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Acácio Miranda – Impeachment: Para quem?

Não é segredo que vivemos um momento de profundas divisões políticas (prefiro o termo “política” ao termo ideológica, porque este segundo pressupõe

Acácio Miranda – Impeachment: Para quem?
Acácio Miranda – Impeachment: Para quem?

Redação Publicado em 18/05/2020, às 00h00 - Atualizado às 09h03


Impeachment: Para quem?

Não é segredo que vivemos um momento de profundas divisões políticas (prefiro o termo “política” ao termo ideológica, porque este segundo pressupõe racionalidade e debates construtivos acerca de opiniões antagônicas, o que realmente não tem acontecido).

E um dos grandes reflexos desta divisão é a proliferação – e a popularização – dos pedidos de impeachment, numa verdadeira demonstração que a refutação das opiniões divergentes foi levada ao último patamar da irracionalidade, onde a derrota nas urnas, ou na construção de ideias, não merece ser tolerada.

E mais do que isso: há a nítida demonstração que o impeachment, um instrumento criado para o fortalecimento da democracia, vem sendo usado com finalidades opostas a esta, uma vez que os pedidos para a instauração de processos que levam a esse são feitos exatamente para fazer calar as vozes dissonantes, fazendo prevalecer uma única ideia e eliminando as demais.

Sim, eliminando!

A título de exemplo, foram noticiados nos últimos dias pedidos de impeachment em face do Presidente da República, Governadores de alguns estados e até dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.

Sem adentrar ao mérito de cada um deles, vale frisar que a Constituição Federal consagra, em seu artigo 85, as hipóteses que fundamentam referido pedido em relação ao Chefe do Executivo Federal e, por simetria, se estende aos demais chefes dos executivos e aos Ministros da Corte Suprema.

E este é o ponto crucial da discussão: há a taxatividade das hipóteses que fundamentam referido pedido, e qualquer circunstância fora destas desta é mero “jus esperniandi”[1].

Em relação aos pedidos divulgados pela mídia, duas merecem análise um pouco mais aprofundada.

O do Governador de São Paulo, feito por deputados estaduais, a pretexto que este dissera que “poderia prender quem desrespeitasse a quarenta”.

Este causa espécime por duas razões óbvias: 1) o crime de desobediência, consagrado por uma lei federal, permite essa possibilidade, portanto o pedido de impedimento se faz em virtude de uma possibilidade admitida por lei desde 1940; 2) o pedido não guarda qualquer similitude com as hipóteses previstas no artigo 85, da CF.

No que diz respeito aos vários pedidos, contra alguns dos Ministros do STF, juridicamente, estes são ainda mais complicados, uma vez que a própria Constituição Federal guarda a independência funcional destes, e, por mais polêmicas que sejam as suas decisões, sempre são embasadas em elementos jurídicos sólidos, em virtude de aspectos interpretativos.

Em resumo: opiniões divergentes devem ser rebatidas com argumentos, tudo o que for diferente disso, entra na seara da gritaria!

[1] Piada jurídica que equivale ao termo choradeira.

Acácio Miranda é Advogado e Analista Político. Doutorando em Direito Constitucional (IDP/DF); Mestre em Direito Penal Internacional – Universidade de Granada/Espanha. Pós – Graduações: Direito Penal – Universidade de Salamanca/Espanha; Direito Penal Econômico – Coimbra/IBCCRIM; Direito Penal Econômico – Universidade Castilha La – Mancha/Espanha; Direito Penal – Escola Superior do Ministério Público de São Paulo; e Processo Penal – Escola Paulista da Magistratura. Tem cursos de extensão na Universidade de Gottingen (Alemanha) e Pompeu Fabra (Espanha).

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