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As críticas rudes que recebemos na internet não deveriam nos afetar

As críticas rudes que recebemos na internet não deveriam nos afetar - Imagem: Freepik
As críticas rudes que recebemos na internet não deveriam nos afetar - Imagem: Freepik
Reinaldo Polito

por Reinaldo Polito

Publicado em 22/01/2023, às 08h10


Coincidentemente, no dia em que recebi Roberto Jefferson para um programa de treinamento de oratória, uma matéria extremamente negativa sobre algumas de suas ações havia sido publicada na capa de um jornal de grande circulação.

Depois de algum tempo de conversa, já nos sentindo mais próximos, pude comentar sobre a notícia. Jefferson respondeu com toda a tranquilidade: Polito, estou tão acostumado com esse tipo de publicação que me parece se tratar de uma terceira pessoa. Tenho sempre a impressão de que não estão falando de mim.

Sua resposta deu o que pensar, pois, se ele se incomodasse com o que a imprensa falava dele, não haveria consultório de psicoterapeuta que bastasse para pôr sua cabeça no lugar. Pessoas que são frequentemente expostas precisam desenvolver uma espécie de couraça para se proteger.

Eu, por exemplo, escrevo para jornais, revistas e portais da internet há mais de 30 anos. Há pouco tempo, fiz um rápido cálculo por cima e concluí que já escrevimais de dois mil textos. Alguns desses artigos ficam abertos para o comentário dos leitores sem nenhum tipo de restrição. Em certos casos, essa é a oportunidade de colocarem para fora os seus demônios interiores. De “estagiário imbecil” a “ignorante despreparado” é possível encontrar de tudo.

No início, ingenuamente, imaginando que se respondesse ao agressor poderia esclarecer o equívoco da sua interpretação, comecei a redigir mensagens bem pensadas, diplomáticas, gentis, tentando assim enfraquecer o nível de agressividade. Grande engano!

Descobri que as minhas explicações acabavam por servir de escada para que fizessem novas investidas. De maneira geral, os comentários que faziam não tinham nada a ver com o conteúdo do texto, mas sim com uma vontade incontrolável de aflorar sua raiva e frustrações.

A primeira lição veio do acadêmico e grande escritor Carlos Heitor Cony. Ele disse certa vez que não apenas não respondia às mensagens dos leitores, como nem as lia. Aquela atitude não passava pela minha cabeça. Quer dizer que, se alguém escrever uma ofensa mentirosa, vai ficar por isso mesmo?! Não vai fazer nem uma defesa para mostrar que aquela informação não é verdadeira?!

Com o tempo, fui me rendendo à experiência do Mestre. De cada cem comentários positivos ou negativos que recebia, passei a responder um, no máximo dois. Depois fui aprimorando. Deixei de responder. Hoje conquistei a excelência, pelo menos nesse quesito, e nem leio. Se um texto recebe, por exemplo, 50 reações dos leitores, leio meia dúzia para ver o tom das críticas, e só.

Os meus amigos e familiares ficam indignados. Constantemente me perguntam se vi o tipo de comentário agressivo de determinado leitor. Quando digo que não, pois não leio o que comentam, se mostram incrédulos. Mas, você vai deixar por isso mesmo? Eu contesto, sim, pois dessa forma cai no vazio e o assunto morre no nascedouro.

De certa forma, nessas três décadas fui endurecendo o couro e me sinto blindado.

Para não dizer que fico cem por cento impassível, se entre esses quatro ou cinco que leio como amostragem houver mais de um afirmando que não tenho competência para tratar do tema, sem retrucar diretamente, escrevo duas linhas mostrando minha autoridade para abordar aquela matéria.

Por exemplo, se afirmam que eu deveria apenas me dedicar ao ensino da oratória, pois política não é assunto do meu domínio, registro o seguinte: “Sou professor nos cursos de pós-graduação em Marketing Político na ECA-USP há mais de 20 anos e os presidentes dos maiores partidos políticos do país foram meus alunos”. Ou, se alegam que economia e finanças não são a minha praia, anoto: “Sou formado em Economia e Administração de Empresas. Tenho três cursos de pós-graduação em Administração Financeira. Atuei por quase 20 anos em grandes instituições financeiras”. E ponto. Uma vez a cada dois ou três anos, se tanto.

Se entendermos alguns comportamentos mais ou menos naturais do ser humano, poderemos aceitar com mais tranquilidade essas agressões. Basta pensar que na internet as pessoas se enchem de coragem para falar sem censura o que lhes vem à cabeça, porque não estão interagindo face a face com o interlocutor. Que existe uma tendência de “Maria vai com as outras”, porque desejam seguir o comportamento do grupo. Que gostariamde ser notadas, e agindo assim, talvez consigam a “notoriedade” que tanto almejam.

Sem contar ainda que com esse exercício também nos preparamos para aceitar sem reações emocionais desnecessárias as críticas que recebemos no dia a dia. Assim não nos abalamos, não nos frustramos, não nos entristecemos ao descobrir o que os outros acham ou deixam de achar de nós.

Difícil? Sim, muito. Impossível? Não. Vale a pena seguir esse caminho. Até para que possamos ser mais felizes, independentemente do que as outras pessoas possam pensar a nosso respeito.

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