Joel Orellana, psicanalista de 51 anos, vive em Pinheiros, um dos bairros nobres de São Paulo. O preço do metro quadrado dos imóveis nesse canto da Zona Oeste
Redação Publicado em 19/11/2021, às 00h00 - Atualizado às 07h22
Joel Orellana, psicanalista de 51 anos, vive em Pinheiros, um dos bairros nobres de São Paulo. O preço do metro quadrado dos imóveis nesse canto da Zona Oeste beira os R$ 12 mil.
O apartamento em que ele mora tem cinco quartos e dois banheiros. Um levantamento feito pela Urbit estima que, nessa região, o valor de venda para empreendimentos como esse é de R$ 2,3 milhões, a quinta maior média da cidade.
Mas Orellana não é o proprietário do apartamento milionário. O chileno que chegou a São Paulo há 24 anos compartilha o espaço com outras cinco pessoas. O valor do aluguel? R$ 1,2 mil por um quarto de 9m², que é seu único espaço privado no imóvel.
Se antes essas moradias eram conhecidas como “repúblicas” e abrigavam apenas universitários de outras cidades, hoje também são conhecidas como “colivings” e acolhem pessoas com mais de 30 anos, separados e até executivos que querem morar na porta do metrô.
Os antigos cortiços e pensões seguem firmes abrigando trabalhadores informais, a maioria no Centro.
“Na hora que precisa diminuir o custo de transporte, você procura localizações mais centrais, mais próximas do trabalho e do lazer. Essas terras começam a ficar cada vez mais disputadas, um dos fatores do aumento do preço do aluguel”, explicou Isadora Guerreiro, pesquisadora do LabCidade e docente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP).
“Não é normal [pagar R$ 1,2 mil de aluguel por um quarto], de jeito nenhum. Isso mostra um descolamento dos preços imobiliários do salário das pessoas de todas as classes sociais”, afirmou Guerreiro.
O dormitório de Joel comporta uma cama, duas mesinhas de cabeceira, duas cadeiras e um pequeno guarda-roupas, que é suficiente para acomodar sua história de vida nos últimos quatro anos.
Antes disso, ele vivia com a esposa e os dois filhos – de 14 e 17 anos – em uma casa na Zona Norte da capital, mas o casamento chegou ao fim e ele teve a primeira experiência com casas compartilhadas.
Foi em 2017, no quarto de um amigo em uma escola de psicanálise de Taboão da Serra, na Grande São Paulo. Depois de um ano, optou pelo centro expandido de São Paulo.
“Tem quarto de R$ 1,9 mil na Vila Olímpia, estão pedindo R$ 2,4 mil, estão loucos. Já acho R$ 1,2 mil completamente fora da realidade”, apontou Joel.
“Eu ia sair daqui, ir para um apartamento pequeno ali no Centro, uma kitnet, mas eu optei pela região. Embora seja caro, aqui atende em outros aspectos”, afirmou.
Com o valor que paga pelo quarto em Pinheiros, Joel poderia, por exemplo, ter escolhido um espaço privativo em Santana, bairro em que fica seu consultório, mas a segurança e a mobilidade são fatores que o seduzem.
“Aqui tem de tudo: culinária, rua cheia de bares, e tudo a dois quarteirões da minha casa. Na Zona Norte, se eu colocar mais uma graninha, [consigo um espaço individual], mas não gosto do ambiente, acho perigoso”, explicou.
Apesar de algumas facilidades proporcionadas pela boa localização, Orellana diz que é “esquisito” morar com outras pessoas que não sejam de sua família.
“Vira e mexe, acontecem algumas coisas mais estranhas, alguém pegar alguma coisa sua, mas eu fui fazendo meu espaço. Negociar é a chave”, ponderou. “São dois banheiros para seis pessoas”.
“É uma cidade caótica. Os preços são totalmente fora da realidade. Ainda mais em um contexto de escassez. Há pouco trabalho, pouco dinheiro, os preços de serviços vão aumentando e o aluguel acompanha, né”, disse ele.
Assim como Joel, a vendedora Patrícia Gusmão também paga R$ 1,2 mil pelo aluguel de um espaço em Pinheiros. “O meu quarto é, na verdade, uma divisão da sala separada por um drywall”, explicou.
“É bem tortuoso morar em uma casa compartilhada. Família já é loucura, imagina no Big Brother, com gente que você não conhece”, brincou ela.
Morando no endereço há cinco meses, Gusmão disse que não foi uma opção. Durante três anos, compartilhou um apartamento com uma amiga e precisou entregar o imóvel em razão da pandemia. “Mas já estou em vista de sair para um outro lugar”.
“Estou vivendo uma situação difícil neste momento. Há pessoas complicadas, uma senhora é viciada em bebidas alcoólicas, toda noite chega bêbada, já causou algumas vezes. Não existe um controle de frequentador. Tem um risco quando você deixa as outras pessoas trazerem quem quiser para dormir”, pontuou.
A única vantagem é a região, segundo Patrícia. “Eu acho que é muito para um quarto, mas tem a localização. Eu posso morar numa área um pouco mais períférica e sozinha, por um preço mais em conta, mas, de repente, tenho um preço maior com transporte”.
No Facebook, há dezenas de grupos compostos por milhares de pessoas que oferecem espaços e que estão em busca de um cantinho para chamar de seu.
A diversidade nos anúncios é grande: há quartos amplos em bairros nobres, quartos pequenos em bairros afastados do centro expandido, cômodos compartilhados e individuais. O preço varia de acordo com as características.
Um quarto compartilhado entre seis pessoas na Zona Leste de São Paulo, por exemplo, pode custar R$ 450 (veja na foto abaixo).
Também há espaços individuais pela mesma faixa de preço, mas com menor metragem, sem janela ou guarda-roupas. Na imagem abaixo, um quarto individual no bairro da Liberdade, na região central da capital, custa R$ 500 por mês.
Para quem quiser – e puder – pagar um pouco mais, há opções como esta da foto abaixo. Um quarto individual próximo à Avenida Paulista pela bagatela de R$ 1.850.
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