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Controvérsia no TikTok: perfis se aproveitam da miséria na Cracolândia para ganhar dinheiro e fama

Durante uma transmissão ao vivo, um perfil fez uma promessa polêmica de "jogar moedas" nas pessoas caso conseguisse atingir a marca de 10 mil seguidores

Monetização do vício alheio. - Imagem: Reprodução
Monetização do vício alheio. - Imagem: Reprodução

Marina Roveda Publicado em 15/05/2023, às 08h54


De uma janela em um prédio situado em uma das ruas da Cracolândia, região central de São Paulo, um perfil no TikTok realiza uma transmissão ao vivo exibindo um grupo de usuários de drogas no local e espalha informações falsas, como a existência de um suposto auxílio governamental chamado "Bolsa Crack de R$ 700 e pouco".

É importante ressaltar que não há qualquer auxílio público com essa denominação, seja em nível municipal, estadual ou federal. Seguidores do perfil fazem comentários irônicos e piadas a respeito.

O perfil, identificado como Jasmine Carter, exibe imagens de pessoas consumindo drogas e em situação de vulnerabilidade, buscando engajamento, seguidores e ganhos financeiros. Durante uma das transmissões, ela anunciou que jogaria moedas pela janela ao atingir a marca de 10 mil seguidores.

Entretanto, Jasmine não conseguiu alcançar essa meta e sua conta foi banida pela rede social na quarta-feira (10), após o conteúdo viralizar no Twitter.

"Eu acessei o TikTok à noite, exatamente durante a live dela, e vi uma parte em que ela ria dos usuários sob efeito de K9, além de comemorar a quantidade de visualizações. Senti como se estivesse testemunhando um episódio muito triste de Black Mirror", comentou um usuário, fazendo referência à série britânica. O vídeo ao vivo recebeu 250 mil curtidas.

A série "Black Mirror" apresenta tramas que exploram uma realidade distópica e aborda aspectos sombrios da vida dos personagens, muitas vezes relacionados a situações extremas provocadas pela tecnologia.

Recentemente, o TikTok começou a remunerar criadores de conteúdo, mas os valores não são divulgados pela plataforma. Durante as transmissões ao vivo, os espectadores têm a opção de apoiar seus criadores favoritos, enviando "presentes virtuais" que podem ser convertidos em dinheiro.

Com ironia, Jasmine comenta sob a trilha sonora da série americana sobre apocalipse zumbi, The Walking Dead: "A vibe durante o dia também é maravilhosa".

Monetização do vício alheio

Na plataforma do TikTok, existe uma forma de ganhar dinheiro chamada "presentes". Os usuários têm a opção de enviar figurinhas, como flores, que podem ser adquiridas na plataforma com moedas pagas pelos usuários usando dinheiro real. O pacote mínimo de moedas do TikTok, que contém 12, custa R$ 0,90. O valor das figurinhas varia de acordo com o item, sendo que uma flor custa uma moeda, enquanto uma figurinha de um buquê de flores custa 30 moedas.

O perfil de Jasmine não é o único que busca obter visualizações ao mostrar tragédias alheias. Há também um motociclista que filma usuários na Cracolândiae utiliza a música "Ilusão (Cracolândia)", de MC Hariel, descrevendo a cena como apocalíptica. Em menos de dois meses, a postagem recebeu 4,6 milhões de visualizações e 223 mil curtidas. Outro vídeo, publicado em 30 de março, acumula 6,8 milhões de visualizações, 223 mil curtidas e 5,3 mil comentários, com a legenda "Não é um filme de zumbi, é a Cracolândia no Centro de São Paulo".

Existe também um vídeo que mostra Guardas Civis Metropolitanos (GCM) de São Paulo durante uma ação de rotina de limpeza das ruas da Cracolândia, com a legenda "Zumbis ladrões na Cracolândia". As imagens, registradas em um domingo, dia 23 de abril, receberam 5,6 milhões de visualizações, 146,9 mil curtidas e 1,2 mil comentários.

Para Priscila Akemi Beltrame, vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo, é evidente que o conteúdo disseminado pelo perfil na rede social viola os direitos humanos. Segundo ela, a população vulnerável tem direito à privacidade. Especialistas em direitos humanos também apontam que é possível haver danos morais mesmo após a remoção do conteúdo.

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