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TJSP suspende contrato de R$ 22,6 bilhões prorrogado sem licitação pelo Governo Doria

Por Jair Viana

TJSP suspende contrato de R$ 22,6 bilhões prorrogado sem licitação pelo Governo Doria
TJSP suspende contrato de R$ 22,6 bilhões prorrogado sem licitação pelo Governo Doria

Redação Publicado em 11/06/2021, às 00h00 - Atualizado às 11h18


O Desembargador Marrey Uint suspendeu liminarmente a farra da prorrogação de contrato da Metra sem licitação. A empresa explora serviços de transporte metropolitano há 25 anos na região e teve renovada a concessão bilionária até 2046. A decisão também fixou prazo máximo de dez anos, no caso da Metra vencer nova licitação.

Por Jair Viana

Um contrato bilionário prorrogado pelo governador João Doria (PSDB), foi suspenso por uma liminar do Tribunal de Justiça Paulista por violar a Constituição Federal e a lei de licitações. O contrato que envolve R$ 22,6 bilhões foi prorrogado mantendo como concessionária a Metra Sistema Metropolitano de Transportes, que explora o serviço de 1997.

O contrato tem como objeto o corredor de ônibus estilo BRT que vai ligar a rede metroviária da capital às cidades de Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul, no ABC Paulista. A obra, contratada sem nova licitação, está no rol das promessas de campanha do governador Doria.

Na decisão que suspendeu o contrato, o Desembargador Marrey Uint explica: “Embora este Relator, em primeiro momento, tenha atinado com a legitimidade formal dos atos administrativos adotados com o objetivo de manutenção do serviço de transporte coletivo no Estado de São Paulo (a fim de evitar solução de continuidade), fato é que, em avanço criterioso ao conteúdo do artigo 175 da CF e à lei de regência e princípios informativos do direito administrativo, bem como em contraste à legislação estadual, não é possível que se realize prorrogação do contrato de parceria público-privada por período superior ao limite legal estabelecido no artigo 5º, I, da Lei nº 11.079/2004, suprimindo a realização de procedimento licitatório próprio”.

Em outro trecho da decisão, Uint observa que o contrato já se arrastava de longa data e sua prorrogação não tem respaldo legal. “Cumpre notar que, em breve histórico, a empresa privada Metra – Sistema Metropolitano de Transportes Ltda. possui a concessão de uso do sistema viário de transporte coletivo intermunicipal por ônibus e trólebus no Corredor Metropolitano São Mateus/Jabaquara, derivada de contrato administrativo lavrado em 1997 (Contrato de Concessão EMTU/SP nº 020/1997), sob a égide da então Lei Geral de Licitações nº 8.666/1993 e, em específico, da Lei de Concessões nº 8.987/1995.”, diz.

O projeto foi iniciado no governo Geraldo Alckmin (PSDB) levando o metrô até o ABC Paulista, o que se daria por um monotrilho. O projeto original chegou a ser assinado em 2018, mas nunca saiu do papel. A obra seria executada pela Metra Sistema Metropolitano de Transportes, empresa que opera a rede de trólebus que já existe no ABC, ligando Santo André, São Bernardo e Diadema até a Estação Jabaquara, da Linha 1-Azul do Metrô.

Em março, o Governo de São Paulo assinou um novo termo aditivo ao contrato de concessão da empresa, que se arrastava há 23 anos. Por um prazo adicional de 25 anos, a Metra levou, sem processo licitatório, a continuidade da concessão existente que resultou no monopólio do transporte intermunicipal de ônibus nas sete cidades que compõem o ABC, que têm 2,5 milhões de habitantes, e o direito de construir e operar o BRT.

A empresa que vencer a futura licitação ficará com a receita vinda da venda das passagens do transporte e poderá explorar comercialmente os terminais rodoviários que gerenciar. Em troca, além de requalificar o trólebus existente, terá de viabilizar o prometido BRT – obra estimada em R$ 860 milhões, a ser executada integralmente pela Metra.

A Metra, que tem no comando em empresário João Antonio Setti Braga, um dos empresários de ônibus do ABC que, em 2002, tem um histórico de cheio de problemas. Setti Braga chegou a admitir pagamento de R$ 2,5 milhões, cerca de R$ 7,1 milhões, em propinas à Prefeitura de Santo André, na gestão de Celso Daniel (morto em janeiro daquele ano), para operar na cidade. Ele não chegou a ser indiciado. Decreto publicado por Doria, ainda em março, previu que a empresa poderia usar o contrato do Governo como garantia no sistema bancário para contrair financiamentos para a empreitada.

DEZ ANOS – Para o desembargador Marrey Uint, esticar a vigência do prazo contratual até 2046 não encontra amparo legal. “… embora já vigente o contrato de concessão celebrado inicialmente por 25 anos, a ele deve se aplicar a regulamentação global constante do artigo 5º, I, da Lei 11.079/2004, a fim de que não se estenda de maneira desproporcional no tempo: Art. 5º As cláusulas dos contratos de parceria públicoprivada atenderão ao disposto no art. 23 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, no que couber, devendo também prever: I o prazo de vigência do contrato, compatível com a amortização dos investimentos realizados, não inferior a 5 (cinco), nem superior a 35 (trinta e cinco) anos, incluindo eventual prorrogação; (…). (grifos nossos) Em vigência por período superior a 20 anos, a concessão alcançará seu prazo inicial em 2022, aos 25 anos, e, portanto, o contrato poderia ser prorrogado, observadas suas disposições internas, por apenas por mais 10 anos.”

O governo afirma que optou por esse modelo para viabilizar a obra porque “apresentou-se como de maior vantagem em benefício da população”. A decisão foi aprovada pelos Conselhos de Desestatização e do Programa Estadual de PPPs.

Entendendo que a suspensão do contrato não oferece prejuízo ao Estado, o desembargador Marrey Uint acatou o pedido do empresário Alceni Salviano da Silva, concedendo a tutela antecipada, suspendendo a renovação do contrato da Metra com o governo paulista até o julgamento do mérito.

O Diário não conseguiu posição do Governo e da empresa sobre a decisão do Tribunal de Justiça.

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