Marcus Vinicius de Freitas
Redação Publicado em 16/12/2020, às 00h00 - Atualizado às 08h49
Marcus Vinicius de Freitas
Durante algum tempo se apregoou o legado positivo do Presidente Lula na projeção internacional do Brasil. Citavam-se, como exemplos, o BRICS – sobre o qual a influência de Lula foi pífia –, a Copa do Mundo e as Olimpíadas, além das eleições do Diretor Geral da Organização Mundial e Comércio e do Diretor Geral da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO).Muito se comemorou esse ativismo brasileiro no cenário global, que até foi bem recebido noscírculos internacionais que esperam, há décadas, que o Brasil deixe de comportar-se como um anão diplomático.Talvez o episódio mais emblemático desse período foi um encontro de Barack Obama com o então presidente, Lula, em que o norte-americano, de modo efusivo, afirmou que Lula “é o cara” e “o político mais popular do mundo”. Desconsiderou Obama o enorme câncer da corrupção que ocorria no Brasil e que beneficiou a alguns como “nunca antes na história do País”.
O Brasil, no entanto, por um posicionamento ideológico equivocado, na época, persistiu numa quantidade inumerável de erros: o Mercosul como mercado comum e não como área de livre comércio, o apoio à ditadura Castrista e ao Bolivarianismo Venezuelano, o silêncio no genocídio de Bashar Assad na Síria, a propagação dacorrupção brasileira além-mar, através das empreiteiras e das outras campeãs nacionais. Tais erros estratégicos reduziram em muito o pouco da importância alcançada. Tudo isto ocorreu porque se confundiu política externa com política partidária e ideológica.
Esperava-se do governo atual uma mudança de rumo, uma visão mais pragmatistana Política Externa. No entanto, os erros praticados no passado continuam sendo praticados no presente, só que com o sinal trocado. O Brasil, ao invés de engradecer-se, apequena-se internacionalmente, ao persistir na tecla ideológica e não a pragmática.
Vivemos dias turbulentos e imprevisíveis nas Relações Internacionais. Há umatentativa confusa de criar umaguerra fria entre os Estados Unidos e China, além de uma pandemia global que tem sido avassaladora para os países ocidentais que, simplesmente, não conseguem desenvolver políticas efetivas de combate à Covid-19. Notamos uma prevalência de imponderáveis, como a saída britânica da União Europeia e o desengajamento dos Estados Unidos no cenário global. E vemos uma China que tem crescido, firme e estável, num cenário que lhe tem sido extremamente hostil. Tais situações, ocorrendo simultaneamente, representam grandes desafios e muitas oportunidades. É necessário realinhar perspectivas, estratégias e alianças, com inovação e criatividade para que o Brasil consiga, de fato, transformar-se num ator global de relevância.
Dos desafios globais que enfrentamos, por certo, a desindustrialização constitui uma realidade nova e perene– que não afeta somente o Brasil – com um enorme impacto na questão do desemprego, que tenderá a aumentar nos próximos anos. É essencial ao Brasil, para manter qualquer relevância no cenário global, agregar valor efetivo e intelectual àquilo que faz bem e não cair nos devaneios de políticas industriais para competir em áreas em que não possui competitividade. Ao agregar valor àquilo que produz bem, o Brasil assegurará os recursos necessários para dar saltos qualitativos em outras áreas.
Um grande desafio que o Brasil enfrentará, nos próximos anos, é o equidistanciamentoestratégico quanto aos Estados Unidos e à China. O declínio norte-americano decorre do processo histórico e natural em que potências ascendem e declinam. O maior desafio é saber se esta transição será pacífica. O Brasil deve compreender a sua posição estratégica como parceiro da China e construir uma agenda bilateral de sinergias, a fim de que haja um nível cada vez maior de investimentos e de aprofundamento econômico. É preciso abandonar a arrogância de dizer que a China depende do Brasil para se alimentar. Isto não é verdade. A balança comercial dos produtos agrícolas exportados comprova isto. É preciso tratar a China como parceira e não como cliente. Isto não significa relevar os Estados Unidos como parceiro histórico, mas sim alinhar-se àquilo que se configura como realidade futura.
O Brasil-potência precisa investir mais na sua indústria cibernética e bélica para conseguir maior projeção global. Também precisa reformular e atualizar a estrutura do próprio Itamaraty, que precisa ser modernizado em sua forma de recrutar e treinar o pessoal contratado, além da necessidade de realinhar o número de missões pelo mundo, reagrupando e realocando pessoal conforme as perspectivas de longo prazo do Estado Brasileiro.
O maior desafio que temos à frente é uma discussão efetiva quanto àquilo que o Brasil pretende oferecer como potência global. É fundamental ao País ter uma agenda clara de seus objetivos, interesses e alianças. Épreciso saber fazer as escolhas conforme os interesses do País e não baseados na ideologia do dia. Ser anão jamais deveria ser uma realidade ou opção para o Brasil.
Marcus Vinicius de Freitas
Advogado e Professor Visitante, Universidade de Relações Exteriores da China
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