por Marcus Vinícius De Freitas
Publicado em 28/09/2022, às 08h42
O dia 19 de setembro de 2022 entrou no calendário mundial como um dos maiores eventos da história. O enterro de Sua Majestade Britânica, a Rainha Elizabeth II representou a união de três séculos: criada por pais e avós do século XIX, passou a maior parte de sua vida no século XX, onde viu enormes transformações ocorrerem, e liderou a Coroa Britânica na nova transição global do século XXI. A Rainha Elizabeth II viu o ocaso do Reino Unido como potência mundial, assistiu a ascensão e o declínio gradativo dos Estados Unidos e ainda vislumbrou o processo de ascensão da China. Assistiu a ascensão e queda do nazismo e do comunismo soviético, a Segunda Guerra Mundial e a Guerra Fria. Elizabeth II visitou mais de cem países, alguns várias vezes. Esteve com todos os presidentes norte-americanos, desde Harry Truman, exceto Lyndon Johnson.
Conheceu a maior parte dos líderes e influenciadores globais nas últimas sete décadas. Teve 15 primeiros-ministros, de Winston Churchill a Liz Truss. Enfim, à frente da Chefia de Estado do Reino Unido, Elizabeth se transformou, por seu silêncio estratégico, numa influenciadora como ninguém. Sua capacidade de atração foi até o último momento. Seu enterro conseguiu reunir mais de uma centena de chefes de estado e governo.
Os dois minutos de silêncio, no enterro de Elizabeth II, representaram o fim de uma era. A Rainha foi um exemplo de serviço, que se dedicou à função que ocupou com um empenho magistral. Dos 21 anos de idade, quando fez a promessa, na Cidade do Cabo, na África do Sul, de que não importasse se sua vida fosse longa ou curta seria devotada ao serviço do povo britânico e da Família Imperial de nações, até dois dias antes da morte, quando convidou Liz Truss a formar um novo governo, Elizabeth jamais revelou indisposição em sua função. Acompanhada por seu querido esposo, o Príncipe Philip, Duque de Edimburgo, com quem foi casada por 73 anos, Elizabeth foi um exemplo de dedicação à Coroa Britânica.
Elizabeth II constituiu um elo contínuo de um país com seu passado, sua história, tradição e grandes realizações, representando o Estado britânico em todo o seu esplendor e glória. Ela viu seu país também passar por profundas transformações: de um grande império a uma ilha, ainda muito influente – ressalte-se –, mas ainda uma ilha. A Rainha soube resguardar as tradições monárquicas e, ao mesmo tempo, manter a instituição em constante rejuvenescimento, protegendo o seu misticismo liturgia e relevância, sempre pautada pelo constante escrutínio da opinião pública.
O maior ativo de Elizabeth II, segundo todos os primeiros-ministros que lhe serviram, era a sua incomparável capacidade aconselhadora, em razão da sua serenidade, particularmente em momentos difíceis da vida nacional. Em testemunho disso, a ex-primeira-ministra Theresa May afirmou no Parlamento Britânico que o maior benefício das conversas semanais com a soberana britânica era não somente a qualidade do conselho mas o sigilo das reuniões, com a absoluta certeza de que nada seria vazado à imprensa.
O enterro foi um ato final de precisão, elegância e serenidade, aflorando uma das principais características de uma MonarquiaConstitucional: a dedicação abnegada a uma nação. Elizabeth II agora pertence ao tempo e à eternidade. Fará falta, é verdade.
Encerrado o período do luto real, os olhos agora se voltam ao sucessor no trono britânico, Charles III, o herdeiro mais idoso a assumir a Chefia de Estado na história. Aos 73 anos, é conhecido da opinião pública. Enfrenta o lado positivo do treinamento de décadas para a função que assume agora, já no ocaso da existência. No entanto, sempre haverá os críticos de plantão, que relembrarão o divórcio do Princípe Charles de Lady Diana Spencer, particularmente neste ano em que o fatídico acidente em Paris completa um quarto de século. Os críticos, por certo, não levarão em conta a linda história de amor perene existente entre o Rei e a Rainha Consorte, Camilla, que, atuando em conjunto, representam o melhor do Reino Unido.
Charles III pretende imprimir na monarquia britânica algumas atualizações. A instituição milenar tem uma capacidade impressionante de reinventar-se para oferecer aos súditos o espetáculo, a beleza, o respeito, a tradição e a honra, com a recordação de um passado histórico e um futuro auspicioso baseado na continuidade e estabilidade típicos do regime. Winston Churchill, o maior estadista do século XX e um amante da monarquia constitucional, afirmou certa feita: “O futuro é desconhecido, porém o passado deveria dar-nos esperança”. O Rei Charles III enfrenta agora o desconhecido do futuro. Mas o passado é pródigo em prover esperança. As lágrimas do novo soberano britânico refletiram um momento único de tristeza e de separação da querida matriarca. Aqueles que já perderam a mãe conhecem a dor indescritível que é ver a partida de uma mãe, avó e bisavó. Para Charles III, não foi diferente. A expressão e o olhar lacrimejante nos fizeram recordar de que, não importa o berço em que nasçamos, nós mortais somos todos iguais em nossos sentimentos, principalmente na perda.
Na hora em que os símbolos reais foram removidos do caixão e o corpo de Elizabeth II levada à câmera fúnebre, recaiu sobre Charles não somente o manto, mas o poder simbólico e a tradição de mil anos de história. Recaiu sobre ele também o orgulho de um povo por seu soberano, por aquilo que ele representa e por aquilo que fará nos próximos anos. Comparado à mãe, CharlesIII caminhará na sombra por algum tempo. No entanto, sua atuação será importante para manter a relevância global do Reino Unido.
A proximidade de Sua Majestade Britânica aos temas ambientais e de preservação poderiam reaproximar o Brasil e o Reino Unido na construção de uma sociedade global que valorize mais o meio ambiente e promova maior sustentabilidade ambiental. Longa vida ao Rei Charles III!
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