Diário de São Paulo
Siga-nos
COLUNA

Uma boa conclusão não salva um discurso ruim, mas um mau final pode destruir uma boa apresentação

Uma boa conclusão não salva um discurso ruim, mas um mau final pode destruir uma boa apresentação - Imagem: Freepik
Uma boa conclusão não salva um discurso ruim, mas um mau final pode destruir uma boa apresentação - Imagem: Freepik
Reinaldo Polito

por Reinaldo Polito

Publicado em 16/04/2023, às 14h24


Quantas vezes ouvimos a mesma piada contada por pessoas diferentes. Uma delas consegue ser muito engraçada, enquanto a outra não provoca reação idêntica. Há uma série de fatores que produzem esses efeitos tão antagônicos: o tom da voz, as pausas, o timing, a expressividade do semblante, a capacidade de criar ou não expectativas e uma série de outros aspectos que poderiam ser relacionados. Entre todos, entretanto, o mais relevante é a conclusão. Se a anedota, ou a história, não tiver bom final, dificilmente conseguirá tocar a emoção dos ouvintes a ponto de eles reagirem bem assim que a narrativa se encerrar.

Portanto, saber concluir é uma habilidade que deve ser aprendida e cultivada em todos os momentos. O meu professor de oratória, Oswaldo Melantonio, gostava de repetir uma frase de Carlos Lacerda, um dos melhores oradores políticos brasileiros de todos os tempos: “O dia em que aprender a concluir poderei me considerar um bom orador”.

Tenho observado o desempenho dos oradores. Devido a minha profissão, ouço dezenas de discursos todos os dias. Noto que essa é uma das maiores dificuldades daqueles que falam em público. Alguns até conseguem desenvolver muito bem suas apresentações, mas no momento de encerrar não encontram um final que pudesse coroar a boa qualidade da sua mensagem. Dependendo da falta de competência daquele que se apresenta, em certos casos até chega a comprometer toda a exposição.

O contrário nem sempre é verdadeiro. Um discurso ruim quase nunca consegue ser salvo por uma conclusão brilhante. O bom final pode quando muito atenuar o fracasso, mas não tem jeito, discurso ruim é discurso ruim. A boa notícia é que podemos aprender a encerrar bem uma apresentação. Bastam alguns cuidados simples para que o término seja eficiente.

O primeiro deles deve ser com os finais desaconselháveis. Há certas frases inconsistentes, inadequadas, que precisam ser evitadas. As mais comuns são: “Era isso o que eu tinha para dizer, muito obrigado”, “Já disse tudo, não tenho mais nada a acrescentar”, “Acho que isso era tudo”. Não que essas frases arruínem necessariamente a qualidade de uma boa apresentação, mas, com certeza, não contribuem para enriquecê-la. A não ser em momentos peculiares como, por exemplo, nas circunstâncias em que o orador deseja afirmar que seu ponto de vista não poderia encontrar contestações. Nesse caso, ao dizer: “E isso era tudo o que eu tinha a falar”, evidencia que suas propostas deveriam mesmo ser acatadas, ou que suas palavras marcam de forma cabal sua posição.

Se, por acaso, ao chegar no final, pela entonação da voz perceber que não dará a impressão de que está partindo para a conclusão, algumas palavras e expressões ajudam a encontrar um caminho mais conveniente como, por exemplo: “Assim sendo...”, “Dessa forma...”, “Com isso...”, “Assim eu espero que...”. Esses conectores levarão naturalmente ao final.

Alguns erram ao terminar porque usam o tom próprio de quem vai continuar falando, não o de quem estaria finalizando. Por não ter mais nada a acrescentar, como recurso derradeiro apela para o “era isso o que tinha para dizer”. Para terminar com o tom adequado, use uma das duas formas: aumentar o volume da voz e a velocidade da fala, nas situações em que a mensagem for mais motivadora; ou, ao contrário, diminuir o volume da voz e a velocidadeda fala, nas ocasiões em que as informações forem mais serenas e tranquilas.

Se o tom for correto no encerramento, o orador nem precisará dizer “obrigado” ao concluir. Geralmente, o “obrigado” não é um agradecimento, mas sim um aviso de que o discurso chegou ao fim. Ao se valer de uma boa entonação, esse “obrigado” pode ser dispensado sem nenhum tipo de prejuízo. Atenção: não estou dizendo que seja proibido dizer “obrigado”, mas sim que seu uso não é obrigatório.

Além dessas considerações, há três tipos de mensagens que ajudam muito o orador a fazer uma boa conclusão: o primeiro, repetir em duas ou três frases a essência da mensagem principal transmitida. O segundo, dar uma opinião a respeito do tema abordado. O terceiro, fazer uma proposta de ação ou de reflexão aos ouvintes. De todos eles, este último, às vezes até associado com o primeiro, é o mais comum e que, de maneira geral, apresenta melhores resultados.

Assim sendo, ficando atento para evitar os encerramentos desaconselháveis, acertando bem o tom da voz para concluir e usando um desses tipos recomendados, o orador talvez não consiga recuperar uma apresentação ruim, mas, sem dúvida, irá valorizar ainda mais seus bons discursos.

Compartilhe  

últimas notícias