Diário de São Paulo
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Violência contra a mulher

Projeto ‘Bolsa Arma’ oferece R$ 2 mil para vítimas de violência doméstica adquirirem armas

Especialistas em segurança alertam que a medida não vai proteger as mulheres dos agressores

O projeto foi aprovado recentemente por deputados do estado de Goiás - Imagem: Freepik
O projeto foi aprovado recentemente por deputados do estado de Goiás - Imagem: Freepik

Mateus Omena Publicado em 15/12/2022, às 15h38


Os deputados do estado de Goiás aprovaram, na última terça-feira (13), um projeto que cria uma “bolsa para a compra de arma de fogo de uso permitido para a mulher vítima de violência doméstica ou em razão de ser mulher”.

O auxílio, que ficou conhecido como “bolsa arma”, oferece às vítimas o valor de R$ 2 mil, mas é necessário cumprir uma série de requisitos para receber a quantia. Por outro lado, especialistas em segurança pública e violência alertam que a medida é arriscada e não tem eficácia para proteger as vítimas.

A medida é válida apenas para mulheres residentes em Goiás, que tenham sido vítimas de violência doméstica e que tenham mais de 21 anos. Além disso, as interessadas não podem ter antecedentes criminais e precisam comprovar saúde mental.

O mais importante, é preciso ter preparo para manusear a arma e participado de treinamento em tiro, que deve ser ministrado gratuitamente pelo estado. Se a vítima já tenha registro de arma de fogo, não poderá fazer o pedido do auxílio.

A proposta foi feita em meados de 2020, pelo deputado Major Araújo (PL), admirador do presidente Jair Bolsonaro (PL). O projeto só foi aprovado na terça-feira (13). Segundo ele, “as mulheres são perseguidas, agredidas, espancadas, mutiladas, queimadas e até assassinadas com registro na polícia e com medidas de segurança consigo, demonstrando que todos os aparatos existentes ajudam, contudo, não resolvem esse grave problema”.

O auxílio está de acordo com a legislação que trata do porte de arma, dentro dos requisitos da Lei do Desarmamento, para que a mulher possa portar sua arma e retirar o seu porte com o aval do estado.

No entanto, o projeto aprovado pelos deputados de Goiás não estabelece de onde sairia o dinheiro necessário para pagar o auxílio de R$ 2 mil. Além disso, não há estimativa de qual o tamanho do gasto do poder público com a bolsa.

Especialistas temem os efeitos da medida

Em entrevista à TV Anhanguera, afiliada da TV Globo, a delegada Hilda Helbingen, que atende casos de violência doméstica, não concorda com a medida e afirma que as armas compradas podem parar na mão dos agressores e colocar as vítimas em um perigo ainda maior.

“Na maioria das vezes, elas [vítimas] voltam para o agressor exatamente por não ter esse apoio, seja financeiro, com um emprego, seja psicológico para entender a dinâmica do relacionamento que está fazendo mal para ela”.

Já a diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, reforça que ter uma arma de fogo dentro de casa não vai deixar a vítima mais segura contra o agressor. Para ela, a maneira mais eficiente para proteger e amparar as mulheres nessa condição é fortalecê-las e aprimorar os serviços voltados para defendê-las

“As armas têm sido mais usadas para matar essas mulheres. A gente sabe que a presença da arma de fogo em uma situação de violência doméstica, em geral, está na mão do agressor, serve para ameaça-la e coagir. A chance dela efetivamente conseguir usar essa arma na situação de violência doméstica é muito baixa porque ela está mais vulnerável”, disse.

Além disso, Larissa Barreto, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), pontua que a solução para a violência doméstica não consiste em armar as mulheres, mas, na verdade, estabelecer medidas protetivas e de apoio às vítimas.

“Políticas públicas eficientes para que a vítima tenha acolhimento, medias protetivas que possam ser aplicadas em tempo e efetivamente. Então, muito antes de se pensar em armar uma pessoa por ela ser vítima, nós entendemos que essa pessoa, especialmente uma mulher vítima de violência, precisa receber do estado outros implementos”, disse.

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