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Aborto nos Estados Unidos. Pode ou não?

Casa Branca. - Imagem: Reprodução | Pixabay
Casa Branca. - Imagem: Reprodução | Pixabay
Dennis Munhoz

por Dennis Munhoz

Publicado em 17/04/2024, às 09h05


Muitas vezes estamos acostumados a rapidamente responder utilizando “informações” que recebemos sem conferir a origem ou veracidade. Durante muitos anos, principalmente quando a discussão sobre o assunto Aborto volta à tona no Brasil, muitos simpatizantes da liberação usam o exemplo dos Estados Unidos, terra da liberdade, onde o aborto é “liberado” para fortalecer sua posição.

A questão é bem mais delicada e complexa que imaginamos.

Inicialmente devemos raciocinar lembrando que a autonomia constitucionalmente atribuída aos Estados aqui nos Estados Unidos é muito mais ampla que a existente no Brasil.O poder dos Estados decidirem sobre vários assuntos é muito grande, inclusive sobre pena de morte. Logicamente que sobre assuntos pela Constituição e legislação federal, os Estados ficam restritos a pequenas ou quase inexistentes alterações.

A Constituição norte-americana não faz menção ao aborto, não proíbe mas também não libera. Caso houvesse esta determinação os Estados estariam submetidos a ela.

A Suprema Corte dos Estados Unidos, equivalente ao Supremo Tribunal Federal no Brasil, em decisão histórica do ano de 1.973, caso amplamente conhecido como Roe contra Wade, no qual foi decidido que a Constituição dos Estados Unidos deveria proteger a liberdade individual das mulheres e garantir a possibilidade de fazer o aborto sem restrição do Governo. O caso se arrastou por vários anos e Jane Roe deu à luz a uma menina, encaminhando-a para a adoção vez que o processo ainda não havia terminado.

Esta decisão obrigou a modificação ou até extinção de leis federais e estaduais que proibiam o aborto. Esta discussão arrastou-se por décadas, principalmente no que diz respeito de quando ocorreria o aborto, até quantas semanas de gravidez seria aceitável ou não. Logicamente que muitas variações legais ocorreram entre os Estados mais conservadores e liberais, a sociedade sempre discutiu o assunto e as pesquisas de opinião pública até o ano de 2.022 apontavam ligeira vantagem para aqueles que apoiavam a liberação em todos ou na maioria dos casos.

Inesperadamente em julho de 2.022, a Suprema Corte, formada por maioria conservadora, seis dos nove juízes têm este posicionamento, decidiu que o aborto não é mais direito constitucional, anulando a histórica decisão de 1.973, quase 50 anos depois. Cumpre salientar que esta decisão não criminaliza ou proíbe o aborto, mas dá total liberdade aos Estados para regular sobre o assunto.

As restrições ao aborto têm aumentado no país, entre a proibição e restrição da sexta a vigésima sexta semana. Dos 50 Estados, 26 adotam este procedimento, ou seja, a maioria já proíbe ou estipula condições restritivas. Em muitos destes Estados as decisões estão sendo questionadas judicialmente, mas o assunto voltou à tona esta semana em função da afirmação do candidato e ex-presidenteDonald Trump que caso fosse eleito não assinaria proibição federal ao aborto. Para muitos esta declaração foi surpreendente já que ele está fortemente ligado à ala mais conservadora e à direita do Partido Republicano que defende a proibição. O atual Presidente, Joe Biden tem se manifestado insistentemente contra a mais recente decisão da Suprema Corte, inclusive pedindo à equipe jurídica da Casa Branca estudo sobre a viabilidade de legislação federal para regular o assunto. Até aí nenhuma surpresa, mesmo porque boa parte dos eleitores do atual Presidente são liberais e apoiam o aborto.

O caso que reacendeu a discussão e colocou ainda mais lenha na fogueira foi a decisão da Suprema Corte do Estado do Arizona, que reativou lei do século 19 para proibir o aborto em qualquer hipótese, provocando a declaração do ex-presidente Donald Trump afirmando que o Estado do Arizona foi longe demais ao proibir o aborto com base em lei de 1864.

Este é assunto bem delicado, principalmente em ano eleitoral já que teremos eleições em novembro e a disputa está muito equilibrada, ninguém quer se indispor com o eleitor e prefere não se aprofundar muito no assunto. Trump já recuou um pouco e está passando a responsabilidade para a legislação estadual, enquanto o Presidente Biden mantém sua postura liberal sem agredir os eleitores mais conservadores. Pelo que tudo indica a liberação, proibição, restrições e outros detalhes ficarão à exclusivo critério dos Estados, mesmo porque a atual composição da Suprema Corte é conservadora não revisará a decisão de 2.022 tão cedo.

Se a mulher reside em um Estado onde há proibição ou restrição ela pode fazer o aborto em outro Estado, logicamente envolvendo custos, cobertura do sistema de saúde e toda logística.

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