Quem reclama das urnas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aqui no Brasil deveria prestar atenção à confusão da apuração nas eleições dos EUA. Nosso sistema
Redação Publicado em 09/11/2018, às 00h00 - Atualizado às 07h59
Quem reclama das urnas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aqui no Brasil deveria prestar atenção à confusão da apuração nas eleições dos EUA. Nosso sistema está longe de perfeito, mas o Brasil consegue toda eleição, num período inferior a 12 horas, aquilo que os Estados Unidos levam semanas para saber: resultados corretos e incontestáveis para todas as disputas.
Tecnicamente, as duas eleições são bastante semelhantes. Embora os números oficiais ainda não estejam fechados, dos 237 milhões de cidadãos habilitados a votar nos Estados Unidos, algo como 114 milhões votaram. Aqui, dos 147 milhões de eleitores, 107 milhões votaram no primeiro turno, quase 105 milhões no segundo. Eleitorados comparáveis em países de dimensões comparáveis.
Juridicamente, porém, as duas eleições não poderiam ser mais distintas. A lei americana confere aos estados o poder de decidir as regras da eleição, como realizar a votação e como apurar os votos. O resultado é uma profusão de métodos distintos e sistemas incompatíveis. Há voto em papel, voto pelo correio, máquinas de votação que imprimem o voto, máquinas que não imprimem, métodos suscetíveis a toda sorte de manipulação e atrasos.
Até agora, três dias depois de fechadas as urnas, os americanos desconhecem a extensão da maioria democrata na Câmara e da republicana no Senado. Provável que desconheçam ainda por semanas. A situação de algumas apurações revela que tipo de problema impede a transparência e a agilidade:
Por causa de todas essa indefinição, a representação democrata na Câmara poderá variar de 230 a até 238 deputados, a diferença entre uma vitória modesta e uma lavada. No Senado, os republicanos podem tanto manter a maioria atual de 51 a 49 cadeiras (uma vitória acanhada), quanto ampliá-la para 54 a 46 (outra avassaladora).
Não é só na legislação e na dificuldade de apuração que os Estados Unidos perdem para o Brasil. Em termos de segurança, a situação das urnas americanas também é bem mais preocupante que a brasileira.
Em março, o Congresso destinou US$ 380 milhões para resguardar a segurança dos sistemas de votação. Apenas 13 dos 50 Estados afirmaram que usariam os recursos federais em novas urnas eletrônicas, de acordo com um levantamento divulgado em julho pelo Político.
Pelo menos 22 afirmavam não ter planos de trocar as máquinas, entre eles os 5 que promovem, como o Brasil, votação exclusivamente digital (Louisiana, Delaware, Geórgia, Nova Jersey e Carolina do Sul). A maioria adota sistemas mistos. Um levantamento da Reuters em 2016 revelou que um quarto dos americanos vive em áreas sem registro físico do voto.
O Departamento de Segurança Interna (DHS) mostrou que hackers russos tentaram invadir sistemas eleitorais nos 50 Estados americanos. Em seu último indiciamento, o procurador especial Robert Mueller detalhou a tentativa de furtar os dados de 500 mil eleitores num deles (ele não citou o nome, mas a imprensa especula que seja Illinois).
A confusão abre margem para que o presidente Donald Trump fale em fraude a cada resultado que o desagrade, ainda que quantidade de violações comprovadas seja ínfima. No Brasil, apesar de partidários de Jair Bolsonaro terem insistido nessa tese ao longo da campanha eleitoral, a situação é outra. Com todas as deficiências que nosso sistema possa apresentar, o TSE nunca registrou caso de fraude. E, em menos de 12 horas, o país conhece todos os vencedores para todos os cargos.
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