49 delegados, 339 investigadores e 375 escrivães) e reforçou que não há qualquer tipo de privilegiamento nos investimentos realizados nas duas polícias.

    Alcadipani defende que o problema também não é a quantidade de efetivo, mas sim o atual modelo de segurança pública. “Se você juntar Guarda Civil Metropolitana, Polícia Civil e PM, são muitas polícias e muitos policiais, mas está mal distribuído”, finalizou. Para ele, o ideal seria unir todas as forças em uma única instituição, de caráter civil.

    Policiais deixaram seus postos na Central de Polícia Judiciária (CPJ), em Presidente Prudente, em protesto por novas contratações (Foto: Valmir Custódio/G1)

    Policiais deixaram postos na Central de Polícia Judiciária, em Presidente Prudente, em protesto por contratações (Foto: Valmir Custódio/G1)

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