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Na fala sobre Gaza, Lula errou. Mas também acertou

Luiz Inácio Lula da Silva. - Imagem: Divulgação / Ricardo Stuckert
Luiz Inácio Lula da Silva. - Imagem: Divulgação / Ricardo Stuckert
Kleber Carrilho

por Kleber Carrilho

Publicado em 24/02/2024, às 05h33


Se você não gosta do presidente, fique por aqui, porque vou falar de erros dele. E, se você gosta, fique também, porque vou falar de acertos. Para isso, claro, vou fazer o que muita gente já fez, inclusive eu: vou analisar a fala sobre os ataques do Estado de Israel à população palestina, no meio da qual estão os terroristas do Hamas.

E quando é que ele errou no discurso? Em um momento óbvio, quando comparou o conflito em Israel à Alemanha Nazista. Como você deve saber, há um erro na comparação histórica, e ele é simples: no Estado de Israel não há, pelo menos até agora, uma estrutura burocrática de aniquilação do povo palestino. Além disso, houve um ataque do Hamas aos israelenses em outubro, o que não aconteceu no caso dos judeus na Alemanha.

Porém, além do erro histórico, há o erro estratégico: a fala de Lula beneficiou die forma direta Benjamin Netanyahu, exatamente o primeiro-ministro de Israel que ele queria atingir. Quando o presidente brasileiro lembrou o Holocausto, colocou os israelenses no lugar de vítimas que têm o direito de se defender. E isso era exatamente o que precisava para que o governo israelense pudesse tirar o foco dos ataques em Gaza para levar para o que ocorreu no período da Segunda Guerra Mundial.

É por isso que Netanyahu e seus ministros falaram tanto sobre o discurso de Lula, usaram a imprensa internacional para dar recados, fizeram discursos em inglês, com a clara intenção de mostrar protagonismo na defesa de todos os israelenses e retomar uma capacidade de governar que há muito está sendo perdida pela direita de lá.

Porém, mesmo criticado por todos os lados, e deixando de lado um possível papel de mediador do conflito, que é histórico do Brasil, Lula fez com que o tema fosse retomado com grande importância na mídia, o que resultou em um movimento de crítica muito forte à forma como os ataques estão acontecendo.

Sem receber reprimenda pública de nenhum outro chefe de Estado, Lula foi personagem internacional, teve apoio velado de alguns e fez com que muita gente tivesse que comentar sobre o tema.

Internamente, embora tenha agitado as intenções dos bolsonaristas para apresentarem um pedido de impeachment, conseguiu ser visto demonstrando força em um momento em que os feitos do governo ainda não chegaram ao dia a dia da população, pelo menos quanto à percepção, como já falamos por aqui.

Além disso, com a fala, ele conseguiu criar uma certeza de que o apoio do ambiente político é muito forte, com gente comentando que não aprova a comparação, mas nem por isso colocando em dúvida a capacidade de liderança.

Novamente, vale a percepção de que, principalmente em ambientes sob os olhares do mundo, Lula não deve improvisar. Afinal, o que a paixão deixa transparecer em geral é algo que não passa pelos argumentos políticos e, neste caso, históricos.

Desta vez, o acidente teve algum lado positivo. Porém, é importante lembrar que, principalmente com a edição de vídeos curtos nas redes sociais, nem sempre é possível destacar a intenção de qualquer discurso.

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