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COLUNA

Guarujá e Israel – A proporcionalidade da hipocrisia

Criminosos aparecem ostentando armas e até fuzil no meio da rua no litoral de SP - Imagem: Reprodução | Twitter
Criminosos aparecem ostentando armas e até fuzil no meio da rua no litoral de SP - Imagem: Reprodução | Twitter

por Gustavo Mesquita Galvão Bueno

Publicado em 19/10/2023, às 06h07


Em julho deste ano, o Policial Militar Patrick Reis foi morto após ser atingido por um tiro, em ataque covarde e gratuito de traficantes durante patrulhamento em uma comunidade na cidade do Guarujá-SP deixando esposa e filho pequenos. Em seguida, com o intuito de identificar os responsáveis e restabelecer a ordem na região, as forças policiais paulistas deflagraram a “Operação Escudo”, durante a qual alguns criminosos que optaram pelo confronto vieram a falecer. O ministro da Justiça Flávio Dino, sem conhecer minimamente os detalhes da operação policial, afirmou que a reação da polícia lhe parecia ser “desproporcional”.

A partir de então, militantes de grupos supostamente defensores de direitos humanos ligados a partidos políticos passaram a exigir o imediato cancelamento da operação, sob a narrativa de que ela estaria causando a morte de inocentes e aterrorizando os moradores das comunidades onde ocorria. Para fracasso da narrativa, a citada operação terminou com resultados expressivos: 976 presos, 119 armas de fogo e quase 1 tonelada de droga apreendidas, além de forte aprovação popular – sobretudo dos moradores da região.

Três meses depois, o mundo assistiu atônito o grupo terrorista Hamas promover um ataque brutal a Israel, ceifando a vida de mais de mil civis israelenses com requintes de crueldade, além do estupro de mulheres e sequestro de pelo menos 199 reféns, fazendo com que o Estado de Israel iniciasse uma contraofensiva militar a fim de neutralizar os terroristas e defender sua população. Diferentemente do Hamas, que tem como objetivo o extermínio de todo o povo judeu indistintamente, Israel tem adotado todas as cautelas possíveis para preservar a vida de civis palestinos por meio do uso de tecnologia bélica avançada inclusive avisando a população sobre o horário e local das investidas.

Diante da legítima reação, no Brasil, parcela da imprensa, da sociedade e de grupos políticos ligados ao governo federal vêm a público reiteradamente rotular de “desproporcional” a reação de Israel à injusta agressão sofrida. Esforçando-se para legitimar a barbárie, esses chegam a justificar os atos de terrorismo como instrumentos de “resistência da causa palestina.

Como se vê, o vago conceito de “proporcionalidade” tem sido utilizado como um mantra por aqueles que pretendem reprovar sumariamente reações legítimas executadas pelo estado, diante de agressões injustas sofridas por seus cidadãos inocentes. Imperioso, portanto, que se indague: em ambos os casos, o que seria, para tais pessoas, uma reação efetivamente “proporcional”? No caso do policial executado no Guarujá, a morte de apenas um indivíduo do “outro lado”, mediante idênticas circunstâncias – ou seja, o abatimento sumário de um criminoso, sem direito a defesa ou respeito às garantias individuais? E no cenário de Israel, a execução e sequestro de famílias palestinas, estupro de mulheres, e degola de número de crianças em número idêntico, seria então uma reação “proporcional”?

Obviamente, todas as hipóteses acima soam desarrazoadas e absurdas, sobretudo, por um motivo muito direto: em situações de confrontos assimétricos, o conceito de “proporcionalidade” simplesmente não pode ser invocado, sob pena de prestar-se a garantir a impunidade do agressor e a impotência do agredido.

Por um lado, o Estado de Direito não pode e não deve lançar mão dos mesmos recursos utilizados por organizações criminosas e terroristas – imperativo que, de plano, os deixa em posição de desigualdade em relação a essas. Enquanto um lado faz uso da força para proteger seus cidadãos, o outro usa seus cidadãos como escudo para se protegerem da lei. Além disso, em ambos os casos os ataques extrapolam a trágica esfera das vidas humanas ceifadas, para se revelarem em afrontas ao próprio Estado Democrático de Direito – exigindo, portanto, reação rigorosa e exemplar (e não necessariamente proporcional) deste Estado a fim de se restabelecer a ordem, manter a paz e garantir o triunfo da civilização sobre a barbárie.

Assim como os terroristas do Hamas não representam o povo inocente palestino, os traficantes não representam a população honesta e trabalhadora das comunidades do Guarujá. Ao contrário, são vítimas daqueles, amordaçadas pela lei do silêncio e muitas vezes utilizadas como escudo humano diante da ameaça de repressão estatal.

Àqueles que, agora, pedem o cessar-fogo de Israel (muito provavelmente, os mesmos que exigiam o fim da Operação Escudo), por que não exigem que, antes, os terroristas se entreguem e libertem os reféns israelenses? O que seria, afinal, do destino de tais reféns se Israel decidisse baixar as armas? Ou, para os defensores da “proporcionalidade” algumas vidas têm menos valor que outras? Seria o terrorismo um instrumento hábil e aceitável para atingir determinada causa, ainda que eventualmente legítima?

São questões que, invariavelmente, furtam-se em responder aqueles que, por ignorância ou má-fé, semeiam a falácia e a hipocrisia para colher ainda mais ódio, caos e destruição. Se há algo, de fato, desproporcional em todos os cenários analisados, é a relação entre as narrativas a serviço de agenda ideológicas pré-definidas, e o compromisso efetivo com busca efetiva pela paz.

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