A clínica responsável pela eutanásia da colombiana Martha Liria Sepúlveda, que não tem doença terminal, suspendeu a realização do procedimento deste domingo
Redação Publicado em 10/10/2021, às 00h00 - Atualizado às 13h47
A clínica responsável pela eutanásia da colombiana Martha Liria Sepúlveda, que não tem doença terminal, suspendeu a realização do procedimento deste domingo (10). A morte deLiria estava marcada para ocorrer às 7h (hora local, 9h em Brasília).
Com esclerose lateral amiotrófica (ELA), colombiana de 51 anos foi a primeira pessoa sem estado terminal a ter a eutanásia autorizada na Colômbia.
“Após reunião, em que revisamos e analisamos de forma ampla o pedido de Martha Liria Sepúlveda, decidimos de maneira unânime cancelar o procedimento de eutanásia, programado para 10 de outubro de 2021”, afirmou a instituição de saúde à rádio Caracol.
A clínica disse também que a decisão é amparada pelo Ministério da Saúde que pede a criação de um comitê para avalizar este tipo de procedimento, com um grupo de especialistas responsável por revisar os procedimentos.
“A partir de relatórios atualizados do seu estado de saúde e da evolução da paciente, definimos que não se cumpre o critério de doença terminal que havia sido determinado por um primeiro comitê”, disse a clínica.
O advogado de Liria, Lucas Correa, disse em entrevista à BBC Mundo que a decisão é “ilegítima, ilegal e arbitrária”. Ele diz que ela viola o direito da paciente de morrer dignamente.
“Eles estão a forçando a viver uma vida que ela não deseja continuar vivendo, com sofrimento e uma dor que ela considera incompatíveis com sua ideia de dignidade”, disse.
A eutanásia, ou morte assistida, é legalizada na Colômbia desde 1997. O país, aliás, foi o primeiro na América do Sul a legalizar o procedimento. Porém, a prática valia apenas para pacientes que tivessem doenças terminais — ou seja, seria uma forma de abreviar o sofrimento da pessoa em situação já irreversível, se assim fosse a decisão dela.
Em julho de 2021, a Corte Constitucional — equivalente ao Supremo Tribunal Federal no Brasil — aprovou a extensão do acesso à eutanásia para pessoas que não estejam em estado terminal. A decisão foi autorizada por 6 votos favoráveis e 3 contrários.
A decisão estende a eutanásia “sempre que o paciente padecer de um intenso sofrimento físico ou psíquico, proveniente de lesão corporal ou doença grave e sem cura”.
É aí que entra a situação de Martha, com esclerose lateral amiotrófica (ELA). Em entrevista à emissora de TV colombiana Caracol, ela relatou sentir dores e ter perdido o movimento das pernas, o que a atrapalha na vida cotidiana.
Já em julho, pouco depois da decisão da Corte, Martha solicitou a autorização e conseguiu. Primeiro, gostaria que a eutanásia fosse aplicada em 31 de outubro, mas preferiu antecipar para 10 de outubro — ou seja, este domingo — para as 7h, hora em que costumava ir à missa.
“Sou uma pessoa católica, me considero alguém que crê muito em Deus, mas, repito, Deus não quer me ver sofrer e acredito que não quer ver ninguém sofrer. Nenhum pai quer ver seus filhos sofrerem”, disse, em entrevista à emissora colombiana Caracol.
“Para mim, a morte é um descanso”, emenda.
Por ser católica, aliás, a decisão de Martha encontra muita resistência dentro da Igreja, que costuma se posicionar contra a prática. Questionada pela TV colombiana como lida com isso diante de padres, ela responde:
“A resposta [que dou a eles] é a mesma: faço isso porque estou sofrendo e porque creio em um Deus que não quer me ver assim. Para mim, Deus está me permitindo isso, então se gosta de mim, não gosta de me ver nesta situação”, justifica.
Martha, então, tenta aproveitar os dias que lhe restam com cerveja e comida, na companhia da família. “Estou mais tranquila desde que autorizaram o procedimento. Rio mais, durmo mais tranquila”, afirmou à TV Caracol.
O filho Federico, de 22 anos, reconhece que gostaria de ter a mãe por mais tempo, mas afirma que aceitar a decisão da eutanásia é o “maior ato de amor” que já fez. “Em princípio preciso da mamãe, quero ela comigo, quase em qualquer condição. Mas sei que em suas palavras ela já não vive mais, apenas sobrevive”, disse.
Como a maioria da população colombiana, Martha se declara muito católica. Por isso, integrantes da Igreja colombiana pedem que ela reconsidere a decisão de interromper a vida já neste domingo. Francisco Ceballos, bispo de Riohacha, defendeu que “a morte não pode ser a resposta terapêutica à dor e ao sofrimento em nenhum caso”.
“Quero dizer à minha irmã Martha que ela não está sozinha e que o Deus da vida sempre nos acompanha, e que sua tribulação pode encontrar um sentido transcendental, uma chamada ao amor que se renova”, pediu o bispo, em vídeo divulgado nas redes.
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