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COLUNA

Lei Federal nº 14.133/2021: planejar é a resposta

Vivenciamos as “últimas horas” da Lei Federal nº 8.666/1993, da Lei Federal nº 10.520/2002 e do Regime Diferenciado das Contratações. Mas afinal, haverá uma transformação no cenário das contratações públicas?

Lei Federal nº 14.133/2021: planejar é a resposta - Imagem: Freepik
Lei Federal nº 14.133/2021: planejar é a resposta - Imagem: Freepik

Rogério Auad Palermo, Cláudia Klocke Ghini e Jorge Okumura Adriano Bosco Okumura Publicado em 29/08/2023, às 06h18


A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos – Lei Federal nº 14.133/2021 – foi editada com o propósito de trazer maior efetividade para as contratações públicas. Muito embora se trate de uma norma procedimental e maximalista, assim como as que a antecedem, ela inova em diversos aspectos, apresentando novos parâmetros a serem observados na condução dos procedimentos licitatórios.

Dentre eles, o planejamento é aquele que merece uma posição de destaque. E não é à toa. O novo diploma o promoveu a um princípio – artigo 5º – e o introduziu como um elemento basilar para o alcance dos objetivos da licitação, para a implementação da governança nas contratações e para a obtenção dos resultados pretendidos com a execução dos contratos, que, frise-se, sempre deverá ser o alcance do interesse público.

E nesse tema a intenção do legislador deve ser reconhecida – ainda que o texto legal esteja permeado de inconsistências e até mesmo eventuais inconstitucionalidades. Entender que o planejamento é o pilar para toda e qualquer contratação, seja ela pública ou privada, é o primeiro passo para que o caminho das licitações venha a ser traçado de maneira diversa daquela vivenciada nas últimas décadas.

Somado a isso, há que se ressaltar que o ato de planejar, em que pese se tratar de um exercício bastante raro no cenário da Administração Pública, ainda mais se avaliado na realidade dos Municípios brasileiros, certamente proporcionará aos órgãos contratantes a facilitação dos processos de aquisição de bens e de contratação de serviços e a garantia de um melhor aproveitamento dos recursos públicos – o anseio de todos os cidadãos.

Mas para tanto, será necessário, literalmente, sair da zona de conforto.

Planejar é complexo, exige dedicação e, também, uma visão periférica de todo o contexto da contratação. E esse desafio não será um encargo apenas para os órgãos contratantes.

Às empresas e às pessoas físicas que participam das licitações não mais se admitirá o amadorismo já tão enraizado. Conhecer a Lei e entender o procedimento como um todo será indispensável para a formatação de suas propostas e para o alcance dos objetivos pretendidos com a contratação.

Dentre as principais novidades trazidas pela Lei Federal nº 14.133/2021 – muitas delas intrínsecas ao planejamento -, há que se destacar a previsão expressa acerca da elaboração do plano de contratações anual (art. 12, VII), o que certamente não só auxiliará os órgãos contratantes no alcance da efetividade e da vantajosidade dos contratos, mas também, por se tratar de informações públicas, garantirá às empresas licitantes a prévia ciência das oportunidades do mercado público para o exercício subsequente.

Além disso, a fase preparatória da licitação foi amplamente desenvolvida pela Nova Lei, alcançando um espaço de relevância e indispensabilidade para o alcance dos objetivos do procedimento licitatório. E isso se mostra evidente em seu artigo 18, que impõe a sua sintonia ao planejamento e ao plano anual das contratações. Sem contar, ainda, que o conteúdo do estudo técnico preliminar é esmiuçado pelo dispositivo de forma bastante didática e objetiva.

Ainda nessa seara, cumpre registrar que as contratações diretas também foram alcançadas pela essência do planejamento. Em se tratando de dispensas de licitação em razão do baixo valor (art. 75, incisos I e II), para fins de aferição dos valores que atendam aos limites legais, há que se observar não só o somatório despendido no exercício financeiro pela unidade gestora, mas, ainda, o somatório da despesa realizada com objetos de mesma natureza. Ou seja, sem a previsão da demanda, mostra-se dificultoso o atendimento à imposição da norma.

Outro reflexo do planejamento pode ser destacado do Capítulo X da Lei Federal nº 14.133/2021. A Nova Lei promoveu o credenciamento e o sistema de registro de preços à condição de procedimentos auxiliares da licitação. E nesse sentido, uma vez construída a fase preparatória da contratação de maneira satisfatória – destacada a demanda da Administração Pública, a oferta e as práticas do mercado -, permite a norma que sejam utilizados instrumentos facilitadores e que têm por finalidade promover a efetividade dos contratos.

A título de exemplo, cita-se a hipótese de credenciamento para a contratação em mercados fluídos (art. 79, III), bastante almejada para aqueles que conduzem contratos de fornecimento de combustíveis ou passagens aéreas. O órgão contratante, munido de elementos que caracterizam a sua demanda e a oferta do mercado, ao promover motivadamente o procedimento, não mais sofrerá com as constantes variações dos preços dos produtos, haja vista que serão registradas as cotações de mercado vigentes no momento da contratação – e não da licitação.

Merecem destaque, no mais, as novas regras para a duração dos contratos (Capítulo V). Em se tratando de procedimentos licitatórios fundados no planejamento, entende a Nova Lei que os prazos dos contratos de natureza continuada poder-se-ão ser celebrados com prazo inicial de até 5 (cinco) anos, prorrogáveis até a vigência máxima decimal. Para tanto, deverá ser atestada a maior vantagem econômica da contratação plurianual, no início do contrato e em cada exercício a ser renovado.

Há que se salientar que a Lei Federal nº 14.133/2021 não só promove o planejamento aos elevados patamares ora elencados, mas também garante a sua publicidade a todos os cidadãos e aos potenciais interessados para com ele contratar. Nesse aspecto, o Portal Nacional das Contratações Públicas – PNCP – surge com a tamanha incumbência de ser uma ferramenta hábil para a disponibilização dos dados dos planos anuais de contratação dos órgãos contratantes (art. 174, §2º, inciso I).

E não é só. O ato de planejar está inserido, inclusive, na definição da norma de regência da contratação pelo órgão contratante. O tão discutido artigo 193 da Lei prevê que a Administração Pública poderá optar por licitar pelo novo regime ou pelas normas anteriores, desde que a escolha esteja expressamente indicada no edital ou no aviso de contratação direta. Ou seja, até mesmo para lançar uma licitação - durante o prazo estendido pela Lei Complementar nº 198/2023 -, caberá ao órgão contratante planejar de que forma será promovido o procedimento.

Vivemos as “últimas horas” da antiga legislação. Postergar a aplicação da Lei Federal nº 14.133/2021 não irá evitar o dever de planejar. Somente a prática será capaz de tirar todos aqueles que lidam com contratações públicas da cômoda zona de conforto. A Nova Lei precisa ser experimentada e praticada para que, enfim – talvez -, possamos vivenciar tempos de melhor uso dos recursos públicos.

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