Dos R$ 400 milhões de um fundo criado para indenizar o dano moral coletivo causado pela tragédia em Brumadinho, em Minas Gerais, R$ 119,3 milhões já tiveram
Redação Publicado em 09/05/2022, às 00h00 - Atualizado às 17h26
Dos R$ 400 milhões de um fundo criado para indenizar o dano moral coletivo causado pela tragédia em Brumadinho, em Minas Gerais, R$ 119,3 milhões já tiveram destinação. O repasse desse montante pela mineradora Vale foi definido em acordo firmado em julho de 2019 com o Ministério Público do Trabalho (MPT). Pouco menos de três anos após a assinatura do acordo, os projetos aprovados até o momento consumiram quase 30% do total, conforme divulgado pelo MPT na semana passada.
A maior parte dos recursos está sendo aplicada prioritariamente em projetos de preservação da vida, nas áreas de saúde e de segurança alimentar.
A movimentação do dinheiro depende de aval do conselho gestor do fundo, composto por representantes do MPT, do Tribunal Regional do Trabalho (TRT-MG), da Defensoria Pública da União e da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem da Mina Córrego do Feijão (Avabrum). As instituições e os parentes dos mortos autorizaram a liberação de R$ 54 milhões para estruturar instituições da área da saúde nos municípios, o que representa cerca de 45% dos R$ 119,3 milhões que já tiveram destinação.
Os recursos beneficiaram hospitais, casas de saúde e instituições de pesquisa com a realização de reformas, financiamento de estudos, ampliação de leitos e aquisição de equipamentos. Um exemplo foi o Hospital da Baleia, instituição filantrópica de Belo Horizonte, que é referência em diversas áreas, cujo centro de nefrologia foi reformado e teve ampliada a capacidade de atendimento.
O foco na saúde começou a ser desenhado em 2020, com o início da liberação dos recursos do fundo. As primeiras liberações foram voltadas para ações de enfrentamento à covid-19: R$ 38 milhões foram divididos entre 11 prefeituras, incluindo a de Belo Horizonte e as de cidades afetadas pelo rompimento da barragem, como Brumadinho, Betim, Mário Campos, São Joaquim de Bicas, Pará de Minas, Paraopeba, Caetanópolis, Jeceaba, Sarzedo e Curvelo. Outros 14 municípios receberam R$ 5,5 milhões.
No ano passado, o comitê gestor avaliou que o cenário de pandemia trouxe implicações socioeconômicas para a população de tais localidades e aprovou a destinação de R$ 22 milhões para ações de combate à fome. Os maiores beneficiados foram os projetos Prato Cheio, do Serviço Social do Comércio (Sesc), e Comunidade Viva Sem Fome, fruto de parceria entre as organizações não governamentais (ONGs) Cáritas e AIC Agência Solidária.
Foram liberados ainda cerca de R$ 40 milhões para ações de qualificação de trabalhadores e geração de emprego e renda; proteção de indígenas, idosos e crianças; educação e preservação da memória para que a tragédia de Brumadinho não caia no esquecimento. Ocorrida em 25 de janeiro de 2019, a tragédia foi causada pela ruptura de uma barragem da mineradora Vale, que deixou 270 mortos e provocou degradação ambiental em diversos municípios mineiros na bacia do Rio Paraopeba. A maioria das vítimas eram funcionários da própria mineradora ou de empresas terceirizadas contratadas para prestar serviços na mina em Brumadinho.
A criação do fundo de recuperação, no valor de R$ 400 milhões, foi parte de um acordo para indenizar parentes dos trabalhadores mortos. O acordo levou ao encerramento de uma ação civil pública movida pelo MPT logo após a tragédia. Além do montante para indenização do dano moral coletivo, ficou estabelecido no acordo que pais, cônjuges ou companheiros e filhos das vítimas receberiam, individualmente, R$ 500 mil por dano moral, e os irmãos, R$ 150 mil cada um. Além disso, a título de dano material, a Vale deve pagar pensão mensal aos familiares que dependiam financeiramente da vítima.
Os dependentes de cada vítima deveriam receber ao menos R$ 800 mil, ainda que o cálculo fique abaixo desse valor. Foram previstos também benefícios como plano de saúde, auxílios-creche educação. A adesão, no entanto, era opcional. Quem discordasse dos valores poderia mover ação judicial individual. No ano passado, representantes da Avabrum chegaram a verbalizar algumas críticas ao processo de negociação e aos termos do acordo. “Não dá para dizer que a situação está apaziguada com as famílias”, afirmou, na ocasião, Andresa Rodrigues, vice-presidente da entidade.
Esse fundo não tem, entretanto, relação com o maior acordo de reparação da tragédia, que foi assinado em fevereiro de 2021 entre a Vale, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), o Ministério Público Federal (MPF) e o governo mineiro, que definiu o valor de R$ 37,68 bilhões para indenização dos danos coletivos. Entraram no acordo medidas que incluem investimentos socioeconômicos, projetos de recuperação socioambiental, de garantia de segurança hídrica, de melhoria dos serviços públicos e obras de mobilidade urbana.
Conforme ficou acertado, o uso de parte do montante global também deveria ser definido com a participação dos atingidos pelo rompimento da barragem de rejeitos. Um total de R$ 4 bilhões foi assegurado a projetos para Brumadinho e para 25 municípios da bacia do Paraopeba afetados pelo acidente.
Do valor total, 15% são para a chamada “resposta rápida”, que envolve demandas mais urgentes apontadas pelos municípios, entre as quais ações de recuperação ambiental e de qualificação profissional; iniciativas para fortalecimento das redes de saúde e de atenção psicossocial; manutenção de estradas e fomento à produção agrícola. Brumadinho, particularmente, recebeu recursos para desenvolver um plano de criação do distrito industrial e para ampliar a conectividade digital no município.
Para os 85% restantes, que somam R$ 3,4 bilhões, é exigida apreciação popular. Em outubro do ano passado, o governo de Minas Gerais e o Ministério Público do estado lançaram consulta pública obre a questão. Em novembro, a população foi convocada a votar entre 3.114 propostas de projetos apresentados pelas prefeituras e pelas assessorias técnicas que dão suporte às vítimas da tragédia. A votação foi feita por meio da internet e de um aplicativo para celulares. Estavam aptos a participar os 734 mil eleitores dos 26 municípios atingidos.
O resultado foi divulgado em uma plataforma criada especificamente para esse fim. Segundo a Vale, a consulta mobilizou mais de 10 mil pessoas. O Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), porém, apontou limitações e avalia que não foi um processo de participação efetiva, o que exigiria, além da votação, a construção de propostas e pleno diálogo com a população.
As propostas mais votadas já estão saindo do papel. Entre medidas autorizadas pelo governo mineiro e pelo MPMG, estão a instalação de um novo pelotão do Corpo de Bombeiros em Brumadinho e a ampliação do Hospital Público Regional de Betim. Há também projetos que envolvem construção de viaduto, pavimentação de vias, aquisição de veículos para transporte escolar, reforma de creches, melhoria de gestão de resíduos sólidos, além de obras de saneamento básico.
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Agencia Brasil
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