Diário de São Paulo
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Samuel Emílio: De obra cara e sem conexão com a cidade, Novo Anhangabaú pode virar marco para população negra

Quando R$ 94 milhões de reais são despendidos durante uma pandemia, é evidente que tal gasto será voltado a atender às urgentes demandas da população, certo?

Samuel Emílio: De obra cara e sem conexão com a cidade, Novo Anhangabaú pode virar marco para população negra
Samuel Emílio: De obra cara e sem conexão com a cidade, Novo Anhangabaú pode virar marco para população negra

Redação Publicado em 21/08/2020, às 00h00 - Atualizado às 12h42


De obra cara e sem conexão com a cidade, Novo Anhangabaú pode virar marco para população negra

Quando R$ 94 milhões de reais são despendidos durante uma pandemia, é evidente que tal gasto será voltado a atender às urgentes demandas da população, certo? A Prefeitura de São Paulo parece discordar. Em meio a maior crise de uma geração, a PMSP investiu quase uma centena de milhões dos cofres públicos para “revitalizar” o Vale do Anhangabaú. Um espaço que, vale ressaltar, não precisava de vida nova, como o termo revitalizar sugere, mas sim melhor servir as inúmeras vidas que já o ocupam.

Além de cara, a reforma em nada parece dialogar com as demandas da população paulistana que é carente de espaços públicos acolhedores, áreas verdes e habitações sociais. O Novo Vale do Anhangabaú é um perfeito exemplo da desconexão entre os tomadores de decisão que elaboram políticas públicas e a população que de fato usufrui delas.

Aproximar essas duas esferas, dos gestores e dos usuários do espaço público, é tarefa sem dúvida complexa e que passa por inúmeras etapas, como a eleição de políticos que de fato representem seus eleitores e a implementação de processos de tomada de decisão cada vez mais participativos. No curto prazo, contudo, há uma proposta pouco custosa e bastante significativa que pode tornar a obra um marco positivo para a população que habita o centro da cidade. Falo aqui de uma estátua negra no Vale do Anhangabaú

Uma demanda latente entre os mais de 4 milhões de negras e negros que residem em São Paulo é a de se verem representados nos espaços urbanos. Atualmente, a cidade está repleta de monumentos que exaltam e perpetuam uma narrativa colonizadora, como monumento às bandeiras, a estátua de Borba Gato e o monumento ao Anhanguera. Uma forma de  inverter esta ordem atualmente imposta é por meio da construção de estátuas que representem importantes figuras negras da história do país, recontando nossa história a partir de uma lógica decolonial de celebração da negritude.

Com a obra do Vale do Anhangabaú surge a oportunidade perfeita para a construção de uma estátua que homenageie uma personalidade preta. Esta, deve ser definida por meio de consulta pública à ativistas do movimento negro. A reforma passaria a celebrar, assim, as vidas que já ocupam o centro da cidade, ao invés de visar higienizá-lo por meio de alterações extremamente custosas e que não servem a população que usufrui do espaço urbano.

Samuel Emílio
Engenheiro, conselheiro do movimento Acredito, consultor em diversidade e inclusão e fundador de Engaja Negritude, Fellow do Pro Líder, Guerreiros Sem Armas e Aryrax
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