Diário de São Paulo
Siga-nos
COLUNA

Você votaria em quer que você não exista?

Eleições. - Imagem: Reprodução | Agência O Globo
Eleições. - Imagem: Reprodução | Agência O Globo
Kleber Carrilho

por Kleber Carrilho

Publicado em 27/01/2024, às 08h16


Esta pergunta aparece frequentemente quando observo indivíduos de grupos marginalizados defendendo líderes políticos que promovem políticas prejudiciais a esses mesmos grupos. Um fenômeno recente e preocupante nesse cenário é a ascensão do partido Chega em Portugal. Às vésperas das eleições marcadas para março, o partido liderado por André Ventura desafia a hegemonia dos tradicionais Partido Socialista e Partido Social-Democrata, destacando-se por uma retórica carregada de mensagens hostis contra imigrantes.

É crucial ressaltar que, entre os alvos da retórica discriminatória de Ventura estão os brasileiros, especificamente aqueles que migraram para Portugal em busca de oportunidades de trabalho em setores menos valorizados, como limpeza, entrega de alimentos e construção civil. Apesar da ausência de dados precisos, é perceptível em conversas nas ruas que uma parcela significativa de brasileiros residentes em Portugal expressa apoio ao Chega e suas ideias xenofóbicas, um fenômeno que se parece com o apoio de latinos a Donald Trump nos Estados Unidos.

Uma possível explicação para esse fenômeno está na falta de um senso coletivo de comunidade entre esses indivíduos, levando-os a se identificarem com discursos de ódio e discriminação. Ao ouvirem que os brasileiros são retratados como o problema em Portugal, muitos desses imigrantes pensam nos outros brasileiros que, na visão de Ventura, competem por recursos e empregos, sem perceber que eles próprios também estão incluídos. Esse individualismo acaba resultando em um número expressivo de votos a favor de políticas que, na prática, são prejudiciais ao próprio grupo.

É importante reconhecer que, em meio a esse cenário, há um vácuo de diálogo e entendimento. A complexidade das experiências dos imigrantes brasileiros em Portugal não pode ser reduzida a estereótipos ou generalizações simplistas. Por isso, mesmo fora do Brasil, é essencial promover uma conversa franca e inclusiva que destaque as contribuições positivas dos imigrantes para a sociedade portuguesa, também abordando as preocupações legítimas dos cidadãos locais.

Um lembrete valioso é que o voto tem consequências diretas e duradouras. Optar por líderes que propagam uma visão xenofóbica pode resultar em políticas que minam a coesão social e prejudicam a diversidade, aspectos fundamentais para a vitalidade de qualquer sociedade, principalmente a portuguesa. Num momento em que o mundo enfrenta desafios globais, é essencial buscar líderes e políticas que promovam a compreensão, inclusão e respeito mútuo.

Numa sociedade cada vez mais interconectada, é vital reconhecer a importância de construir pontes em vez de muros. O desafio é superar as divisões, abraçar a diversidade e construir um futuro onde todos possam coexistir pacificamente, independentemente da origem ou nacionalidade

E, como sabemos, a possibilidade de que se faça isso da melhor forma é uma só: educação que promova a emancipação, ao contrário do individualismo que tem sido valorizado principalmente em grupos religiosos e na vida nas redes sociais.

Compartilhe  

últimas notícias