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Você acredita em destino fatalista ou em livre-arbítrio?

O conformismo fatalista e a serenidade diante de um destino inevitável

Você acredita em destino fatalista ou em livre-arbítrio? - Imagem: Reprodução/Freepik

Manoela Cardozo Publicado em 29/09/2024, às 10h25

Quando Jean-Paul Sartre visitou Araraquara com Simone de Beauvoir, em 1960, eu era apenas um menino de nove anos. Lembro do tumulto na cidade, não por causa do casal, mas sim pela presença do Santos de Pelé, que jogou contra a Ferroviária. Mais tarde, soube dos detalhes da ida do filósofo à Morada do Sol.

Procurei saber mais a respeito da sua vida e da sua obra. Descobri que ele foi o expoente do existencialismo e defensor das teses esquerdistas. O que mais me chamou a atenção, entretanto, foi sua ferrenha oposição às ideias deterministas. Para ele, o homem está “condenado a ser livre” e deve o tempo todo escolher as ações responsáveis por sua existência.

Frases fatalistas

Sartre afirmava também que acreditar no fatalismo é um meio de fugir da responsabilidade pelas escolhas de cada um, pois via nessas escolhas a base para a construção do sentido da vida.  Naturalmente, o filósofo francês não está sozinho na defesa dessa causa; há outros, entretanto, que pensam de forma diversa. O objetivo deste texto é discutir os argumentos favoráveis e opostos ao determinismo na nossa vida.

Quantas vezes ouvimos estas frases fatalistas: ‘Quando chega a hora, não há o que fazer’; ‘Tudo que passamos ou vamos passar já está escrito’. Será que esse fatalismo existe mesmo? E o livre-arbítrio, que é a nossa vontade de fazer ou não, existe? Até que ponto os nossos desejos determinam os rumos da nossa vida?

O conformismo

Os adeptos do fatalismo defendem que os acontecimentos já estão programados por forças naturais ou pelo destino. Como os fatos são predeterminados, argumentam que o homem não detém o controle da sua vida. Quem acredita nessa tese aceita com mais naturalidade o que a existência lhe proporciona, pois pode enfrentar com certo conformismo um plano já pré-estabelecido. Não há motivos para lutar contra o que seja inevitável.

Dessa forma, os infortúnios e as agruras são encarados com mais serenidade, sem a preocupação ou a ansiedade de que por ações ou a falta delas a pessoa tenha provocado situações que não estavam subordinadas à sua vontade. Há nessa crença o conforto espiritual e psicológico de viver a vida que recebeu.

Apoio na Bíblia

Os defensores do fatalismo buscam respaldo até na palavra da Bíblia para justificar suas certezas. Em Romanos 8:29-30, há uma passagem que, segundo os fatalistas, reforça sua tese: “Aqueles a quem Deus predestinou, também chamou; e os que chamou, também justificou; e aos que justificou, também glorificou”. E comemoram: como pode haver dúvida se a própria palavra de Deus o afirma?

Os estoicos, também, acreditavam que tudo o que acontece com o homem já foi pré-determinado. Dessa forma, deve o ser humano se resignar e aceitar com serenidade o destino que lhe foi imposto. Deixavam, entretanto, uma abertura para o caráter moral, que, segundo eles, poderia ser sempre aperfeiçoado.

O livre-arbítrio

O livre-arbítrio, por outro lado, é o principal argumento de quem combate o fatalismo. Acreditam que cabe ao homem decidir e alterar o seu futuro. Dizem que aceitar a ideia de que os fatos já foram pré-determinados é desculpa daqueles que vivem na passividade e não encaram como deveriam suas responsabilidades.

Não se conformam com essa maneira de pensar. Para eles, essa aceitação de que nada poderá ser alterado pela vontade do ser humano desmotiva as pessoas a resolverem seus problemas e a se empenharem na busca de crescimento e de uma vida mais plena.

A Bíblia para o outro lado

Se os fatalistas encontraram explicações na Bíblia que reforçam sua teoria, seus opositores não se dão por vencidos e garimpam no mesmo Livro Sagrado referências às suas certezas. Em Deuteronômio 30:19, há uma citação para fortalecer a ideia do livre-arbítrio: “Escolham a vida, para que vocês e seus filhos vivam”.

Um conceito intermediário, que concilia os dois lados da equação, foi deixado por Santo Agostinho. De acordo com sua visão, a ideia de predestinação pode ser conciliada com o livre-arbítrio. O filósofo diz que Deus pode conhecer e predestinar alguns eventos, mas o ser humano ainda possui a liberdade de agir. Defende também que Deus não predestina o mal, e que o homem pode decidir entre o bem e o mal.

Essa é, portanto, uma questão controvertida que encontra amparo para ambos os lados tanto nos estudos psicológicos quanto teológicos. Cabe a cada um, a partir de suas próprias crenças, encontrar as respostas que deseja para a sua vida.

Reinaldo Polito é Mestre em Ciências da Comunicação e professor de Oratória nos cursos de pós-graduação em Marketing Político, Gestão de Marketing e Comunicação, Gestão Corporativa e MBA em Gestão de Marketing e Comunicação na ECA-USP. Escreveu 37 livros, com mais de 1,5 milhão de exemplares vendidos em 39 países. Siga no Instagram: @polito pelo facebook.com/reinaldopolito pergunte no https://reinaldopolito.com.br/home/
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