O enredo de um entendimento no estilo toma lá dá cá entre o ministro relator do caso do auxílio-moradia de magistrados, Luiz Fux, e o presidente da República
Redação Publicado em 27/11/2018, às 00h00 - Atualizado às 14h37
O enredo de um entendimento no estilo toma lá dá cá entre o ministro relator do caso do auxílio-moradia de magistrados, Luiz Fux, e o presidente da República consumou-se ontem, com a sanção, por Michel Temer, do inapropriado aumento de 16,38% concedido aos magistrados , com repercussões ruinosas sobre as finanças de toda a Federação. Assim como fora combinado, Fux revogou liminar concedida por ele próprio que estendia o auxílio-moradia a todos magistrados , tivessem ou não casa própria. Mas com o devido cuidado de estabelecer a vigência da decisão para janeiro, quando entrará em vigor o aumento de 16,38%. Toma lá dá cá.
Toda essa barganha inadequada do ponto de vista fiscal, ruim para a imagem do Supremo e de todo o Judiciário, serve ao menos como uma demonstração de fácil entendimento para o presidente eleito, Jair Bolsonaro, sobre o que o espera no Planalto.
Enquanto faz escolhas corretas na montagem de uma equipe que enfrentará a maior crise fiscal de que se tem notícia no país, o futuro presidente pode observar a agilidade com que corporações de castas do serviço público se movimentam dentro do Estado em defesa de seus interesses.
Não está em discussão a necessidade de altos servidores do Executivo e do Judiciário ou representantes do povo no Legislativo terem remuneração condigna. O inaceitável é a concessão de um reajuste de alto impacto nas contas públicas no momento em que elas continuam em déficit, e numa fase de transição de governo.
Nas aparências, parece razoável aprovar-se o reajuste enquanto acaba-se com o auxílio-moradia para todos.
Sem falar de aspectos legais, no mundo dos números frios é uma barganha em que o Erário continua no prejuízo: a União terá de gastar mais R$ 717 milhões anuais com a folha da Justiça federal, enquanto o corte do auxílio-moradia poupa apenas R$ 333 milhões. E como a remuneração de ministro do Supremo é o teto de todo o funcionalismo público, o impacto do reajuste nas finanças do Estado brasileiro, em todos os níveis, é de R$ 4 bilhões por ano. Sendo que o déficit público primário (sem considerar juros da dívida) continua acima de R$ 100 bilhões por ano, algo insustentável. Se e quando vier a conta em forma de inflação, a maior parte dela será paga pela população de renda mais baixa, como sempre.
Toda esta manobra fica mais inconcebível quando se considera que magistrados e políticos barganharam salários mesmo com indicações técnicas de que o acordo fere a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2019, por não haver nela previsão da despesa. Agride portanto a Lei de Responsabilidade Fiscal e a própria Constituição. Mais um forte motivo para o assunto ter ficado em suspenso.
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