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COLUNA

Um conselho para Lula resgatar Dilma do que continua a chamar de golpe

Impeachment. - Imagem: Reprodução | Miguel Schincariol / UOL
Impeachment. - Imagem: Reprodução | Miguel Schincariol / UOL
Reinaldo Polito

por Reinaldo Polito

Publicado em 03/09/2023, às 06h09


Lula não se cansa de dizer que o impeachment de Dilma foi um golpe. Não foi. Quem acompanhou o processo desde o início pôde observar que foram respeitados todos os preceitos constitucionais.

A ação teve início no dia 2 de dezembro de 2015. Naquele momento, seguindo as normas legais, Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, aceitou a denúncia de crime de responsabilidade, assinada por três juristas, Miguel Reale Júnior, Janaina Paschoal e Hélio Bicudo. Os trâmites foram rigorosamente cumpridos até o encerramento no dia 31 de agosto de 2016.

Outros presidentes foram impichados

A ex-presidente não foi a primeira a ter de interromper o mandato. Antes dela o Brasil afastou Carlos Luz, Café Filho e Fernando Collor. Todos os presidentes sofrem essa pressão dos opositores. Só para dar uma ideia, nos quatro anos em que esteve como chefe do Executivo, Bolsonaro recebeu 151 pedidos de impeachment.

Dilma deveria ficar inelegível por oito anos. Um arranjo de última hora, entretanto, não previsto, determinou que ela seria impichada, mas continuaria com seus direitos políticos preservados. A gestão da ex-presidente se mostrou tão sofrível que na primeira vez em que tentou se candidatar, depois de ter deixado o Palácio do Planalto, foi fragorosamente derrotada na disputa a uma vaga no Senado por Minas Gerais.

Não deixou saudade

Esse fracasso nas urnas demonstrou que os eleitores não sentiram saudade da ex-presidente. Para o PT, todavia, a primeira mulher eleita para a presidência do país foi injustiçada, pois deixou o poder por um golpe.

Notícias recentes acenderam ainda mais essa sensação de que ela foi arrancada do cargo sem motivos que justificassem a sua saída. O TRF-1 mandou arquivar a ação de improbidade administrativa que pesava sobre Dilma. Foi um alvoroço entre os petistas. Afinal, segundo eles, essa decisão limpava de vez o passado da ex-presidente. Era a prova de que as pedaladas fiscais não existiram. O argumento que faltava para inocentá-la.

Na semana passada, em visita a Angola, Lula disse que o país devia desculpas à ex-presidente:

“O fato de a presidente Dilma ter sido absolvida pelo Tribunal Federal de Brasília demonstra que o Brasil deve desculpas à presidente Dilma, porque ela foi cassada de forma injusta”

A verdadeira versão

Só que a história não é bem essa. O voto dos desembargadores esclareceu que nesse caso não havia como continuar com a ação de improbidade pelo fato de Dilma já ter sido penalizada pelo Senado por crime de responsabilidade. Se dessem sequência, poderia haver duas condenações pelo mesmo motivo, o que não é contemplado pela legislação.

Em virtude dessas declarações do presidente, mais de 40 deputados já haviam assinado pedido de impeachment contra ele. A indignação se dá pelo fato de que, ao agir assim, Lula parece fazer um ataque às instituições, que constitucionalmente cumpriram seu papel.

Um retorno democrático

Lula fecha um olho para essa situação tão evidente.  Insiste na pregação de restaurar, pelo menos simbolicamente, uma posição que, segundo ele, por direito, deveria ser dela. Esse é um discurso que agrada à militância, apenas com finalidade política, sem nenhuma consequência prática.

Há, porém, uma maneira de Lula e o PT, de forma legítima, resgatarem a imagem de Dilma e a reconduzirem ao cargo de onde foi apeada. Em 2026 teremos novas eleições à presidência da República. Tendo sido prejudicada como foi, de acordo com seus aliados, e agora estando seu partido no governo, com toda a força da máquina política nas mãos, com tempo suficiente para informar à população de que ela deveria ter continuado no posto para o qual foi eleita legitimamente pela população brasileira, basta que a indiquem como candidata.

Interessa a narrativa

Dessa forma, com os votos dos eleitores, poderia provar que o povo gostaria de vê-la novamente governando o país. Mas esse não é o caminho desejado por Lula. Não há como negar a intenção de criar narrativas que possam abastecer seus seguidores com essa fantasia ficcional.  

Qual seria, então, a intenção do presidente se ele já conhece o epílogo dessa história? Entre outros motivos, vale para preencher as falas palanqueiras e serve como boa cortina de fumaça para esconder os graves problemas que estamos enfrentando, e, pelo que tudo indica, ainda teremos de enfrentar nos próximos tempos.

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