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LUTO

Morre Danilo Santos de Miranda, diretor do Sesc, aos 80 anos

Danilo Santos de Miranda era sociólogo, filósofo e ex-seminarista

Danilo Santos de Miranda era sociólogo, filósofo e ex-seminarista - Imagem: Reprodução/Instagram @danilom
Danilo Santos de Miranda era sociólogo, filósofo e ex-seminarista - Imagem: Reprodução/Instagram @danilom

Ana Rodrigues Publicado em 30/10/2023, às 08h01


Neste domingo (29) morreu Danilo Santos de Miranda, sociólogo, filósofo e ex-seminarista, aos 80 anos. Ao longo de quatro décadas em que dirigiu o braço paulista do Sesc, ele se tornou a figura mais longeva e relevante da cultura de São Paulo. Visto como uma mistura de mecenas com ministro da Cultura, era prestigiado e reverenciado como tal.

Segundo a Folha de São Paulo, Miranda estava internado no hospital Albert Einstein, em São Paulo, desde o início do mês. A causa da morte ainda não foi divulgada pela equipe médica.

Ele foi o responsável por transformar a entidade ligada ao setor do comércio na maior potência cultural do país. Criado com o intuíto de promover o bem-estar social de um grupo específico de beneficiários - comerciários e suas famílias - o Sesc, sob seu comando, mais que dobrou de tamanho e se abriu para o Brasil e para o mundo.

Miranda inaugurou a grande maioria das unidades da instituição no estado e retirou suas catracas para o livre acesso às acolhedoras áreas de convivência, onde misturam esporte, lazer, arte e alimentação, em meio a cidades carentes de espaços públicos de qualidade. Ele criou um modelo de fomento que virou referência para políticas públicas de incentivo à cultura do país e estimulou a profissionalização de artistas, curadores e produtores ao estabelecer uma burocracia transparente, com editais e comissões.

Ele era apaixonado por teatro, e não escondia suas predileções pessoais no campo da cultura. Porém, promovia as mais diversas expressões artísticas à frente do Sesc, do erudito ao popular, de produções mais comerciais às mais experimentais.

O que seriam das artes no Brasil sem o Sesc?", indagou a atriz Zezé Motta, no palco do evento de 60 anos de trabalho social do Sesc com idosos.

Fernanda Montenegro, que estava ao lado, concordou e completou.

É isso mesmo! Nós sabemos na pela o que representa o Sesc na pessoa do professor Danilo Miranda".

Em abril deste ano, o dramaturgo José Celso Martinez, fez uma declaração sobre Danilo.

Se não tivesse Danilo Miranda, não tinha teatro em São Paulo. Só teria musical", afirmou.

Nascido numa família de classe média de Campos de Goytacazes, no Rio de Janeiro, em 1943, Miranda era o terceiro dos quatro filhos de uma farmacêutica e um dentista, que também era jornalista e gostava de tocar violão para a família cantar reunida.

Perdeu sua mãe aos sete anos de idade, vítima de uma infecção nos rins com apenas 31 anos. Ele e seu irmãos passaram a ser criados pela avó, Donana. Aos 11 anos, ingressou na Escola Apostólica dos Jesuítas, em Friburgo, no Rio de Janeiro, um internato religioso de intensa atividade intelectual e esportiva, sediado no Colégio Anchieta.

Ele fez parte da banda, do cineclube e das audições de sinfonias da escola. Criou uma academia de letras escolar, fundou um grêmio estudantil e participou de encontros do movimento estudantil ligado à União Nacional dos Estudantes. Mas, a ideia de servir ao próximo, numa vida de renúncias, falou mais alto e o levou para o seminário.

A vida religiosa fundamentou meu interesse pelo lado político, aquilo de você não ser só você mesmo, de abrir-se um pouco, perceber o entorno. Um órfão tem muita facilidade para compreender os outros. À medida que você tem carências, você entende a carência externa", disse em entrevista de 2014, à revista A Terceira Idade.

No início dos anos 80, ele se tornou frequentador assíduo e entusiasta do Sesc Pompeia e de sua programação musical inovadora, que incluía gafieiras de Paulo Moura e shows de Tim Maia e Jorge Ben Jor. E, no corredor aberto da antiga fábrica, cruzava com o empresário Abram Szajman, entre pessoas próximas da comunidade judaica.

Pouuco tempo depois de assumir a presidência da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, em 1984, Szajman convidou Miranda para o cargo de diretor regional do Sesc. Foi uma parceria feliz e duradoura. Abram deu aval para o projeto de expansão da rede Sesc e respaldo às decisões de Miranda, que substituiria o financiamento a artistas e grupos residentes pelo modelo de fomento amplo e diverso que consagrou a história recente da instituição.

Para Miranda, a cultura era uma ação educativa continuada, uma condição da cidadania e, portanto, não poderia estar subjugada a lógicas do mercado, pressões políticas ou caprichos de quem quer que fosse.

Pouco dias antes de ser hospitalizado, o diretor regional reuniu membros de sua equipe para discutir os novos projetos da instituição.

A assinatura marcante de um centralizador obstinado e os muitos anos na direção do Sesc São Paulo, fizeram Miranda ser a personificação da instituição que liderava, numa comunhão entre vida e trabalho que era sua velha conhecida.

Fico aqui como se fosse para vida toda", disse ele. E, assim, foi.

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