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Justiça Desarmada

Desarmamento Seletivo: A desigualdade entre advogados, juízes e promotores

Imagem ilustrativa. - Imagem: Reprodução | Freepik
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Cristiano Medina da Rocha

por Cristiano Medina da Rocha

Publicado em 05/06/2024, às 08h35


O Estatuto da Advocacia e da OAB estabelece, no artigo 6º, que "não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público". Esse dispositivo consagra a paridade de armas entre esses profissionais, destacando que todos atuam em pé de igualdade na busca pela justiça, fundamental para garantir um sistema jurídico equilibrado e justo.

No entanto, ao analisar as questões relativas ao porte de arma, observamos uma discrepância significativa que desvirtua esse princípio de igualdade. A legislação brasileira estabelece requisitos rigorosos para a concessão do porte de arma, conforme previsto no Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003) e nas normas regulamentadoras editadas pelo Exército Brasileiro e pela Polícia Federal. Na prática, as autoridades utilizam fundamentos prontos para justificar a negativa à concessão, seguindo a política de desarmamento adotada pelo governo federal.

Entretanto, a situação é distinta para juízes e promotores de justiça. Esses profissionais têm direito ao porte de arma independentemente de qualquer qualificação específica, conforme estabelecido no artigo 33 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar nº 35, de 14 de março de 1979) e no artigo 42 da Lei Orgânica do Ministério Público (Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993). A prerrogativa de portar armas é concedida com base no cargo, independentemente de licença ou autorização.

Dessa forma, surge a indagação: por que os advogados, que também exercem funções essenciais à justiça e enfrentam riscos consideráveis, especialmente aqueles que atuam na área criminal, não têm o mesmo direito? A advocacia criminal, em particular, expõe seus profissionais a situações de risco semelhantes ou superiores às enfrentadas por muitos promotores de justiça, que, embora tenham o direito ao porte de arma, nem sempre atuam diretamente na esfera criminal.

No meu caso, como advogado criminalista, tenho atuado em diversas operações de grande relevância, participando ativamente na condenação de criminosos de alta periculosidade. Essa posição me coloca em situações de risco constante, muitas vezes enfrentando perigos que são maiores do que os enfrentados por muitos juízes e promotores. A atuação na área criminal, especialmente na assistência à acusação, implica um nível de exposição e risco que justifica a necessidade de portar uma arma para defesa pessoal.

Atualmente, o presidente da OAB Nacional tem defendido essa bandeira no Congresso Nacional, buscando a inclusão dos advogados no rol de profissionais autorizados a portar armas. Essa é uma luta que vem sendo defendida há anos por advogados como Alfredo Scaff, que têm argumentado incansavelmente em prol dessa causa.

A injustiça fica evidente quando se observa que o porte de arma é automaticamente concedido a juízes e promotores de justiça, sem a necessidade de comprovação específica de risco, enquanto os advogados, mesmo aqueles que atuam diretamente na área criminal, são impedidos de obter essa autorização. Essa discrepância não se sustenta em uma análise racional e justa das reais necessidades de segurança dos profissionais do direito.

O justo seria que a análise para a concessão do porte de arma fosse feita de maneira igualitária para advogados, juízes e promotores. A autorização deveria ser concedida àqueles que demonstrem a efetiva necessidade em face do exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física. Para isso, os requisitos para a concessão do porte de arma devem ser claros e objetivos, não interpretativos, garantindo uma avaliação justa e equitativa.

Atualmente, a análise é genérica e muitas vezes segue a política de desarmamento, sem considerar as particularidades da area de atuação do advogado. A negativa sistemática de porte de arma para advogados reflete uma visão distorcida que não reconhece os riscos inerentes à sua atividade. É imprescindível que se reconheça a importância da segurança dos advogados, especialmente aqueles que atuam em casos de alta complexidade e risco.

Defendo, portanto, a concessão do porte de armas para juízes, promotores de justiça e advogados, desde que preencham os requisitos legais estabelecidos para tal. Essa concessão deve ser feita sem distinção entre esses profissionais, garantindo que todos aqueles que enfrentam riscos significativos em suas atividades possam ter o direito à legítima defesa. A paridade de armas no contexto jurídico deve se refletir também no direito ao porte de arma, assegurando que advogados, juízes e promotores estejam igualmente protegidos ao desempenharem suas funções essenciais à justiça.

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