Um estudo elaborado pelo Núcleo de Estudos da Burocracia (NEB), da Fundação Getulio Vargas (FGV), que reuniu impressões de 1.456 profissionais de saúde de
Redação Publicado em 31/05/2020, às 00h00 - Atualizado às 16h18
Um estudo elaborado pelo Núcleo de Estudos da Burocracia (NEB), da Fundação Getulio Vargas (FGV), que reuniu impressões de 1.456 profissionais de saúde de todo o país sobre a pandemia de covid-19, apurou que somente 14,29% deles se sentem preparados para atuar no novo contexto. No total, 64,97% responderam que não sabem lidar adequadamente com a crise sanitária e os demais optaram por não avaliar a questão.
Descobriu-se que o tempo de serviço acaba não sendo um fator gerador de maior confiança para saber como agir durante a pandemia, considerando-se que 64,84% dos respondentes exercem suas atividades há mais de dez anos. Também através das entrevistas, feitas em ambiente online, no período de 15 de abril a 1º de maio, os pesquisadores constataram que a percepção muda conforme a região em que os profissionais se encontram. Em estados do Norte e do Nordeste, há um número maior de profissionais que declaram insegurança.
O estudo também revela que os agentes comunitários de saúde (ACS) e agentes de combate à endemia (ACE) são os que se sentem menos capazes de enfrentar a atual conjuntura. Apenas 7,61% desse grupo julgam estar prontos para encarar os desafios impostos pela crise. Já entre os profissionais de enfermagem, a proporção dos que se acham preparados é de 20,09%.
Apesar dos contrastes verificados com a regionalização e recorte de categoria profissional, há um elemento que todos compartilham: o medo. O grau mais elevado, de 91,25%, foi registrado entre os ACS e os ACE, seguido por 88,24% de profissionais das equipes ampliadas da saúde, 84,31% dos trabalhadores da área de enfermagem e 77,68% dos médicos. Mais da metade (55%) disse conhecer alguém que foi infectado pelo novo coronavírus ou teve suspeita da doença.
A pesquisa mostra 32% dos profissionais receberam itens de equipamento de proteção individual (EPIs), caindo para 19,65% nas categorias de ACS e ACE. Na capital paulista, por exemplo, são os ACS que saem às ruas para levar orientações sobre medidas preventivas à população, ou seja, têm contato direto com outras pessoas, regularmente, tanto como médicos e enfermeiros.
No questionário online, os entrevistados opinaram, ainda, sobre as soluções oferecidas pelo poder público, no âmbito da pandemia. Os resultados mostram que mais da metade acredita que o governo tem deixado de prestar a devida atenção aos profissionais de saúde. Quanto ao apoio institucional por parte de governos estaduais, o índice de desaprovação é de 51%. Já quando se trata do governo federal, o nível atinge 67%. A falta de suporte de chefias diretas se sobrepõe às demais, sendo apontada por 71,82% dos entrevistados.
Outra queixa diz respeito a orientações sobre procedimentos. A maioria deles, porém, afirma não ter recebido nenhuma instrução. Segundo a pesquisa, 21,91% relata ter recebido treinamento específico sobre a pandemia, sendo que a maioria é de médicos.
“Também tem uma diferença importante entre a atenção primária e a atenção terciária. Na atenção terciária, em que estão os profissionais da área hospitalar, embora não estejam se sentindo preparados, estão se sentindo mais preparados que na atenção primária. E a mesma coisa com relação a EPIs”, complementa a coordenadora do NEB, Gabriela Lotta.
A pesquisa suplementa as informações indicativas de vulnerabilidade dos profissionais, abordando aspectos sobre a relação que têm mantido com pacientes. Nessa dimensão, observou-se que a pandemia tem provocado mudanças, como o distanciamento físico, citado por 88% dos entrevistados. Outro ponto, tomado como relevante por Gabriela, é o abalo ao alcance de recomendações que fazem aos pacientes e à população. A cientista política comenta que, em razão da disputa de discursos que o mundo vivencia e que divide a população entre aqueles que levam a situação com seriedade e outros que a minimizam, os profissionais de saúde tornaram-se alvo de hostilização. Muitas vezes, os gestos assumem a forma de agressões físicas, conforme apurou a Agência Brasil, em reportagem sobre violências cometidas contra funcionários de enfermagem, no estado de São Paulo.
“Os profissionais estão sendo hostilizados na rua e, inclusive, por pacientes com quem tinham vínculos históricos. Isso apareceu demais nos relatos de profissionais de atenção primária, enfermeiras e agentes comunitários. Tanto porque as pessoas têm medo de eles contagiarem e falam ‘não chegue perto de mim, porque você pode estar doente’, ou o contrário, pessoas que negam a doença e dizem ‘vocês estão querendo me doutrinar, querem que eu fique em casa’. Está um clima muito difícil para esses profissionais, porque, ao mesmo tempo em que estão com uma sobrecarga de trabalho, lidam com a hostilização, especialmente no caso brasileiro”, destaca Gabriela.
Até as 19h de sábado (30), o Brasil havia contabilizado 498.440 casos confirmados de covid-19, 268.714 casos em acompanhamento e 28.834 óbitos decorrentes da doença. Os dados constam de balanço divulgado pelo Ministério da Saúde.
Agência Brasil.
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