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Dúvidas sobre o cargo que Weintraub vai ocupar no Banco Mundial?

O economista Otaviano Canuto passou 16 anos no Banco Mundial, foi vice-presidente, staff e também esteve cinco anos no conselho, representando a cadeira

Dúvidas sobre o cargo que Weintraub vai ocupar no Banco Mundial?
Dúvidas sobre o cargo que Weintraub vai ocupar no Banco Mundial?

Redação Publicado em 20/06/2020, às 00h00 - Atualizado às 20h57


O economista Otaviano Canuto passou 16 anos no Banco Mundial, foi vice-presidente, staff e também esteve cinco anos no conselho, representando a cadeira encabeçada pelo Brasil como diretor executivo – cargo para o qual o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub foi indicado pelo governo brasileiro.

Ele falou ao blog sobre a natureza do cargo que Weintraub ocupará e tirou dúvidas sobre as chances de ele não ser eleito pelos demais países da cadeira. Veja abaixo os principais trechos:

O que faz o diretor-executivo da Constituency do Brasil, que inclui outros 8 países?

Tenho uma base factual de quais são os requisitos para o cargo porque o ocupei por cinco anos e também porque atuei como staff (funcionário efetivo) e fui vice-presidente do Banco Mundial.

O cargo está no Conselho de Administração do banco, mas há responsabilidades mais detalhadas que um board de outros bancos porque é um conselho residente, que acompanha e aprova centenas de operações.

O peso de cada país e a força de sua voz refletem a parcela do capital do banco que você está representando. Os Estados Unidos, por exemplo, têm 18%. Países europeus, quando se juntam, chegam a 32%. Há um acordo entre EUA e Europa de que um americano preside o Banco Mundial e um indicado europeu preside o FMI.

Japão, por exemplo, tem 9%. Alguns países têm cadeiras próprias, como França, Alemanha, Reino Unido e China. Outros se reúnem para ocupar uma das 25 cadeiras, de forma a representar os 189 membros.

A constituency em que o Brasil está tem nove países: Brasil, Colômbia, Suriname, Trinidad e Tobago, Haiti, Filipinas, Panamá, Equador e República Dominicana. Juntos, têm menos de 4% do capital do banco. A cadeira reúne países não por região, mas pelo espaço que cada país pode ter e ser representado. A maneira da cadeira existir é congregar interesses suficientes para aglutinar países. A parcela do capital do Brasil na constituency representa mais de 50%. Então, ele sozinho elege o diretor-executivo.

Há um acordo até 2028 dentro do grupo de que o Brasil sempre ocupa o cargo de diretor-executivo, até por ter mais de 50% do capital preponderante entre estes países, e as Filipinas ocupam sempre o de vice-diretor, ou alterno.

O diretor-executivo é o braço direito dos governadores, papel exercido no Brasil pelo ministro da Economia.

Cargo técnico ou diplomático?

Tem um requisito técnico, já que você não conseguiria se posicionar sem o embasamento técnico. Mas o diretor-executivo da cadeira tem que ter a capacidade de somar, ampliar a voz, negociar. Ou aquele governo perde importância ou não terá importância nenhuma. Ele precisa ser parte de negociações e negociar para conseguir lograr as metas do seu país. Tem que ter um discurso de persuasão.

Simpatia pessoal conta em muitos momentos. O lado diplomático é muito importante. No conselho, são 25 cadeiras representando 189 países, com visões divergentes em relação aos temas e com seus interesses. Um membro dessa cadeira não tem a capacidade de ditar o resultado do processo. Por isso, há uma cultura da busca do consenso sempre. Raríssimas vezes se vai para o voto aberto.

Ao contrário do FMI, em que os temas são, em grande parte, econômicos, o Banco Mundial leva em suas salvaguardas temas como desigualdade entre gêneros, mudanças climáticas, educação, saúde, racismo e proteção de povos indígenas.

Proteção de povos indígenas? O ministro falou que não “suporta” o termo em reunião recente.

Está no conjunto de salvaguardas do Banco Mundial e, mesmo sem estar implícito, os projetos aprovados precisam estar de acordo, sem conflito com estes tópicos. Como uma espécie de “compliance”.

Recentemente, um ponto acertado, que foi bastante polêmico, é o que determinou apoio a projetos em que haja consulta prévia a povos indígenas que sejam impactados por um projeto. Não há como ser contra este ponto.

O mandato termina em outubro ou novembro?

O atual mandato começou em 2018 e termina agora. Em outubro, há uma nova eleição. Tenho a informação de que o Ministério da Economia enviou já a carta pedindo que os demais países aceitem o nome do novo indicado até outubro. Lá, ele manda uma nova carta pedindo que os países votem no nome indicado pelo Brasil para o novo mandato. Estes temas são, em geral, resolvidos internamente, como um “gentlemen’s agreement”.

De qualquer forma, o Brasil teria mais de 50% do peso na votação. O que outros países insatisfeitos podem fazer é sair da constituency e se juntar a outra. A partir do momento em que é eleito, o diretor-executivo não pode ser removido pelo seu país. O posto passa a ser dele, até o final do mandato.

VIA G1
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